O trator do governo funcionou a todo vapor nesta quarta-feira (28) para assegurar a aprovação do texto da reforma trabalhista na Comissão de Constituição (CCJ) e Justiça do Senado. “Um governo que está podre, caindo, vergonhosamente usa o resto de força que tem para retirar direito dos trabalhadores”, denunciou a senadora Gleisi Hoffmann. “Não adianta falar com essa comissão, o resultado está dado. A única forma de barrar essa reforma é a mobilização social: faça greve na próxima sexta-feira”, convocou a senadora, falando diretamente para os telespectadores da TV Senado.
Foram mais de 13 horas de debate e, ao final, prevaleceu o peso da máquina e da distribuição de cargos. Pouco antes da meia noite, a CCJ aprovou o texto da reforma, sem aceitar qualquer emenda, por 16 votos a 9 e uma abstenção. Para ser fiel ao estilo, trator, o presidente da comissão Edison Lobão (PMDB-Ma) colocou em votação simbólica um requerimento de urgência para a votação da matéria em plenário e não permitiu a verificação de quórum, encerrando a sessão.
A CCJ rejeitou três propostas de emenda que pretendiam proibir o trabalho intermitente (quando o empregado não tem carga horária nem salário fixos, recebendo apenas apenas pelas hora trabalhadas no mês) e o trabalho de gestantes e lactantes em ambiente insalubre e a que mantinha a prevalência dos direitos previstos em lei sobre acordos firmados entre empregados e patrões.
O governo colocou a máquina para pressionar os senadores da base que se declaravam constrangidos em votar a proposta — um texto que vai fazer terra arrasada dos direitos trabalhistas no Brasil. Desde que foi derrotado na Comissão de Assuntos Sociais, no último dia 20, o Palácio do Planalto disparou uma série de retaliações contra os parlamentares que se manifestavam contra o projeto, ao tempo em que distribuiu cargos a rodo no “processo de convencimento”.
“O Senado está votando uma reforma contra o povo e o Senado abrindo mão de sua prerrogativa de fazer a discussão de uma matéria que é tão importante”, resumiu Gleisi.
Para “adoçar” o trator, o governo ainda construiu uma manobra, anunciada no meio do debate, para oferecer um álibi aos aliados que mudassem de posição e votassem pela retirada de direitos dos trabalhadores. Após seis horas de uma reunião iniciada às 10 desta quarta-feira, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR) apresentou ao colegiado o resultado de um acordo fechado por Temer com alguns senadores de sua base, com o compromisso de apresentar uma medida provisória “corrigindo” os aspectos mais escabrosos do texto que os governistas querem a todo custo que o Senado se omita em analisar.
O acerto anunciado por Romero — sacramentado por oito senadores, entre eles Marta Suplicy (PMDB-SP), presidente da Comissão de Assuntos Sociais, Tasso Jereissati (PSDB-CE), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos e Ricardo Ferraço (PSDB-ES), relator da reforma trabalhista nos dois colegiados — buscou oferecer uma saída para o constrangimento de parlamentares governistas diante da pressão do Planalto para que o Senado restrinja-se a homologar o texto que veio da Câmara, abstendo-se de fazer qualquer modificação que obrigasse a matéria a voltar àquela Casa.
Passava das 16 horas quando Romero Jucá, retornando à reunião após longa ausência, tomou a palavra na condição de relator da reforma trabalhista na CCJ e leu uma carta enviada por Temer ao colegiado prometendo cumprir o acordo de vetar os trechos da proposta considerados “inaceitáveis” até pelos governistas. Temer anunciou ainda a disposição de editar uma medida provisória regulamentando esses pontos.
Brasileiros rifados
“Os brasileiros estão sendo rifados para que sejam atendidos interesses pessoais”, denunciou o líder da Oposição, Humberto Costa (PT-PE). Temer e Jucá têm pressa em aprovar a reforma — a última esperança de manter o resto de apoio que o governo ainda recebe do mercado — têm manobrado de todas as formas para impedir que o Senado altere o texto, já que o retorno do projeto à Câmara atrasaria sua tramitação. Indiciado pela Procuradoria-Geral da República, o atual ocupante do Planalto não sabe por quanto tempo mais usará a faixa presidencial.
“Essa reforma é baseada num projeto de sociedade infeliz e concepção estreita”, afirmou Paim, que manifestou-se contra a matéria no mérito e apontou sua inconstitucionalidade: ao reduzir drasticamente a proteção social nas relações de trabalho, a reforma atenta contra os princípios da Dignidade da Pessoa Humana e do Valor Social do Trabalho, ambos previstos no artigo 1º da Constituição.
Antes do passe de mágica de Jucá, os senadores Lasier Martins (PSD-RS), Lídice da Mata (PSB-BA), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Vanessa Graziottin (PCdoB-AM), Eduardo Braga (PMDB-AM) e Paulo Paim (PT-RS) apresentaram votos em separado—relatórios alternativos ao parecer oferecido pelo líder do governo. Além disso, 267 emendas foram apresentadas ao projeto. Jucá rejeitou todas as tentativas de modificar o texto da reforma trabalhista.
Respeito ao Senado
“Não podemos abrir mão do nosso papel de Casa revisora, todos os 81 senadores querem modificar o projeto. Estamos nos fragilizando cada vez mais o nosso papel”, cobrou o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), lembrando ainda que Temer não é um bom cumpridor de acordos.
O ocupante do Planalto também se comprometeu a vetar pontos do projeto da terceirização irrestrita para facilitar a adesão de sua base à proposta mas, pressionado por grandes grupos econômicos, voltou atrás e sancionou a matéria com todos os seus aspectos mais perversos. “O Senado precisa se dar ao respeito”, conclamou o petista.
Inconstitucional
A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) condenou o “jeitinho” inventado por Temer e Jucá e alertou os membros da CCJ para a inconstitucionalidade da ideia de editar uma MP para consertar o que o Senado poderia alterar soberanamente, já nesta quarta-feira, aprovando emendas à proposta. “A matéria não atenderia aos pressupostos de urgência e relevância exigidos para a edição de medidas provisórias. Como pode a CCJ compactuar com isso? A comissão não pode dar guarida a essa movimentação”.
Gleisi e os demais senadores do PT que integram a CCJ defenderam a suspensão da discussão da reforma trabalhista em função da crise institucional. “A pressa é por quê? Porque o Temer vai cair, aí tem que entregar a reforma trabalhista antes?”
*Do PT no Senado