O desmonte do Mais Médicos pelo governo de Jair Bolsonaro fez com que o número de mortes evitáveis de crianças com menos de 5 anos disparasse em 2019 nos municípios que mais dependiam do programa, criado durante o governo de Dilma Rousseff. A denúncia é da revista Piauí, que publicou, nesta sexta-feira (7), dados inéditos do impacto provocado pela saída de 8.500 médicos cubanos do país após a eleição do atual presidente.
Segundo a reportagem do jornalista Solano Nascimento, com a saída dos cubanos, o total de médicos nos 119 municípios brasileiros em situação mais vulnerável (IDH baixo ou baixíssimo e pelo menos 20% da população em extrema pobreza) despencou de 544, em 2018, para 127, deixando a população desassistida.
A análise mais detalhada de 14 desses municípios, onde até hoje o total de médicos não voltou a ser o que era, projeta um dado assustador: o aumento de 58% no número de mortes de crianças com menos de 5 anos decorrentes de causas evitáveis, que são aquelas provocadas por infecções, doenças para as quais há vacinas, problemas em gestações ou partos e outros males que podem ser solucionados com diagnóstico e tratamento precoces ou com ações de prevenção.
“Nesses municípios, a média subiu de 4 mortes em 2018 para 7 no ano seguinte. Considerando todo período do Mais Médicos anterior à saída dos cubanos, que vai de 2013 até 2018, o aumento registrado em 2019 nessas pequenas localidades é de 5 para 7 – um salto de 40%. São crianças brasileiras que poderiam estar vivas”, diz um trecho da reportagem.
“Ficamos sem médicos”
A enfermeira Ângela Noronha, que há cinco anos coordena a atenção básica em Pacajá (PA), uma das cidades visitadas pela reportagem, diz não esquecer o impacto da saída dos cubanos. “Ficamos sem médicos nas vilas, e um dos postos não tem médico até hoje”, conta. No município, em 2012, um ano antes da criação do Mais Médicos, foram registradas 13 mortes evitáveis de crianças com menos de 5 anos. De 2013 em diante, já com o programa em vigor, os óbitos desse tipo tiveram uma queda substancial, oscilando entre 5 e 8 anualmente. Em 2019, o primeiro ano depois da saída dos cubanos do país, as mortes evitáveis subiram de novo para 13, mostra a revista.
Já em Manoel Urbano, município com 10 mil habitantes no interior do Acre, os substitutos dos cubanos só começaram a chegar em meados do primeiro semestre de 2019, e no final daquele ano ainda eram só três – um a menos do que antes. No período, as mortes evitáveis de crianças com menos de 5 anos saltaram de 4 para 13 – e 7 delas eram de indígenas.
Não é errado assumir que muitas localidades tenham vivido um cenário parecido, uma vez que, conforme lembra a reportagem, o Mais Médicos era responsável por 100% da atenção primária em 1.039 municípios. Esse, aliás, é apenas um dos dados do programa destacados pela revista.
“Em seus cinco anos de existência, o Mais Médicos colecionou números impressionantes. Chegou a reunir 18.240 médicos, entre cubanos, estrangeiros de outros países e brasileiros. Essa legião de profissionais atendeu cerca de 63 milhões de pessoas, em 4.058 municípios, que equivalem a 73% do total do país. Foi um sucesso sob qualquer ângulo que se analise”, atesta outro trecho da matéria.
Da Redação