A catastrófica condução socioeconômica do desgoverno Bolsonaro fez quase dez milhões de pessoas cruzarem para baixo a linha da pobreza no Brasil entre 2019 e 2021. “Foram 9,6 milhões de pessoas que cruzaram a linha. É quase a população de Portugal”, assusta-se o diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social), Marcelo Neri.
“Os maiores nível e incremento da pobreza na pandemia são robustos. Eles pintam o mapa da pobreza brasileiro em tons mais fortes de tinta fresca”, afirma o pesquisador na apresentação do Mapa da Nova Pobreza. Segundo ele, “a pobreza nunca esteve tão alta no país quanto no ano passado, desde o início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, em 2012”.
Divulgado nesta quarta-feira (29), o estudo coordenado por Neri revela que o contingente de pessoas com renda domiciliar per capita de até R$ 497 mensais atingiu 62,9 milhões de brasileiros em 2021. São 29,6%, ou quase um terço da população total de brasileiros, tentando sobreviver com menos de meio salário mínimo a cada mês.
“A pobreza nunca esteve tão alta no país quanto no ano passado, desde o início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, em 2012”, segundo o diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social), Marcelo Neri.
“Demonstramos neste trabalho que 2021 é ponto de máxima pobreza dessas séries anuais para uma variedade de coletas amostrais, conceitos de renda, indicadores e linhas de pobreza testados”, explica o economista. Foram analisados dados de pobreza entre os 146 estratos geográficos nacionais e todas as Unidades da Federação.
A pesquisa avaliou o nível e a evolução espacial da pobreza durante os últimos anos com base em microdados da Pnad Contínua Anual, divulgados recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Santa Catarina (10,16%) foi o estado com a menor taxa de pobreza registrada, e o Maranhão (57,90%), com a maior.
“Aquele com maior pobreza em 2021 é o Litoral e Baixada Maranhense, com 72,59%. Já a menor está no município de Florianópolis, com 5,7%. Uma relação de 12,7 para um, refletindo a conhecida desigualdade geográfica brasileira”, conclui Neri.
Montanha-russa de ascensão e decadência em três anos
Em meados de junho, a FGV Social publicou outro estudo (A Montanha-Russa da Pobreza), revelando que a mudança da proporção de pobres se acelerou entre 2020 e 2021. De um ano para outro, o salto foi de 42,11%, correspondendo a 7,2 milhões de novos pobres em relação a 2020 e 3,6 milhões de novos pobres em relação ao pré-pandemia.
“Em termos da última fotografia anual da pobreza, 10,8% da população estava abaixo da linha de pobreza de R$ 210 per capita em 2021, ou cerca de 23 milhões de pessoas. Em termos relativos ou absolutos, é o nível mais alto da série histórica”, afirma Neri na apresentação. “Esta linha, embora baixa para suprir necessidades básicas, é usada como critério de elegibilidade a algum benefício pelo Auxílio Brasil.”
Neri diz que “os brasileiros mais pobres têm de fato vivido uma montanha-russa nos três últimos anos”. Conforme o pesquisador, a renda mensal dos 10% mais pobres já vinha em queda antes da chegada da covid-19, despencando a menos da metade no início do isolamento social (R$ 114 em novembro de 2019 a R$ 52 em março de 2020).
A renda do grupo foi mais do que quadruplicada até o pico histórico em agosto de 2020 (R$ 215), que Neri considera “a fase mais generosa do Auxílio Emergencial”. Mas daquele pico, o valor desabou novamente, ficando 15,8% abaixo do nível pré-pandemia (R$ 96) em novembro de 2021.
“Este último valor projeta tendência negativa, pois incorpora os valores nominais fixados do novo Auxílio Brasil face o cenário prospectivo de inflação alta, especialmente para baixa renda”, ressalta o pesquisador. “Além de prosperidade e igualdade, estabilidade é um atributo fundamental para o bem estar social. Tal como as duas primeiras, ela se encontra em falta no caso brasileiro”, finaliza.
Golpe e Bolsonaro destruíram conquistas da população
O diretor do FGV Social coordenou um estudo apresentado em 2008 sobre a “nova classe média”. A pesquisa, hoje clássica, abordou a parte da população anteriormente classificada como classe de renda D que, na segunda metade da década de 2000, ascendeu à classe de renda C.
Entre 2003 e 2008, o número de brasileiros estatisticamente considerados como pobres se reduziu em três milhões. Segundo pesquisa do Instituto Data Popular, mais de 42 milhões de brasileiros ascenderam à nova classe média até 2014.
O consumo dessa classe que finalmente ascendera socialmente injetou anualmente cerca de R$ 1,1 trilhão na economia brasileira, ajudando o país a minimizar os impactos da crise internacional de 2008-2011. Em 2014, com pleno emprego, alta taxa de formalização do trabalho e 92% dos reajustes de data-base superiores à inflação, a classe C brasileira, isoladamente, tornou-se o 18º maior mercado de consumo do mundo.
Após a reeleição de Dilma Rousseff, a crise promovida pelos derrotados em 2014 fez com que seis milhões de brasileiros deixassem essa faixa de renda entre 2015 e 2018. Em 2014, as pessoas que viviam na pobreza eram 9,8% da população, menor índice da série histórica. Pelos cálculos de Marcelo Neri, mesmo que o Brasil crescesse, em média, 2,5% ao ano, só voltaria a ostentar índices de pobreza semelhantes a 2014 em 2030.
Da Redação, com informações da FGV