Insensível às extremas dificuldades que a maioria da população brasileira enfrenta com os aumentos abusivos dos preços administrados pela Petrobras, o desgoverno de Jair Bolsonaro se comporta de maneira diferente quando o interesse é dos Estados Unidos. A pedido do “grande irmão do Norte”, o Brasil vai ampliar a produção de petróleo para contribuir com o “esforço de guerra” e garantir o abastecimento do mercado mundial, em meio ao embargo ao petróleo da Rússia.
A informação foi dada ao jornal Valor Econômico pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. O almirante de Esquadra disse ter conversado sobre o assunto com a secretária de energia estadunidense, Jennifer Granholm, na última quinta-feira (10). Segundo ele, os estoques de diesel nos Estados Unidos estão 20% abaixo da capacidade, enquanto os países árabes perderam 40% dos estoques. Granholm ressaltou a necessidade de aumentar a produção de petróleo no mundo “o mais rápido possível”.
“Os países que têm estoque, como EUA, Japão, Índia e outros, estão liberando. Mas também tem que ter o esforço de aumento da produção. Ela me perguntou se o Brasil poderia fazer parte desse esforço e eu falei: claro que pode”, contou o ministro, cioso de sua subserviência. “Já estamos aumentando a produção. Enquanto a maioria dos países da OCDE reduziu, nós aumentamos nossa produção nos últimos três anos.”
A Petrobras bateu o recorde anual de produção no pré-sal em 2021, com 1,95 milhão de barris de óleo equivalente por dia (boed), o equivalente a 70% da produção total da companhia. O recorde anterior foi em 2020, quando atingiu a marca de 1,86 milhão de barris diários, ou 66% da produção total.
Ao mesmo tempo, o desmonte promovido desde o lawfare da lava-jato faz da Petrobras cada vez mais mera exploradora de jazidas, exportando óleo cru e importando derivados de alto valor agregado. Levantamento da assessoria econômica da Federação Única dos Petroleiros (FUP) divulgado em janeiro revelou os resultados dessa política lesa-pátria.
Ano passado, o Brasil ampliou em 28% os volumes de derivados comprados no exterior. As importações cresceram 82% em valor e somaram US$ 13,4 bilhões. Óleos combustíveis de petróleo ou minerais betuminosos, exceto óleos brutos, foram o segundo produto mais importado pelo Brasil em 2021, atrás somente dos fertilizantes.
Já as exportações de óleo cru atingiram US$ 30,4 bilhões em 2021, 55,3% maiores que os US$ 19, 6 bilhões registrados no ano anterior. Foram comercializadas 68 milhões de toneladas, ou 60% a mais que no ano anterior. Com isso, o óleo cru foi o terceiro produto mais vendido no mercado internacional em 2021, atrás somente do minério de ferro e da soja. O produto respondeu por 11% das exportações totais do Brasil.
Um dos motivos que explicam o forte incremento das compras de derivados, avalia a assessoria econômica da FUP, é o Fator de Utilização do Refino das unidades da Petrobras. A FUP calcula em 80% o fator médio de utilização do refino no ano passado – uma capacidade ociosa de 20%. A decisão da Petrobras de deslocar parte da produção de óleo bruto para o mercado externo, em vez de refinar internamente, abriu mais espaço para importações de derivados, dolarizando ainda mais os combustíveis.
Perda da soberania energética se agravou com Bolsonaro
“Nós vínhamos investindo na descoberta de novas fronteiras petrolíferas justamente para termos petróleo suficiente para manter a soberania de nosso país”, explicou Miriam Cabreira, presidenta do Sindicato dos Petroleiros do Rio Grande do Sul (Sindipetro/RS), em entrevista a Amanda Guerra, do Jornal Rádio PT, na manhã desta segunda-feira (14).
“Existia uma política de construção de refinarias e ampliação do parque de refino para nós sermos autossuficientes em petróleo e derivados. Essa política veio sendo desmontada desde 2014 com a lava-jato, que criou empecilhos e destruiu a indústria nacional”, prosseguiu a também dirigente da FUP. “Depois de 2016, com o golpe, veio esse projeto de desmonte da Petrobras cujos reflexos estamos vendo agora”, concluiu.
Miriam lembrou o caso da antiga Refinaria Landulpho Alves (RLAM), privatizada em dezembro de 2021 e rebatizada de Mataripe, que vende seus produtos a um preço maior que os já extorsivos praticados pela Petrobras. “Somente uma empresa integrada do poço ao posto, como foi a Petrobras recentemente, poderia formular preços de forma diferente da atual política de paridade de importação”, ressaltou a dirigente sindical.
A inflexão estratégica imposta à Petrobras após o golpe de 2016 fez o Brasil perder R$ 172,2 bilhões em investimentos e encerrou 4,4 milhões de empregos – notadamente na construção civil, que perdeu 1,1 milhão de postos de trabalho. É o que aponta estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Se a expansão do parque de refino planejado nos Governos Lula e Dilma não tivesse sido interrompida pelo golpe, o Brasil estaria hoje exportando derivados de alto valor agregado, e não óleo cru. Em vez disso, a Petrobras transfere o petróleo do pré-sal para outros países refinarem e importadoras venderem aqui produtos cotados em dólar.
Quem mais lucra com isso são os acionistas privados (43%, não-brasileiros). Além das multinacionais do setor, que estão se apropriando das refinarias da Petrobras a preços muito abaixo do valor de mercado.
Gleisi: “Bolsonaro é um espertalhão”
Nesta segunda, o Sindicato dos Petroleiros da Bahia (Sindipetro-BA) ingressou com Ação Civil Pública na Justiça Federal, pedindo a paralisação dos trâmites finais do processo de privatização da atual Refinaria Mataripe, por práticas nocivas à economia local.
A ação destaca que, com três meses de atuação da refinaria, operada pela Acelen, do fundo árabe Mubadala, a Bahia tem hoje a gasolina mais cara do Brasil, em função de reajustes abusivos praticados pelo monopólio regional. A gasolina na Refinaria de Mataripe custa 6,4% a mais do que a vendida pela estatal; o óleo diesel S-10 mais 2,66%.
“A FUP e o Sindipetro Bahia alertam e sempre alertaram para o equívoco da privatização das refinarias da Petrobras, que leva à nefasta criação de monopólios regionais, em detrimento do consumidor brasileiro, sujeito a reajustes abusivos de preços. A tese, infelizmente, está sendo confirmada na prática, afetando profundamente a economia baiana”, destacou o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar.
“A Acelen, cinicamente, justifica os aumentos com impactos da guerra na Ucrânia, que levaram à disparada do preço internacional do barril de petróleo. Mas a culpa não é da guerra, é da política de preços atrelada ao dólar e aos abusos do monopólio praticado pela Acelen”, acrescentou o líder da FUP.
Bacelar afirmou ainda que o novo tarifaço da Petrobrás sobre os combustíveis, que entrou em vigor na última sexta-feira (11), se deve principalmente à integração dos preços praticados pela estatal com o mercado internacional, e não ao conflito armado na Ucrânia. “A alta dramática não ocorreria caso a política de preços fosse nacionalizada e refletisse em grande parte os custos internos de produção”, apontou.
Pressionado mais e mais a cada anúncio de reajuste dos preços da Petrobras, Jair Bolsonaro tenta se esquivar com as costumeiras tática das fake news e transferência de responsabilidades. Para a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), ele não passa de um “espertalhão”. “A política de preços depende do conselho da Petrobras que ele nomeou. Se os combustíveis estão caros, é sua responsabilidade. Frouxo”, disse Gleisi em seu perfil no Twitter.
Da Redação