Na noite deste domingo (10), foi veiculado pelo canal de TV Record, uma matéria sobre o Encontro Nacional Sem Terrinha, que o MST realizou em 2018 em Brasília, com 1.200 crianças, que busca criminalizar o movimento. Ignorando o trabalho de valorização da agricultura orgânica e da defesa dos direitos, a Record falou apenas de “doutrinação de crianças” e afirmou que o MST não cuida dos sem-terrinha.
O MST publicou uma nota de repúdio e irá exigir direito de resposta da Record, além de desafiar a empresa “a se propor a um jornalismo sério e de qualidade que preze pelos fatos e não interesses políticos”. O MST ainda destacou que todas as normas do ECA foram cumpridas no encontro.
Segundo o coordenador nacional do movimento, João Paulo Rodrigues, “a Record fala em doutrinação de crianças, que o MST manipula e não cuida dos sem-terrinha. É tudo mentira! Você sabia que o encontro era sobre direito à educação e alimentação saudável? Pois é! São crianças que estão lutando por escolas e alimento sem veneno”.
O encontro realizado entre os dias 23 e 26 de julho reuniu crianças de 24 estados. Foi o primeiro encontro nacional das crianças do MST, com atividades culturais, pedagógicas e políticas.
O MST já realizava reuniões deste tipo em nível estadual desde 1994. O Encontro Nacional foi fruto de dois anos de atividades preparatórias. Nesta primeira edição, sob o lema “Sem Terrinha em Movimento: Brincar, Sorrir, Lutar por Reforma Agrária Popular!”, os principais temas de debate foram os direitos da criança e a questão da alimentação saudável.
Educação no campo
A primeira plenária do encontro, realizada na terça-feira (24), foi dedicada ao tema dos Direitos da Criança. A principal questão tratada pelas crianças foi a educação no campo. A sem-terrinha Kaylane Dourado, de Goiás, ressaltou a importância de que o poder público garanta escolas dentro dos assentamentos e acampamentos.
“Quando a gente vai para a escola, passamos mais tempo dentro do ônibus do que na própria escola. Um dia eu estava indo para escola e a van quebrou. Eu estava de calça branca e lá estava cheio de lama. Minha calça ficou vermelha”, contou. “A gente sai da roça para estudar na cidade, sendo que a gente tem direito de ter escola na roça”, comentou Kaylane.
Durante os dois anos de preparação do Encontro Nacional, os sem-terrinha debateram a formulação de um manifesto, aprovado durante a reunião em Brasília. Na quarta-feira (25), durante uma visita cultural à Esplanada dos Ministérios, as crianças entregaram o documento, que denuncia o fechamento de escolas no campo, ao Ministério da Educação.
“Lutamos por nossos direitos, que não são cumpridos: nossas estradas são ruins e esburacadas; o transporte escolar quase sempre quebra e entra muita poeira; muitas escolas estão sendo fechadas e outras são longe de nossas casas; falta material e temos poucos livros pra ler. As escolas do campo precisam ter melhores condições. A alimentação das escolas precisa melhorar, ter mais produção da reforma agrária e da agricultura camponesa familiar”, diz um trecho do texto.
Oficinas
Pelas tardes, os sem terrinha se dividiam em diversas oficinas culturais e lúdicas. Através delas, parte das crianças, por exemplo, foi integrada à equipe de comunicação do Encontro, tirando fotos, escrevendo textos e gravando vídeos. Ao final, um Jornal Sem Terrinha foi impresso para que os presentes levassem aos estados de origem o resultado de seu próprio trabalho durante o evento.
Josué Rodrigues Costa, de 11 anos, participou de outra das oficinas, a de Construção de Histórias. Nela, o garoto, que deseja se tornar escritor, relatou sua vida no assentamento Dom Tomás Balduíno, localizado na cidade de Formosa, em Goiás.
“Eu gosto de plantar e colher alimentos orgânicos, sem agrotóxicos, sem qualquer adubo, porque além de prejudicar nossa vida, prejudica a vida dos animais silvestres, como, por exemplo, matam muitos peixes. A regra que tem que ser cumprida é que não poderia usar nenhum tipo de química nas plantas”, escreveu ele em um trecho.
Alimentação
A questão trazida pelo relato de Josué foi o tema da segunda plenária que reuniu o conjunto dos sem terrinha. As crianças debateram como o modelo agrícola predominante no Brasil, que transforma alimentos em mercadoria, é responsável por danos à saúde humana e às culturas alimentares regionais.
Os sem terrinha ressaltaram o aprendizado familiar sobre a necessidade de preservação das sementes crioulas. De outro lado, defenderam incentivos públicos à produção dos assentamentos e acampamentos. A sem terrinha vinda do Ceará, Dandara dos Santos Feitosa, de dez anos, foi uma das crianças a defender esse ponto de vista.
“Minha escola é dentro do assentamento. Lá, a merenda escolar é produzida por assentados e assentadas. Os sem terrinha se alimentam do fruto da reforma agrária. Com as pessoas e a natureza convivendo em harmonia, teremos comida saudável em nossa mesa todo dia”, disse.
O Primeiro Encontro Nacional das Crianças Sem Terrinha foi coordenado pelas próprias crianças durante os quatro dias de atividades. Cerca de 400 educadores auxiliaram-nas nesta tarefa.
Da Redação da Agência PT de notícias, com informações do Brasil de Fato