Partido dos Trabalhadores

Tereza de Benguela: a coluna mais resistente que o sol

Marcha Nacional Lula Livre se encontrou no fim da manhã desta terça-feira (14) no centro de Brasília

Peu Araújo

Três colunas da Marcha Nacional Lula Livre se encontram em Brasília

Café preto, barracas se desfazendo, redes sendo enroladas, cara de sono. O dia começou cedo na coluna Tereza de Benguela, um dos três grupos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) a compor a Marcha Nacional Lula Livre, que percorreu cerca de 150 quilômetros até o centro de Brasília.

Assentadas na EPIA (Estrada Parque Indústria e Abastecimento Sul), ao lado da rodoviária interestadual, as 1500 pessoas protagonizavam um balé sincronizado que em primeira vista pode até parecer caótico, mas depois de dois segundos de atenção fica nítido que cada pessoa ali tem sua função. Os coletes vermelhos fazem a segurança, os laranjas a comunicação, os brancos cuidam da saúde e os azuis vão na frente para estruturar o próximo ponto de parada.

Quinze minutos antes da seis da manhã, o carro de som é ligado com uma convocação: “Hoje somos mais fortes, porque somos maiores que ontem”. A frase, como num mantra se repete até que os mais cansados saiam de suas barracas.

O sol deu as caras poucos minutos depois das 6h e com ele veio o agito do assentamento. Crianças despertas, malas praticamente prontas e o começo dos achados e perdidos. No carro de som anunciam uma camiseta de Che Guevara amarela, uma calça legging e uma bermuda que deram sopa. Alguém no microfone chega a sugerir, em tom de brincadeira, a criação de um brechó beneficente Lula Livre para a doação das peças.

Por volta de 6h30 as colunas começaram a ser formadas na lateral esquerda da estrada. Alguns motoristas buzinam em apoio à marcha. Os que criticavam a passeata com ofensas e apoio ao candidato que não mencionaremos o nome eram em sua totalidade homens brancos, e arrisco dizer, heterossexuais. Os marchantes não revidavam aos berros, preferiam bradar frases de ordem como “Se o campo e a cidade se unir a burguesia não vai resistir” ou “enquanto o latifúndio quer guerra, nós queremos terra.”

As pessoas no ponto de ônibus não pareciam comemorar o atraso do busão, mas não se pronunciavam: um casal, com um cachorro decidiu seguir o grupo. Um casal que vendia café, suco, bolos e salgados viu a multidão se aproximar e com isso o comércio de sua barraquinha. Era um tal de “me vê um suco de cajá”, “esse bolo é de quê?” e em poucos minutos dezenas de pessoas se aglomeravam por um segundo café da manhã às 9h.

Dois violões faziam a base para clássicos do MST e clássicos da música popular como “Canto das Três Raças”, de Clara Nunes ou “Bloco na Rua”, de Sérgio Sampaio. O bloco está na rua e ocupa parte das faixas na estrada. É impossível passar incólume pela marcha, é impossível não ver a força popular deste movimento, que é sempre bom lembrar, pacífico do início ao fim.

Coluna Tereza de Benguela na Marcha Lula Livre

Às 9h17 a coluna Tereza de Benguela se encontrou com a Ligas Camponesa, isso mesmo sem o plural, e a marcha dobrou de tamanho.

Os 30ºC com a falta de umidade e de sombras de Brasília deixam as pernas mais pesadas, o caminhar mais difícil. No meio do caminho tinha, como um oásis no deserto, o Memorial dos Povos Indígenas com banheiro e água fresca. A outra opção é uma engenhoca criada pelos assentados: uma cisterna levada por um caminhão com umas torneiras que abasteciam, quase sem limites as garrafinhas vazias.

A coluna Tereza de Benguela, que faz a dianteira da Marcha Nacional Lula Livre, invoca “Sem feminismo não há socialismo” e na sequência puxa o coro de “Lugar de mulher é no tanque…de guerra.”

Com uma dança meio alongamento um homem que estampa o nome “Toninho Maratonista Naturalista” na camisa regata se empolga com a multidão e até esboça iniciar uma corrida ali mesmo. Alarme falso.

O carro de som da Ligas Camponesa (sempre lembrando que é sem o plural mesmo) toca Luiz Gonzaga e alguns forrós de conteúdo lindamente comunista. O carro de som da Tereza de Benguela continua com os clássicos. Minha jangada vai sair pro mar, vou trabalhar. Meu bem querer… ecoa (literalmente, porque em Brasília o som parece dar uma passeada pela cidade e voltar com delay) nos falantes.

Quase 11h da manhã, já naquele sol quase a pino, a Coluna Prestes surge no horizonte intensificando o público, a euforia e dando aquela sensação de dever quase cumprido. Falta pouco, bem pouquinho. Os marchantes do Brasil todo se reuniram perto da Torre de TV para um grande assentamento.

A coluna Tereza de Benguela se junta depois de caminhar com o sol por quatro horas e meia. Os rostos estão cansados, os passos mais lentos, pesados, mas a confiança está lá em cima. A impressão que se tem no meio das mais de 5000 pessoas que fizeram uma digníssima marcha até o centro de Brasília é de que nada conseguirá parar a vontade do povo. De uma gente que deu a cara a tapa, que andou — e muito — pelo registro da candidatura do presidente Lula e pela democracia, essa palavrinha tão em desuso desde o desmonte.

Vencemos o sol, o cansaço. Vencemos. Amanhã seguiremos, ainda em marcha, ainda organizados e muito confiantes na força do povo. Um povo que aponta, no rosto, nos gestos e nos cantos, toda a sua indignação e resistência com uma política que não olha para quem é do campo, que não enxerga quem é pobre.

Este povo estará amanhã na frente ao Tribunal Superior Eleitoral fazendo sua voz ecoar (já disse que os cantos ecoam muito aqui em Brasília) para os quatro cantos que queremos o Lula candidato, que queremos o Lula presidente.

Por Redação da Agência PT de notícias