A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em Washington (EUA), se manifestou hoje (5) sobre a ação criminosa da Polícia Militar na favela Paraisópolis, no último fim de semana, que culminou com a morte de nove pessoas. “A esse respeito, a Comissão insta o Estado a investigar forma imediata e imparcial e punir os responsáveis por esses atos, bem como a reparar as vítimas e seus familiares”, afirmou a comissão, que é ligada à da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Na nota, a Comissão conclama o Estado brasileiro “a adotar as medidas necessárias para reformar o direito interno, em âmbitos federal e estadual, e harmonizá-lo com os padrões interamericanos e universais de direitos humanos relativos ao uso da força em intervenções policiais, observando os princípios de excepcionalidade, necessidade, proporcionalidade e legalidade”. E ainda destaca que o estado de São Paulo “deve garantir a participação das comunidades no desenho de estratégias e mecanismos de supervisão que visem melhorar a atuação dos agentes policiais”.
Confira a nota da CIDH:
Washington, D.C. – A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) manifesta sua preocupação a respeito da informação de que 9 pessoas perderam a vida e outras pessoas ficaram feridas após uma ação policial na Favela de Paraisópolis, São Paulo, Brasil. A esse respeito, a Comissão insta o Estado a investigar de forma imediata e imparcial, e punir os responsáveis por esses atos, bem como a reparar as vítimas e seus familiares.
Segundo informações obtidas pela CIDH, uma ação da polícia militar do estado de São Paulo, em 1º de dezembro, teria gerado pânico e tumulto entre os frequentadores de uma festa popular de rua – “baile funk” – na Favela de Paraisópolis. Na tentativa de evacuar o local, as pessoas teriam pisoteado as outras, resultando em 9 pessoas mortas, incluindo dois adolescentes de 14 e 16 anos, e ao menos 7 feridos.
Segundo a Secretaria da Segurança do Estado de São Paulo, a ação da polícia militar ocorreu durante uma operação na Favela de Paraisópolis, quando dois homens de motocicleta dispararam contra as tropas e fugiram para uma festa popular, ainda atirando, gerando tumulto entre os frequentadores do evento. Por outro lado, vítimas e testemunhas da tragédia afirmam que os policiais teriam fechado a rua onde estava ocorrendo a festa, utilizando gás lacrimogêneo e balas borracha contra as pessoas presentes, sem que houvesse um confronto. Segundo informações públicas e vídeos disponíveis, os policiais cometeram maus tratos e abusos de maneira indiscriminada contra jovens que se dispersaram na área de atividades culturais. Da mesma forma, a CIDH tomou conhecimento de que o serviço de atendimento médico de emergência que havia sido acionado para prestar atenção imediata às vítimas teria sido cancelado em seguida, a pedido dos agentes do Corpo de Bombeiros, com um forte indício de omissão que deve ser rigorosamente investigado.
A Comissão condena categoricamente essa ação policial e insta o Estado a iniciar, sem demora, uma investigação séria, imparcial e eficaz dos fatos, orientada a determinar a verdade, assim como a individualização, julgamento e eventual sanção dos responsáveis por esses fatos. Além disso, a Comissão lembra ao Estado o seu dever de reparar as vítimas de violência e suas famílias.
A CIDH, por diversas vezes, manifestou preocupação sobre o uso excessivo da força policial, particularmente no que diz respeito aos altos níveis de letalidade policial, seu impacto desproporcional sobre as pessoas afrodescendentes e o uso da força policial em contextos de protestos pacíficos. No mesmo sentido, durante sua visita in loco ao país, em novembro de 2018, a Comissão identificou que, em um contexto de discriminação estrutural, as forças policiais também realizam operações focadas em comunidades pobres e com alta concentração de pessoas afrodescendentes sem a observância das normas internacionais de direitos humanos e sem a existência de mandatos judiciais.
Nesse sentido, a Comissão chama o Estado a adotar as medidas necessárias para reformar o direito interno, em âmbitos federal e estadual, e harmonizá-lo com os padrões interamericanos e universais de direitos humanos relativos ao uso da força em intervenções policiais, observando os princípios de excepcionalidade, necessidade, proporcionalidade e legalidade.
Da mesma forma, a CIDH recorda que o Estado deve garantir a participação das comunidades no desenho de estratégias e mecanismos de supervisão que visem melhorar a atuação dos agentes policiais, bem como empenhar esforços e adotar medidas legislativas para reverter a militarização da polícia. Finalmente, a CIDH chama o Estado brasileiro a revisar seus protocolos de segurança com um foco em direitos humanos.
A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge a partir da Carta da OEA e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Comissão Interamericana tem como mandato promover a observância e defesa dos direitos humanos na região e atua como órgão consultivo da OEA na temática. A CIDH é composta por sete membros independentes, que são eleitos pela Assembleia Geral da OEA a título pessoal, sem representarem seus países de origem ou de residência.