A situação da direita não bolsonarista é alarmante. Não tem líderes, nem projetos além do defunto neoliberalismo. Temos que aproveitar esse cenário para nos fortalecer, ampliar nossa união em torno de um programa de reformas estruturantes da sociedade brasileira que tenham o mais pobre em seu centro.
Haverá lógica na política e terá ela seu tempo? Ou vivemos do imprevisto e do acaso, perguntas que nosso momento dá respostas, com base nos fatos e na realidade que compartihamos.
Doria candidato a não ser candidato, com um partido em crise, quase paulista, dividido. Ele terá um prazo para tentar viabilizar sua candidatura natimorta, rejeitado em seu estado, um desconhecido no Nordeste, com imensas dificuldades em Minas e Rio, nem falar do Norte. Mais um para fazer companhia a Ciro e Moro na cruzada suicida contra Lula e o PT. Sem falar no fato recente e na memória do eleitor de que apoiou Bolsonaro e se elegeu na onda bolsonarista.
Estamos diante de uma oportunidade histórica de retomar o caminho do crescimento com distribuição de renda num mundo em transformação que enfrenta os desafios da transição energética, ambiental e tecnológica, onde a principal questão é a desigualdade social e a falência do neoliberalismo.
Moro, outro que não só foi ministro do governo bolsonarista como conspirou desde a magistratura para eleger Bolsonaro, fez um pacto, um contubérnio, uma coabitação que terminou em traição, mas impediu a vitória do PT e elegeu Bolsonaro.
O ex-juiz suspeito e com suas sentenças nulas tem o agravante de ter sido mais do que bolsonarista. Foi o responsável por sua eleição, expressa o estado de decomposição de nossas elites, que depois da tragédia e do desastre do governo Bolsonaro têm o despudor de incentivar a candidatura de Moro para ver se ela pega, sinal do desespero e falta absoluta de alternativa no campo da direita, devastada também pela onda moralista e punitivista da Lava Jato, de suas ilegalidades e violações da Constituição.
A pergunta que se faz é, como depois da tragédia humanista e nacional do bolsonarismo, nossas elites ainda acreditem num candidato sem nenhuma experiência política rejeitado pela maioria do Congresso Nacional e dos partidos, que já se revelou um autoritário sem compromisso com o Estado de Direito, que tem o mesmo projeto para o país que o de Bolsonaro e nossa direita, ou ele será o candidato de novo antissistema e do combate à corrupção, bandeira esfarrapada e rota depois das revelações da Vaza Jato e da adesão de Bolsonaro ao sistema via centrão.
Crise da direita
No fundo, a situação da nossa direita não bolsonarista é alarmante. Seus partidos estão em crise, perdem votos a cada eleição e não têm líderes nacionais, responsáveis pelo golpe parlamentar-jurídico que derrubou Dilma, rasgando o pacto político e social de 88. Colhem agora os frutos do fracasso político, econômico e social da aventura bolsonarista sem a base eleitoral, social e ideológico do presidente. A prova está no abraço de afogados do DEM e PSL, e na irrelevância de seus candidatos para a disputa presidencial do MDB e dos tucanos. Sempre haverá o risco de essas forças políticas e parte de sua base eleitoral se unirem a Moro ou votar em Bolsonaro no segundo turno, daí a importância cada vez maior de nossa unidade e capacidade de ampliar nosso arco de alianças sem comprometer nosso programa.
O que no fundo define a essência, o núcleo da política da coalizão de centro-direita não bolsonarista é sua identidade com o programa econômico de Paulo Guedes e das reformas que o chamado centrão patrocina. Daí sua incapacidade, para além da propaganda eleitoral e da retórica, de construir uma alternativa à oposição de centro-esquerda que Lula representa por seu legado e por expressar o sentido histórico das conquistas sociais e políticas das maiorias dos trabalhadores e um projeto de desenvolvimento nacional e ser a garantia viável para virar a página do bolsonarismo.
Estamos diante de uma oportunidade histórica de retomar o caminho do crescimento com distribuição de renda num mundo em transformação que enfrenta os desafios da transição energética, ambiental e tecnológica, onde a principal questão é a desigualdade social e a falência do neoliberalismo.
Nossa oportunidade
As esquerdas em sentido amplo têm o desafio de se unir e garantir não apenas a vitória eleitoral, mas a governabilidade sem a dependência das forças políticas garantidoras de um modelo econômico fracassado que não provê o bem estar das maiorias que produzem a riqueza nacional.
De entender o novo que nasce, os jovens, as mulheres e os negros e negras, a diversidade LGBTQ+, forças emergentes que buscam um lugar ao sol e reafirmam seus direitos e cidadania, querem mudanças e garantias de dias melhores, buscam novas formas de fazer política e esperam inclusive uma mudança institucional um refazer do sistema eleitoral e político, mais democracia e mais participação popular.
Entender o mundo em conflito num rearranjo geopolítico onde a China assume paulatinamente a vanguarda das inovações e a liderança e os Estados Unidos é um império em crise e decadência. Para além da disputa e guerra comercial e tecnológica. o que assistimos é o fim de uma época, a do capitalismo financeiro neoliberal e da hegemonia única inaugurada com o fim da URSS e a queda do Muro de Berlim. Entender o lugar do Brasil no mundo e sua liderança e responsabilidade histórica na integração da América do Sul e Latina.
As esquerdas, começando pelo PT, têm pela frente o desafio de estar à altura do momento que vivemos para não apenas derrotar nas urnas Bolsonaro e direita que o sustenta, mas eleger uma bancada identificada com as mudanças que o país espera. Precisamos da unidade não apenas do bloco político mais próximo PT-PSB-PCdoB-PSOL mas inclusive do PDT, do PV e da Rede, para construir um programa que encante e esperance nosso povo trabalhador e construa uma frente nacional democrática que, insisto, responda aos desafios do momento histórico e retome o projeto de desenvolvimento nacional, a revolução brasileira inacabada.
José Dirceu foi líder estudantil nos anos sessenta, deputado estadual e federal pelo Estado de São Paulo e ministro-chefe da Casa Civil durante o Governo Lula.