O Senado deu um passo decisivo na tramitação da Reforma Tributária (PEC 45/2019), nesta terça-feira (7/11), quando a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou por 20 a 6 o substitutivo apresentado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM). Agora a proposta segue para a análise do plenário, antes de retornar para a Câmara dos Deputados.
No colegiado, o relator apresentou uma complementação de voto diante do grande volume de emendas apresentadas pelos colegas. Foram mais de 800 mudanças propostas. Eduardo Braga acatou mais de 250 de forma integral ou parcial.
Uma das mudanças promovidas se deu a partir de sugestão feita pelo senador Fabiano Contarato (ES), líder do PT no Senado. Assim, a nova legislação tributária deve desonerar a aquisição de medicamentos e dispositivos médicos adquiridos pela Administração Pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos.
“Desde a redemocratização, essa é a primeira vez que estamos tendo a oportunidade de debater e aprovar uma reforma tributária. Temos que avançar naquilo que é efetivamente possível. E esse é o momento da reforma tributária. E é essa reforma tributária que vai dar dignidade para a população”, disse o senador Fabiano Contarato.
A atualização do relatório inseriu mais uma possibilidade de devolução de tributos para a população mais carente. Além do cashback previsto para compras de itens da cesta básica e para o consumo de energia elétrica, o texto aprovado também prevê a modalidade na compra de gás de cozinha.
“A reforma, além de trazer uma transparência maior para o sistema tributário, também vem com o propósito de reduzir as desigualdades regionais que ocorrem, entre outras questões, pela forma de tributação atual”, destacou a senadora Augusta Brito (CE), uma das vice-líderes do PT no Senado.
Benefícios fiscais ao setor automotivo do Centro-Oeste e Nordeste
Na busca pela redução das desigualdades regionais, um dos focos da reforma, o relator incluiu a prorrogação dos benefícios fiscais ao setor automotivo do Nordeste e do Centro-Oeste. Com isso, a medida deverá ser prorrogada até 2032, caso passe no plenário e seja confirmada na Câmara.
“Garantir os incentivos é garantir o desenvolvimento de um setor tão importante e que gera tantos empregos de qualidade. É assegurar ao povo do nosso estado e a todo o Nordeste e o Centro-Oeste novas oportunidades, que geram melhoria da renda e transformam toda uma base social e econômica”, declarou o senador Humberto Costa (PT-PE).
Eduardo Braga também estendeu a isenção de imposto para indústrias automotivas que invistam em carros movidos a álcool. No texto anterior, ele permitia a concessão de créditos tributários para produção de veículos elétricos. A manutenção será válida para plantas de fábricas aprovadas ou implantadas até dezembro de 2025.
Emenda do senador Fabiano Contarato também permite que os benefícios fiscais ao setor automotivo sejam estendidos a projetos relacionados à produção de veículos movidos a biodiesel, isoladamente ou em conjunto com gasolina.
Esses benefícios, segundo o parecer, somente serão concedidos para pessoas jurídicas já habilitadas e serão condicionados a compromissos de investimento e volume de produção mínimo, nos termos do ato de concessão do benefício.
Sugestão da senadora Augusta Brito (PT-CE), parcialmente acatada pelo relator, garante regime fiscal diferenciado aos empreendimentos que se destinem à produção de hidrogênio verde e fertilizantes derivados desse processo produtivo.
No texto, o senador Eduardo Braga ainda decidiu manter a atual isenção de tributos na compra de automóveis por pessoas com deficiência ou no espectro autista, bem como por taxistas.
Unificação e simplificação de cobrança
Eixo central da reforma apresentada pelo governo Lula, a PEC 45/2019 unifica cinco tributos que hoje incidem sobre o consumo. Eles serão reunidos no imposto sobre valor agregado (IVA), como acontece na maior parte dos países. O IVA será repartido em dois: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), tributo federal, vai unificar PIS, Cofins e IPI. Já a tributação estadual será o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Esse reunirá o ICMS (estadual) e ISS (municipal).
Com esse novo modelo, a Reforma Tributária traz entre seus principais objetivos simplificar e modernizar o sistema de cobrança dos impostos sobre o consumo no Brasil, visto como um entrave ao desenvolvimento e claro fator de injustiça social.
“Esse não é um projeto de governo, é um projeto de Estado. Uma proposta que vai contribuir para o futuro do país. A simplificação tributária para quem quer investir e produzir no Brasil está garantida com essa reforma”, explicou o senador Rogério Carvalho (PT-SE).
Para se ter uma ideia de como a confusa legislação tributária empaca o crescimento econômico do país, se as mudanças previstas na reforma fossem aprovadas há 15 anos atrás, cada cidadão teria cerca de R$ 490 a mais de renda por mês. Esse valor representaria um crescimento potencial de, no mínimo, 12% do PIB, ou R$ 1,2 trilhão.
