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Puebla promove novo encontro para discutir crise e paz na Colômbia

Líderes do Grupo de Puebla analisaram o impacto da crise sanitária, econômica e social na América Latina e o processo de paz na Colômbia. Fundador do grupo e ex-presidente da Colômbia, Ernesto Samper foi o anfitrião. Lula, Mujica e Dilma, entre outras autoridades regionais, participaram do encontro virtual.

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Ernesto Samper, ex-presidente da Colômbia

No 5º encontro do Grupo de Puebla, realizado nesta sexta-feira (16), diversas lideranças  traçaram um panorama sobre a América Latina no contexto da crise sanitária, econômica e social que assola o mundo. Na reunião, transmitida por videoconferência, o desafio de reconstrução do multilateralismo global foi um dos temas debatidos, com destaque para a redefinição do papel do Estado na economia e a promoção de uma agenda social inclusiva na formulação de novas políticas públicas.

No debate, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva propôs uma reunião mundial, no âmbito das Organizações das Nações Unidas (ONU), com participação dos países que compõem o G-20 e agências como a Organização Mundial do Comércio (OMS), A Organização Mundial da Saúde, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial para propor soluções para a pandemia do coronavírus.

Segundo o ex-presidente, é preciso fortalecer a agência da ONU, que é a instituição responsável pelas diretrizes mundiais na área de saúde. “O presidente Trump anuncia que vai deixar de contribuir com a OMS e fica por isso mesmo? Trump precisa assumir sua responsabilidade de continuar contribuindo com a OMS”, cobrou. Ainda de acordo com o líder petista, a saúde nunca foi discutida em uma reunião multilateral. “Essa pandemia não tem data para acabar. Só teremos tranquilidade quando aparecer uma vacina”.

Lula também voltou a insistir na necessidade de uma redefinição do papel do Estado em um mundo pós-pandemia. “Desde o Consenso de Washington que o mercado dominou as iniciativas políticas no mundo. Agora está provado: na crise de 2008/2009, o mercado não resolveu, foi o Estado, e está provado que nessa pandemia o mercado também não resolve”, defendeu. “Precisamos de um novo debate no mundo”.

Assembleia Geral da ONU

O ex-ministro das Relações Exteriores do governo Lula e da Defesa na gestão de Dilma, Celso Amorim, também falou sobre os conflitos na Colômbia e propôs uma declaração contundente para o regresso ao caminho da paz, com respeito a acordos e tratados.”É importante, não só pela Colômbia, mas por todas as ameaças que estão por aí, com o uso da força na Venezuela, que sofreu tentativa violenta de golpe”. Amorim reiterou que é absolutamente necessário demonstrar “nossa capacidade de resolver pacificamente os conflitos”.

Ele também discorreu sobre a discussão em torno do papel das nações na construção de um novo mundo multipolar. Amorim expressou ainda apoio à proposta de Lula para a formação de uma Assembleia Geral Extraordinária das Nações Unidas, onde seria levada uma declaração do Grupo de Puebla. “Seria muito importante discutir a pandemia e também a equidade, já há propostas neste sentido”, concluiu.

Quem paga a conta?

O ex-presidente da Colômbia e fundador do grupo de Puebla, Ernesto Samper, questionou quem pagará a conta da crise sanitária e econômica. Para ele, “não deve ser quem já perdeu seus empregos, a classe média que paga impostos ou os aposentados”. De acordo com Samper, a conta de uma queda do PIB mundial, entre 10% e 12%, deve ser paga por quem tem maiores condições econômicas. Ele lembrou que o grupo de Puebla já apresentou proposta de moratória e refinanciamento das dívidas externas dos países da América Latina. 

Samper também advertiu que é imprescindível avançar com a criação de uma nova agenda econômica e de relações regionais e internacionais. “Não podemos regressar ao mesmo modelo anterior, é preciso avançar para uma nova agenda, para o futuro”, disse. Samper ainda destacou que o papel do Estado, que tem liderado a mobilização dos países no combate à pandemia, é fundamental.

