Manifestações de rua, em todos os lugares e em todas as situações, são formas de exercício direto da política pelas pessoas. O espanto que às vezes causam se dá pelo fato de que são os representados que ali estão. Em um certo sentido, a presença dos eleitores nas ruas para defender algo ou protestar contra algo representa um desacerto político, que em algum momento terá que ser resolvido. Em geral, isso acontece quando o sistema político não consegue – ou por falta de vontade, ou por indiferença – tornar concreta uma vontade que está latente na sociedade.
No Brasil, temos uma larguíssima história de manifestações políticas de rua. Não falamos, evidentemente, das manifestações que ocorrem em momentos eleitorais, mas em momentos excepcionais, quando o povo precisa utilizar esse mecanismo especial de exercício da política e da comunicação – que é o protesto de rua – porque as instituições representativas não caminham no sentido da vontade do povo. A excepcionalidade da forma, quando as pessoas precisam sair de seu cotidiano e de suas casas para marcarem presença no espaço público, evidencia pelo menos duas características importantes que esses eventos trazem: a gravidade e a urgência.
Vivemos sob um governo que não tem qualquer compromisso nem com os interesses nem com as necessidades do povo. Não combateu a pandemia, realidade que está sendo evidenciada pelos debates na CPI da Covid, e, também, não protegeu a população mais necessitada (trabalhadores e pequenos empreendedores) dos efeitos da instabilidade econômica que costuma acompanhar situações de crise pandêmica.
Sobre o nosso país, não precisamos repetir o que muitos já disseram nesses últimos 15 meses, desde o início da pandemia e até antes dela. Vivemos sob um governo que não tem qualquer compromisso nem com os interesses nem com as necessidades do povo. Não combateu a pandemia, realidade que está sendo evidenciada pelos debates na CPI da Covid, e, também, não protegeu a população mais necessitada (trabalhadores e pequenos empreendedores) dos efeitos da instabilidade econômica que costuma acompanhar situações de crise pandêmica. O resultado é um número absurdo de mortos, indicadores recordes de desemprego e o retorno da fome nos meios mais pobres de nossa sociedade. Uma tragédia.
Muito além disso e do que pode ser considerado razoável, o atual presidente zomba dessa tragédia e do sofrimento das pessoas. Age como um louco autocentrado, para o qual não importa os sentimentos dos outros, mas apenas a sua vontade de poder. Recupera com sua evidente irracionalidade, com sua conduta e com suas mobilizações, os piores exemplos de experiências políticas fascistas, que tanto mal causaram à humanidade há não muito tempo. As motociatas que vem promovendo são apenas um exemplo esdrúxulo dessa vontade de impor à sociedade o medo e a mentira (as motociatas projetam força e quantidade muito além do que realmente têm e são usadas para demonstrar uma representação que, na verdade, não existe).
É óbvio, portanto, que vivemos uma situação que nos impõe uma compreensão de gravidade e urgência. E por isso é natural que as manifestações de rua se imponham como uma expressão legítima do povo. Não é verdade que esses atos anti-Bolsonaro têm a mesma compreensão (ou incompreensão) do bolsonarismo sobre os cuidados que se deve manter no período pandêmico. Ao contrário, são manifestações que pretendem deixar evidenciado que o atual governo e o atual presidente são os principais elementos nefastos que impedem o desenvolvimento de uma política nacional de combate à pandemia, o que nos garantiria uma eficácia muito maior no controle da Covid-19. Além disso, são manifestações convocadas com uma ênfase muito forte na necessidade de manter os cuidados de distanciamento, utilização das máscaras adequadas e o uso do álcool gel de forma permanente durante o evento.
Vamos para rua em 19 de junho por uma imposição da realidade. Nosso cálculo é que os riscos de não estar nas ruas são maiores do que os de estar. O terror antidemocrático se impõe quando não há resistência e a estratégia para evitar a resistência é exatamente a da imposição do terror, através de uma ideia de impossibilidade da resistência. O golpe contra a democracia se origina sempre de uma conjuntura de alta ofensividade dos golpistas e baixa resistência dos golpeados. Mostrar nas ruas o nosso protesto e a nossa vontade de resistir a qualquer ação antidemocrática é fundamental, portanto, para reverter esse ciclo que estamos vivendo no Brasil sob Bolsonaro, que parece ser um caminho para a morte e para o autoritarismo.
Por isso, inclusive, as ruas, em 19 de junho e nas outras que virão, não devem ser um espaço exclusivo para a esquerda política. É um espaço para todos os democratas. É natural que as manifestações de rua, por sua natureza plebeia, não atraiam setores de classe média e nem os empresários. Mas é fundamental que esses setores, nos espaços que possuem de manifestação, seja nas redes sociais, seja na mídia tradicional, apoiem e reconheçam a legitimidade dessas manifestações populares. Em última instância, precisamos estar juntos em defesa da liberdade e da democracia.
Paulo Pimenta e deputado federal e presidente do PT-RS
Artigo originalmente publicado no site Sul 21.