O governo eleito nas eleições presidenciais deste ano terá que trabalhar a partir do próximo para reverter o quadro de desmonte a que o Sistema Único de Saúde (SUS) foi submetido desde a adoção da Emenda Constitucional (PEC) 95, do teto de gastos, e agravado deliberadamente por Jair Bolsonaro. A avaliação foi feita pelo médico Arthur Chioro, ministro da Saúde do Governo Dilma entre 2014 e 2015, em entrevista à jornalista Amanda Guerra no Jornal PT Brasil desta segunda-feira (25).
“Nós temos uma base histórica de subfinanciamento da saúde que já vem desde o início da construção do SUS, há quase 50 anos, e sempre foi um desafio que nós enfrentamos inclusive nos nossos governos”, avalia Chioro. “Mas a partir do golpe de 2016 o histórico subfinanciamento da Saúde passou a ser substituído por um quadro marcado pelo desfinanciamento.”
Segundo o ex-ministro, a partir de 2016 houve uma aposta de Michel Temer, aprofundada sob Bolsonaro, de destruição de todas as políticas públicas que apontavam para a inclusão social, para a proteção da vida. “Como é o caso do SUS, que é o resumo das políticas do ponto de vista ético civilizatória mais importante para proteger os brasileiros e brasileiras”, exemplifica.
A partir da “PEC da morte”, diz Chioro, todas as necessidades do sistema passaram a ser regidas pela única regra: “Apenas recompor a inflação por um índice que não diz nada a ver com a realidade da Saúde”. Na prática, conclui, a perda acumulada até o momento no orçamento federal da Saúde chega a R$ 37 bilhões. Isso obrigou estados e municípios a progressivamente elevarem o gasto em Saúde apenas para manter o que já existe.
“Nós sabemos que ainda existem muitos vazios assistenciais, ainda existe muita necessidade de novos investimentos em muitos municípios, em muitas regiões do país que dependem fundamentalmente do governo federal”, afirma Chioro. Segundo ele, em 2019, o gasto diário por habitante com a Saúde foi de R$ 3,80.
“É por isso que a gente tem uma situação trágica”, aponta o ex-ministro. “Uma aposta no esfacelamento das políticas públicas para, ao mesmo, tempo abrir espaços progressivamente para o mercado, porque essa é objetivamente a grande intenção que o golpe e a EC 95 trouxeram para o Brasil.” Neste ano, revela ele, não há recursos suficientes para o fechamento das contas do setor.
Plano de governo almeja recuperar capacidade de financiamento do SUS
Para superar essa “estúpida forma de conduzir da maneira mais antirrepublicana possível o Estado brasileiro”, diz Chioro, o programa de governo de Luiz Inácio Lula da Silva trata da superação da EC 95. Assim, continua ele, será possível recuperar a capacidade de financiamento do Sistema de Saúde brasileiro e adotar políticas de reconstrução do complexo econômico-industrial da Saúde do país.
LEIA MAIS: Lula lança diretrizes de programa: “Este país precisa voltar a ser soberano”
“Essa é uma questão central no programa de governo do Lula, em uma retomada de qualquer projeto que pensa em uma perspectiva inclusiva de segurança e soberania nacional”, explica o ex-ministro. “O governo brasileiro perdeu totalmente a capacidade de regulação pública a partir do interesse público. Ao contrário, inclusive desmontou o conjunto de políticas públicas que vinham sendo construídas desde o Governo Lula.”
Acesse o plano aqui.
“O complexo econômico-industrial da Saúde é pensar o conjunto de atores envolvidos nessa cadeia de produção de medicamentos, exames, insumos, equipamentos médicos, de todas essas questões essenciais, utilizando o poder de compra do SUS, grande comprador do país”, detalha Chioro.
“Esses recursos são utilizados no estabelecimento de parcerias entre laboratórios públicos, laboratórios privados nacionais, laboratórios internacionais que se disponham a investir no Brasil”, continua ele. “Juntos, esses atores produzem de maneira adequada o conjunto de produtos necessários para garantir os interesses da nação.”
Chioro lembra a atuação nesta pandemia do Instituto Butantan e da Fiocruz. “Conseguiram chegar a este patamar inclusive de capacidade de produzir vacinas porque receberam investimentos do Ministério da Saúde nos governos Lula e Dilma”, ressalta. O ponto de partida, diz, foi essa política do complexo econômico, de trabalhar com transferência de tecnologia e por meio de parcerias com laboratórios.
“O mais interessante disso tudo é que, além de todos esses elementos que são essenciais para uma política de saúde pública, por próprio fortalecimento do SUS, essa visão é extremamente importante porque se trata de uma atividade econômica com potencial de geração de empregos, de geração de receitas a partir dos impostos”, prossegue o ex-ministro.
“É uma trama, é de fato uma cadeia produtiva que vai muito além de fazer chegar remédio, exames, aparelhos, equipamentos médicos para a população. Ele é fundamental para própria economia”, defende Chioro, apontando que 35% do esforço de inovação tecnológica no país hoje vem do Complexo econômico-industrial da Saúde.
“O potencial de geração de empregos diretos e indiretos é altíssimo e, portanto, se trata de um elemento que nós temos tratado no programa de governo do presidente Lula com altíssima qualidade, por envolver a saúde, a economia, a área de ciência e tecnologia, os nossos Laboratórios públicos, as nossas universidades e acima de tudo o interesse público”, finaliza.
Da Redação