“Apesar de sermos a nona economia do planeta, somos o sétimo pior sistema tributário do mundo, segundo o Banco Mundial. Isso é um contrassenso. Esse foi um trabalho de inúmeras mãos, e não só de apoiadores de governo. Até por ser uma matéria de Estado”, enfatizou o líder do governo no Senado Jaques Wagner (PT-BA).
Outras mudanças
No texto aprovado pela CCJ, o relator da PEC 45 acatou sugestão do senador Rogério Carvalho (PT-SE) permitindo que os saldos financeiros dos recursos transferidos para o Fundo Nacional de Saúde e para o Fundo Nacional de Assistência Social para enfrentamento da pandemia sejam aplicados para custeio de ações e serviços públicos de saúde e assistência social. Essas operações poderão ser feitas até 31 de dezembro de 2024.
Emenda do senador Fabiano Contarato prevê a manutenção, em caráter geral, da carga tributária das operações financeiras, e, em específico, das realizadas no âmbito do FGTS e dos demais fundos garantidores.
“Com isso, preservamos, além do FGTS, o Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) e o Fundo Garantidor de Habitação Popular (FGHab), ambos do Programa Minha Casa Minha Vida, além do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS), entre outros fundos garantidores e de execução de políticas públicas. Parece um bom equilíbrio alcançado pela emenda”, explicou o relator.
Outra mudança de autoria do líder do PT no Senado define que os serviços de intermediação financeira, como bancos, terão um regime específico de tributação, de forma a manter, até o sexto ano de entrada em vigor do regime, a carga tributária vigente na data da promulgação da emenda constitucional. Também haverá regime específico para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
No caso da cobrança de tributos de embarcações, Braga decidiu zerar a alíquota de daquelas que sejam utilizadas em atividades econômicas. Nos demais casos, passa a valer a cobrança do IPVA dos chamados bens de luxo como iates e jatinhos.
“São muitos os benefícios que essa reforma traz para dar efetividade ao sistema tributário brasileiro”, resume o senador Fabiano Contarato.
Confira algumas inovações da reforma tributária
Cesta básica nacional sem tributos – A proposta prevê a criação da Cesta Básica Nacional de Alimentos, que será regulamentada posteriormente por meio de um projeto de lei complementar. Os produtos desta cesta ficarão com a cobrança de tributos zerada.
Também está prevista uma versão estendida da cesta básica. Neste caso, os produtos terão uma redução de 60% na tributação. Além disso, as pessoas de baixa renda terão a devolução do imposto pago, o chamado cashback.
O mecanismo de cashback terá será aplicado às contas de fornecimento de energia elétrica. Parte do valor cobrado para o fornecimento de energia elétrica ao consumidor de baixa renda será devolvido.
Comitê Gestor deve gerir recursos arrecadados – O Conselho Federativo, órgão definido pela Câmara dos Deputados para gerir o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que será criado para substituir e unificar o ISS (municipal) e o ICMS (estadual), será substituído pelo Comitê Gestor, caso seja aprovado o texto do Senado.
O Congresso Nacional poderá convocar o presidente do comitê e solicitar informações ao órgão, a exemplo do que acontece com ministros de Estado e o presidente do Banco Central.
A proposta ainda impede o comitê de propor projetos de lei. O órgão também passará por mecanismos de controle externo por meio dos tribunais de contas dos estados e municípios.
A PEC prevê a criação do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) de R$ 60 bilhões anuais. O fundo possibilitará aos estados substituir os atuais benefícios fiscais, que acabam progressivamente com a mudança da cobrança dos tributos no destino e não mais na origem.
Desconto em produtos de limpeza e higiene pessoas – Texto inclui produtos de limpeza e higiene pessoal na alíquota reduzida, com desconto de 60% em relação à alíquota geral. O benefício será destinado aos produtos majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda.
Estímulo à proteção ao meio ambiente – O IBS prevê a destinação para os estados de 5% daquilo que for arrecadado mediante atendimento de critérios de preservação ambiental determinados pelos entes da Federação. A ideia é estimular atividades econômicas ecológicas e a proteção da cobertura florestal.
Já o chamado Imposto Seletivo incidirá sobre os produtos de extração, como combustíveis fósseis e minérios, com alíquota de 1%, por serem produtos com maior impacto ambiental. Nesse caso, a tributação também valerá para produtos exportados.
O mecanismo também será aplicado sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
A introdução de um Imposto Seletivo sobre produtos ambientalmente poluentes e prejudiciais à saúde visa reduzir o consumo desses produtos.
Bens de luxo passarão a ser tributados – Como parte das medidas em busca da justiça social e tributária, a reforma prevê a cobrança de tributos de bens de luxo, como embarcações, helicópteros e aviões.
Atualmente, bens como jatinhos, iates e jet skis não pagam tributo no país. O IPVA é cobrado apenas de proprietários de motocicletas, carros e caminhões.
Também há previsão de tributação sobre heranças. Nesse caso, as alíquotas serão maiores para as consideradas grandes heranças. O índice de progressividade da tributação, segundo Braga, deve acompanhar o valor da parcela para os herdeiros (quinhão), não o valor final.
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