A Defensoria Pública de São Paulo voltou a requerer que o Tribunal de Justiça do estado suspenda a lei municipal que autorizou a privatização da Sabesp na capital paulista por considerá-la inconstitucional. O parecer foi encaminhado à Corte em 17 de junho no âmbito de um processo movido pelo PT, Psol e PCdoB.
Os partidos acionaram o TJ com objetivo de anular a sessão da Câmara que autorizou a prefeitura a firmar contrato com a empresa de abastecimento hídrico e saneamento após a privatização. A proposta foi analisada pelos vereadores mesmo sob a vigência de liminar que suspendia sua apreciação até a apresentação de estudos de impacto orçamentário.
Na manifestação, a Defensoria sustentou que faltou a ausência de participação popular no debate da proposta e afirmou que a lei é “omissa quanto a possíveis medidas financeiras para cenários de enchentes, estiagem ou outros possíveis eventos climáticos extremos, que vêm se agravando nas últimas décadas”.
Atropelos
A privatização da Sabesp é proposta que o eleitor paulista não viu na campanha eleitoral de 2022 e que, agora, é prioridade máxima do governo Tarcísio de Freitas. Para isso, um verdadeiro vale-tudo foi adotado para que a empresa seja entregue à iniciativa privada, o que representa uma séria ameaça à qualidade dos serviços prestados à população, a exemplo do Enel.
Os poderes legislativos foram literalmente atropelados. Não houve respeito aos trâmites legais na Assembleia Legislativa de SP e muito menos nas câmaras municipais, como da capital paulista e de Guarulhos, para que os parlamentares pudessem debater e votar.
As audiências públicas, espaços para que a população e suas entidades representativas pudessem debater, foram realizadas de afogadilho, sempre com prazos exíguos. Argumentos técnicos de interesse público contrários à privatização foram solenemente ignorados.
Em reação ao “rolo compressor”, diversas ações judiciais foram impetradas por partidos como PT, PCdoB e Psol, além de entidades como o Sintaema (Sindicato dos trabalhadores da Sabesp). Na mais recente, o Tribunal de Justiça de São Paulo foi acionado para anular, em Guarulhos, a sessão da Câmara Municipal que deu aval à privatização.
Com a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) atendida, a privatização fica paralisada. Até o momento, uma única empresa, a Equatorial Energia, que opera em apenas 16 municípios no estado do Macapá, apresentou proposta para tornar-se sócia majoritária da Companhia. Uma outra, a Aegea, retirou-se do processo, por divergência em cláusulas estabelecidas no modelo de contrato ofertado pelo governo paulista.
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Na prática, o modelo de contrato apresentado para a privatização da Sabesp não atraiu interessados como propagado pelo governo. Ainda que para isso tenha derrubado o valor das ações da empresa, conforme denúncia feita pelo Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema) em documento elaborado sob coordenação do economista André Locatelli, encaminhado ao Tribunal de Contas do estado.
No texto, o Sintaema afirma que o valor justo a ser recebido por cada ação da Sabesp seria de R$ 103,90. O governo de Tarcísio de Freitas fixou em R$ 72. Para José Antônio Faggian, presidente do Sintaema, “há evidências claras de que a privatização é somente para atender interesses empresariais”.
Para Ronaldo Coppa, que foi membro do Conselho Administrativo da Sabesp,”é flagrante o direcionamento na escolha do acionista de referência”. Ele afirma que “a saída da Aegea é um alerta disso” E questiona: “será que uma empresa que gerencia apenas 16 cidades reúne condições para adquirir o selo Sabesp, a terceira maior empresa de saneamento do mundo”?
Na contramão do mundo
A privatização da Sabesp, apresentada como algo moderno e com promessa de eficiência nos serviços de saneamento e fornecimento de água tratada, é conduzida na contramão do que ocorre em centenas de cidades em diversos países mundo afora.
Segundo relatório produzido pelo Instituto Tansnacional, que é um centro de pesquisas com sede na Holanda, entre os anos 2000 e 2019, 312 cidades em 37 países reestatizaram seus serviços de água e esgoto. Alemanha, França, Argentina, Estados Unidos, Reino Unido, Honduras e Jamaica são alguns deles.
Da Redação