No dia 20 de novembro, o Partido dos Trabalhadores acionou formalmente o presidente do TSE, Luís Alberto Barroso, e o Procurador Geral Eleitoral, Augusto Aras, acerca dos graves fatos que atingiram as candidatas mulheres em 2020, antes, durante e depois do período eleitoral.
“É fato notório a criação de obstáculos para a participação política das mulheres; fato reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal em inúmeras oportunidades”, aponta o documento assinado pela presidenta do PT, Gleisi Hoffman, e pela Secretária Nacional de Mulheres do PT, Anne Moura.
O documento exige providências relacionadas a casos de violência política contra candidatas mulheres de diversos partidos, não apenas do PT.
“As candidatas mulheres que foram às ruas contra o fascismo, o machismo e o discurso de ódio foram as que mais sofreram maior violência política. O momento é de união para vencer a misoginia, garantir a pluralidade de debates e a criação de um espaço verdadeiramente democrático, que não inviabilize, nem crie obstáculos à participação das mulheres na política”, explicou Anne Moura.
A medida requere ao Tribunal Superior Eleitoral, com a urgência que a situação demanda, providências no sentido de determinar aos órgãos incumbidos da persecução penal especial atenção e mobilização para a efetiva proteção tanto das mulheres que estão concorrendo o segundo turno quanto das mulheres candidatas que venceram as eleições e sofreram (e ainda sofrem) ataques.
Dentre os casos apontados pelo documento, estão os casos de feminicídio da candidata à Prefeitura de Curralinho pelo PT, Leila Arruda, morta a facadas e pauladas pelo ex-marido, de quem estava separada há mais de três anos; e das agressões sofridas pela candidata Leda Mota, candidata a vereadora pelo PCdoB em Resende (RJ). Leda foi vítima de agressão por parte de seu companheiro e, ao denunciar o caso na delegacia, sofreu nova violência ao ser presa por desacato, sob a absurda justificativa de que estaria “causando tumulto com fins eleitorais”.
Crimes de racismo e ameaça de morte também figuraram no processo eleitoral deste ano em relação às mulheres. A vereadora eleita Ana Lucia Martins, do PT, em Joinville/SC, primeira negra da história da Câmara Municipal da cidade, recebeu um comentário em suas redes que justificava a ameaça de morte com a pretensão de “entrar o suplente que é branco”. Ela ainda sofreu um ataque hacker que, no domingo, dia da eleição, apagou suas fotos e dados da biografia. Crimes contra a honra após a eleição da vereadora do PT, Thays Bieberbach, em comentários que, nitidamente, desmerecem a própria condição de mulher. Os impropérios misóginos se misturam entre os seguintes: “anta”, “acéfala”, “merda”, “idiota”, “lixo”, “verme”, “otária”, “doente mental”.
A comprovada violência de gênero contra a candidata da Rede Sustentabilidade à Prefeitura de São Paulo, Marina Helou, que, após o debate entre os candidatos, realizado pela Band, em 1º de outubro, recebeu mensagens nas redes que faziam comentários sobre seu corpo, perguntavam se ela era casada, além do caso da deputada estadual Delegada Adriana Accorsi (PT) em que ela e sua família foram ameaçadas por um perfil falso na rede social Instagram. Uma conta identificada como Hugo Rossi enviou mensagens de cunho ameaçador para a parlamentar, que concorreu à Prefeitura de Goiânia nestas eleições, chegando perguntar se ela já havia “comprado caixão” para suas filhas.
“Foram companheiras do PT, PCdoB, Rede, PSOL, dentre tantas siglas, e em todas tem um recorte muito específico: as mulheres negras foram as que mais sofreram ataques”, reforçou Anne Moura.
Pesquisa realizada pelo Instituto Marielle Franco, em parceria com a Justiça Global e a Terra de Direitos, revelou que 98% das candidatas negras, de um universo de 142 mulheres entrevistadas, sofreram algum tipo de violência durante o pleito deste ano.
Os casos de agressão mais recorrentes aconteceram online. Segundo o levantamento, 78% das candidatas negras que responderam à pesquisa foram alvo de ofensas racistas em suas redes sociais durante a campanha, e, quase metade das entrevistadas (42%), foi alvo de alguma modalidade de violência física. Benedita da Silva (RJ), candidata a prefeita do Rio de Janeiro pelo PT, foi uma dessas mulheres que enfrentou esse quadro de intolerância, racismo e ódio gratuitos.
A medida visa reduzir a desumana violência psíquica e física que as candidatas têm sofrido durante o processo eleitoral e escapar à reprodução de concepções convencionais do ‘feminino’, que vinculam as mulheres à esfera privada e/ou dão sentido a sua atuação na esfera pública a partir do seu papel convencional na vida doméstica.