Ana Clara, Elas Por Elas
Claudete Costa, 41, entrou no movimento de catadores de reciclável em 2002, após um curso para jovens lideranças que abriu sua mente para o tamanho do impacto de seu ofício. Ela é catadora de material reciclável — “eu trabalho com aquilo que vocês chamam de lixo”, enfatiza — e atua na profissão há 34 anos. Ela começou com dez anos de idade, quando vivia em situação de rua com a mãe e mais dois irmãos. A mãe, recém-separada, não teve outra opção se não viver na rua e catar material reciclável para garantir o pão de cada dia para os filhos.
Sobrevivente da chacina da Candelária, Claudete Costa é presidenta da Cooperativa Reciclando para Viver; presidenta da União Nacional dos Catadores e Catadoras de material reciclável (UniCatadores) e vice-presidenta da Unicopas (Central de Cooperativismo solidário do campus urbano). Liderança e inspiração para muitas mulheres, Claudete tem superado diversos desafios ao longo de sua vida. “Catadora, mãe solo, mulher negra, arrimo de família, é um papel muito forte de responsabilidade para encarar um mercado tão machista, individualista e preconceituoso”, afirma. De fato, sua história de vida cruza com grandes marcos da história brasileira. No dia da chacina da Candelária, ela tinha cerca de doze anos.
“Eu era criança, tinha aprontado alguma e minha mãe me colocou de castigo — que era carregar dois carrinhos de material reciclável. Eu não estava ali, naquele dia, porque estava de castigo. Se não, seria uma daquelas crianças. Os meninos da chacina da Candelária eram meus amigos de rua e de infância. Me considero uma sobrevivente”, recorda Claudete.
Essa não foi a única grande superação na vida da catadora. Mãe de três filhos, ela perdeu o do meio quando ele tinha apenas sete anos. Thiaguinho foi atropelado. Claudete faz questão de fazer as contas “hoje, ele estaria com 21 anos”.
A história de Claudete se soma a tantas outras que contam a vida das brasileiras que atuam na coleta de material reciclável para sobreviver. No ramo de catadores, 86% são mulheres. Desse total, 68% são mulheres negras trabalhando com reciclagem.
“Ou seja, para falar de um mundo mais sustentável hoje no Brasil, a partir da reciclagem, não se trata de olhar para ecobags em supermercados de luxo, mas para a realidade das mulheres negras e catadoras”, explica Anne Moura, secretária nacional de mulheres do PT.
Durante a pandemia, as condições de trabalho para as catadoras tornaram-se ainda mais arriscadas. Além do risco inerente, por se tratar do manejo de resíduo, ainda houve todo impacto social da pausa no trabalho aliada à falta de políticas de assistência do governo.
“Foi complicado porque a gente ganha o que a gente produz — e é de onde a gente tira a renda imediata para pagar as contas e manter nossa família. A gente não tinha fundo de caixa, foi tudo muito rápido. Tivemos que nos isolar, deixar de sair na rua, contamos com a solidariedade para sobreviver”, recorda Claudete.
Mesmo diante das dificuldades, Claudete exerce todos os dias a sororidade das ruas dando apoio e suporte às mulheres que mais precisam. E também na valorização da profissão de catadora para a construção de um mundo mai sustentável com justiça social.
” Cada dia é um desafio a ser alcançado para me manter no mercado de trabalho e poder ajudar homens e mulheres a se reconhecerem e se valorizarem como catador de materiais recicláveis”, finaliza.