As águas dos rios que inundam e integram a Amazônia estão se transformando em corredores para a contaminação das populações indígenas. A culpa não é dos rios e menos ainda dos povos que habitam a floresta. É da irresponsabilidade e da sabotagem oficial que dificulta o acesso dos indígenas ao auxílio emergencial de R$ 600,00. A dificuldade para receber está levando as populações indígenas a realizarem grandes viagens de barcos até centros urbanos.
É o caso dos Tikuna. Membros da tribo suspeitam que o coronavírus tenha chegado na aldeia por esse caminho. Segundo suas lideranças, os sintomas da doença surgiram depois de viagem de barco pelo rio Solimões para receber o pagamento do auxílio. Com 44 reservas, a região do Alto Solimões, é um dos principais focos do coronavírus na região amazônica.
“São 520 anos de massacres, doenças que a violenta experiência de colonização nos trouxe no Brasil. Nos restam poucos anciões que guardam o conhecimento tradicional, a vida deles e da comunidade estão em risco, e junto a perda da história de um povo. Quem será responsabilizado pela morte do nosso povo?”, povos Guarani e Kaiowá, em Carta Emergencial.
Mesmo com a realização limitada de testes, a região com 76 mil indígenas já registra pelo menos 162 casos de contaminação e 11 mortes.”Estamos muito preocupados, principalmente porque a ajuda não está chegando”, disse Sinesio Tikuna em uma entrevista para a agência de notícias Associated Press. Por algum tempo, os indígenas mantiveram o isolamento com a solidariedades das comunidades locais. A falta de assistência médica adequada agrava a situação.
De acordo com as lideranças, a saída das comunidades, com exposição em cabines de internet ou em filas de bancos, é fator de aumento da contaminação, denunciam. Em três dias de testes, divulgados dia 16, a Reserva Indígena de Dourados (RID), a mais populosa do Brasil, registraram 10 casos positivos de Covid-19. Diante disso, os povos Guarani e Kaiowá decidiram montar barreiras sanitárias para isolar os todos os seus territórios.
Os Pataxó das terras indígenas (TI) Comexatibá e Barra Velha, no extremo sul da Bahia, também apelaram por organizar barreiras sanitárias em seus territórios. Fechando estrada que dão acesso ou cortam seus territórios, os indígenas impedem a circulação de pessoas estranhas em meio à pandemia de Covid-19. Sem apoio do governo federal, a população Pataxó cobra medidas de proteção e prevenção das autoridades federais.
Povos indígenas criam Comitê Nacional pela Vida
Ameaçados de genocídio, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB tratou de organizar o enfrentamento com informação e base científica, ao contrário do governo federal. No início de maio, a Assembleia Nacional de Resistência Indígena criou o Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena. O acompanhamento da disseminação do coronavírus entre os povos indígenas é uma das principais tarefas do comitê.
Talvez de maneira mais grave do que nos grandes centros, a subnotificação dos casos de contaminação e também de óbitos é um dos principais problemas. O impacto da Covid-19 nas comunidades é muito maior do que o registrado pelas autoridades, advertem as lideranças indígenas. Em 12 de maio, por exemplo, a (Secretaria Nacional de Saúde Indígenas (Sesai), do Ministério da Saúde, registrava 19 mortos, enquanto o comitê contabilizava 78 indígenas mortos. A Sesai também registrava um número inferior de casos de infecção, 258 contra 371 do comitê.
Somos aproximadamente 51 mil Guarani e Kaiowá, a segunda maior população indígena do Brasil, localizados no estado de Mato Grosso do Sul, e nos encontramos em Estado de Emergência, alertam os dois povos em Carta Emergencial divulgada no domingo (17). “São 520 anos de massacres, doenças que a violenta experiência de colonização nos trouxe no Brasil. Nos restam poucos anciões que guardam o conhecimento tradicional, a vida deles e da comunidade estão em risco, e junto a perda da história de um povo. Quem será responsabilizado pela morte do nosso povo?”, denunciam.