Partido dos Trabalhadores

O PL 3729/2004 e a destruição do licenciamento ambiental

Artigo de João Marcos Rodrigues Dutra, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), denuncia a ação de lobbys empresarias na Câmara dos Deputados contra o licenciamento ambiental

Joka Madruga

Tragédia ambiental

O licenciamento ambiental e a avaliação de impactos ambientais estão entre os principais instrumentos previstos pela Constituição de 1988 para garantir a todos o direito ao meio ambiente equilibrado, “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”, ela também impõe “ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

O Projeto de Lei 3729 de 2004, que tem como objeto a criação de uma Lei Geral para o Licenciamento Ambiental no Brasil, desde sua primeira redação, não traz elementos necessários para solucionar os problemas alegados na sua justificativa.  Ao contrário, traz grandes retrocessos para a proteção do meio ambiente e para a garantia de direitos das populações atingidas pela degradação ambiental.

Há muito tempo, setores do empresariado, incluindo grandes construtoras, grandes agropecuaristas, bancos, representados pela FEBRABAN, CNI, CNA, entre outros grupos do grande capital, com o apoio de organismos internacionais, como o Banco Mundial, e de seus porta-vozes no legislativo federal, vêm alegando falsos problemas no processo de licenciamento ambiental. A partir disso, têm apontado falsas soluções e colocam o IBAMA e o Ministério Público como os vilões do licenciamento, emperrando o propalado “progresso”.

A realidade é que dificilmente uma licença ambiental é negada pelo órgão licenciador, principalmente quando se trata de grandes projetos de infraestrutura. Não existe falta de celeridade na emissão de licenças, ao contrário, a maior parte dos esforços das autoridades licenciadoras se concentram neste ato. O que há de fato é uma enorme dificuldade em acompanhar os empreendimentos em execução e o cumprimento das condicionantes socioambientais.

Após a instituição da Lei Complementar 140 de 2011 que compatibiliza a atuação dos diferentes órgãos do SISNAMA no licenciamento ambiental, a maior parte dos casos de “atraso” e judicialização se concentram em situações de descumprimento de condicionantes, sendo necessário a intervenção visando impedir a violação de direitos humanos, e por falhas no projeto, ou a elaboração de estudos inadequados.

Para enfrentar os reais problemas do licenciamento no Brasil é necessária uma política de fortalecimento institucional dos órgãos licenciadores, tanto estruturalmente, como na garantia de sua independência técnica, que é alvo permanente de intervenções políticas para garantia interesses econômicos.

Também é preciso aprofundar o processo de participação social, em todas as etapas de planejamento, e ampliar a aplicação da Avaliação de Impactos Ambientais (AIA) e da Avaliação Ambiental Estratégica (AEE), ao invés de deferir projetos desastrosos e tentar remediar os desastres com condicionantes que terminam desatendidas, como ocorre em Porto Velho e em Altamira, após a construção de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte.

O projeto que pode ir para votação nos próximos dias desconsidera os diversos alertas de entidades científicas e da sociedade civil organizada, apresentando um leque de “brechas” que facilitam o licenciamento de empreendimentos com potencial de provocarem grandes impactos socioambientais e reduz a proteção e o reconhecimento de populações atingidas.

Entre os principais problemas destacamos:

Em resumo, o projeto se omite em relação ao que deveria avançar e ataca aquilo que pode ser considerado obstáculo e ampliar os custos dos projetos na visão dos empreendedores. A aprovação do PL 3729 nos moldes apresentados implicará no desmantelamento do licenciamento ambiental no Brasil, permitirá o aprofundamento das graves violações de direitos humanos que ocorrem sistematicamente na implementação de grandes obras de infraestrutura, tornará ainda mais contundente o violento processo de desterritorialização dos povos da floresta, campos e águas, mas também afetará profundamente a vida de todos que vivem nas cidades, devido ao grande aumento da degradação ambiental que será propiciado.

O PL 3729 ameaça as florestas, a Amazônia, o equilíbrio climático, os rios, os povos, a vida em toda as suas formas e precisa ser impedido de qualquer maneira pelos brasileiros que querem viver em um país mais justo e soberano.

João Marcos Rodrigues Dutra é membro da Coordenação Nacional do MAB no estado de Rondônia e advogado do Coletivo de Direitos Humanos