Fim do neoliberalismo zumbi

Em sua participação, a ex-presidenta Dilma Rousseff alertou para os desafios impostos pelas perspectivas de longa duração da pandemia e reforçou a tese de que os gastos públicos devem ser um instrumento de proteção e de mitigação dos efeitos  da pandemia entre os mais vulneráveis. “O orçamento público deve ser usado para que se possa emitir dívida pública, com o Banco Central comprando títulos do Tesouro”, afirmou Dilma. “Temos de evitar o colapso social, todas as questões devem ser enfrentadas agora ou não serão enfrentadas”.

Dilma também elogiou a Argentina, que, na condução do presidente Alberto Fernandez, também presente no encontro, está criando as condições para que o país saia da crise mais fortalecido. A ex-presidenta também atacou a moribunda agenda neoliberal. “Não há sentido manter a visão neoliberal”, observou. Segundo a ex-presidenta, os novos tempos devem trazer “o fim das ideias zumbis, aquelas ideias que já morreram, como existem alguns poderosos que as usam, elas persistem em tentar nos assombrar”.

Pandemia é uma oportunidade

Em sua intervenção, o economista Joseph Stiglitz, ganhador do Nobel de Economia, expressou preocupação com as consequências econômicas da pandemia sobre os mercados emergentes e defendeu a adoção de uma agenda socialmente mais justa no processo de recuperação mundial. “As estratégias de recuperação devem passar por uma restauração que leve em conta economias mais inclusivas, sustentáveis e de crescimento acelerado, beneficiando todos os cidadãos, e com democracias fortalecidas e transparentes”, afirmou Stiglitz.

“A pandemia tem o potencial de piorar muitos dos problemas da sociedade mas também representa uma chance para reestruturarmos a economia de acordo com uma agenda progressista”, sugeriu o economista. “Precisamos aproveitar essa oportunidade para tentar garantir que a agenda progressista esteja inserida nos pacotes de resgate que serão definidos pelos governos”, concluiu.

Paz na Colômbia

O presidente da Fundação Perseu Abramo, (FPA) o economista Aloizio Mercadante, discutiu, entre outros assuntos, o processo de paz na Colômbia. “Gostaria de saudar o presidente Samper e os familiares dos mortos comprometidos na luta pela paz, é trágico e inaceitável o que estamos assistindo na Colômbia”, lamentou Mercadante. “O Grupo de Puebla deve ser forte para denunciar internacionalmente e dar visibilidade a esse rompimento de um acordo histórico e fundamental para a democracia”, ressaltou.

Segundo Mercadante, o Brasil passa por uma gravíssima crise sanitária, agravada pelas subnotificações de casos de coronavírus. Há cidades que já não conseguem enterrar seus mortos, como Manaus, Fortaleza”, relatou. De acordo com o presidente da FPA, o Brasil teve tempo para coordenar uma ação de resposta à chegada do vírus mas não o fez. Ele apoiou proposta de patentes livres para uma futura vacina.

Mercadante também defendeu a manutenção do isolamento social, a prevenção de um Estado protagonista e também reforçou a ideia da necessidade da convocação de uma reunião coordenada pelas Nações Unidas.

O petista também abordou a permanente crise institucional que domina o noticiário brasileiro. ”Lembro que existe um grande movimento pelo “Fora Bolsonaro”, e que o país viverá momentos de grande tensão política nos próximos dias”, alertou Mercadante. Ele classificou Bolsonaro como “irresponsável e que não governa.”

Participaram ainda do encontro Fernando Haddad, presidente do Conselho Curador da FPA; Alberto Fernández, presidente da Argentina; Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai; Marco Enríquez-Ominami, ex-candidato à presidência do Chile e presidente da Fundación Progresa; Alicia Bárcena Ibarra, secretária-executiva da Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe, e a economista Clara López Obregón , entre outras lideranças.

Da Redação