A presidenta da Associação Juízes para a Democracia (AJD), Valdete Severo, avalia que as instituições brasileiras estão alinhadas ao governo do presidente Jair Bolsonaro, ignorando ações criminosas de membros do Executivo e tentando punir quem o critica.
Para Valdete, a falta de ação prática das instituições após a encenação e fala nazista do ex-secretário Especial da Cultura, Roberto Alvim, é uma demonstração desse imobilismo. E uma contradição comparada com a ação movida contra o juiz do trabalho Jerônimo Azambuja Franco Neto, da 18ª Vara do Trabalho do TRT da 2.ª Região, que chamou o governo brasileiro de ‘merdocracia neoliberal neofascista’ em um despacho de decisão judicial.
Enquanto Alvim foi exonerado do cargo, mas nenhuma ação judicial foi proposta contra ele pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por sua fala nazista, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Advocacia Geral da União (AGU) anunciaram ações contra Franco Neto – reação que beira a censura. O ministro Emmanuel Pereira, corregedor nacional de Justiça em exercício, pediu abertura de investigação para apurar se o juiz do trabalho feriu o Código de Ética da Magistratura.
“Estamos vivendo um momento de muita violência, inclusive, institucional. Que está adoecendo as pessoas. É evidente que não se espera que em uma sentença se faça uma análise do quadro político do país. Mas a questão é: o que leva um juiz a fazer esse verdadeiro desabafo? E por que causou tanto espanto? A gente tem um presidente que está toda hora dizendo palavrões em público. E isso não causa espanto para nenhuma das instituições que poderiam reprimir esse tipo de manifestação por alguém que fala em nome do país. Por que a instituições logo se levantam para dizer vamos punir esse juiz? Porque temos ali o desvelamento de uma realidade que o país está vivendo”, afirmou Valdete em entrevista aos jornalistas Glauco Faria e Nahama Nunes, na Rádio Brasil Atual.
A AJD defende que Alvim seja responsabilizado civil, administrativa e criminalmente por sua encenação e fala nazista. “O que a gente espera é que ele responda por ter feito uma incitação ao nazismo. Um regime que praticou crimes contra a humanidade, institucionalizou a eliminação sistemática de pessoas. É muito grave que num país como o nosso, que se diz democrático, que tem uma Constituição como a de 1988, e que condena como crime a prática de tortura e a incitação a práticas criminosas, tenha um secretário de Cultura que tenha feito um vídeo como aquele, claramente, homenageando o Goebbles, que foi um nazista”, afirmou Valdete.
Ela lembrou ainda que não se trata de uma questão isolada no governo Bolsonaro, já que no mesmo dia da fala de Alvim, o presidente o havia homenageado, dizendo que “pela primeira vez nós tínhamos um verdadeiro secretário da Cultura, uma pessoa que atende as demandas de uma sociedade conservadora e cristã como a brasileira”.
“Ele foi afastado do cargo, mas isso é muito pouco. Não é suficiente para dar conta da gravidade daquilo que de alguma forma ele inaugura. Estamos diante de um governo que é autoritário, que flerta com as ideias de regimes como o nazismo há muito tempo. Mas não tínhamos tido ainda algo tão claro. O mais próximo disso tinha sido as declarações do filho do presidente (Eduardo Bolsonaro), e do ministro (da Economia, Paulo) Guedes, sobre o retorno do Ato Institucional número 5 (AI-5)”, ressaltou.