Em plena pandemia, o governo Bolsonaro prepara mais um “vale verde” para beneficiar o “Partido do Exército” e o conjunto das Forças Armadas brasileiras. Desta vez, a proposta é criar duas gratificações só para militares, elevando as remunerações em até R$ 7 mil. A nova vantagem é questionada até pelo Ministério da Economia, que cobrou do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) as justificativas para o “significativo” aumento. A deputada Gleisi Hoffmann (PR) e presidenta do PT classificou a proposta de “indecente” e advertiu que o governo deveria estar preocupado com a pandemia, o Fundeb e o auxílio emergencial.
Diante disso, o general Augusto Heleno, chefe do GSI, parece ter errado o endereço quando chamou de “saqueadores” do dinheiro público “todos os governos dos últimos trinta anos”, em entrevista à rádio Jovem Pan, na segunda-feira, 20. “A participação dos militares ao governo foi reação ao período triste em que o Brasil foi saqueado, e não só nos recursos financeiros, mas nos recursos de formação da sociedade, recursos educacionais e na convicção do brasileiro de que temos condições de ser um grande País”, disse na entrevista.
O plano é bem articulado para atender os interesses do “partido do Exército” que ocupa cerca de seis mil cargos no atual governo Bolsonaro. De acordo com o projeto, as gratificações beneficiariam cargos ocupados por militares, com remunerações maiores que os valores atuais. Oficiais que hoje recebem até R$ 1.734,92 para exercer cargo de confiança na administração podem passar a receber até R$ 6.991,73, de acordo com minuta de Medida Provisória à qual o Estadão/Broadcast teve acesso.
O texto, segundo matéria do jornal Estado de S. Paulo, está na mesa do Chefe da Casa Civil, general Braga Neto. Após editada, a Medida Provisória tem vigência imediata, mas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional em até 120 dias. Segundo o Estadão, no entanto, técnicos do governo veem espaço para a edição da MP porque a reorganização não resultará em aumento líquido de despesa.
Ainda, de acordo com o jornal, o próprio Ministério da Economia reconheceu que a lei permite, em tese, reestruturar cargos desde que não haja alta nos gastos. A proposta é criar quatro tipos de cargos e funções: Cargo Comissionado Executivo (CCE), Função Comissionada Executiva (FCE), Cargo Comissionado Militar (CCM) e Gratificação de Militares Fora da Força (GMFF).
Acumulo de salários
A proposta avança para o terreno da “mordomia” quando, além de garantir a reserva de vagas, prevê acumular a remuneração integral dos cargos e funções,civil e militar. Ou seja, os militares poderão receber 100% de ambas as funções – da carreira militar de origem e do governo. Outros servidores, diferente disso, tem de escolher entre possibilidades menos vantajosas, como receber o salário do cargo efetivo de origem mais 60% da remuneração comissionada.
Atualmente, segundo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), a quantidade de militares da ativa e da reserva em postos civis no governo Bolsonaro passou de 2.765 em 2018 para 6.157 em 2020. No mesmo período, o número de militares que ocupam cargos comissionados cresceu de 1.934 para 2.643.
Anteriormente, os militares foram poupados na Reforma da Previdência que confiscou direitos dos trabalhadores brasileiros, especialmente dos mais pobres. Também foram excluídos do congelamento de salários imposto ao funcionalismo público, em vigor até 2021. E, ainda, em 2019, obtiveram um novo plano de carreira, que resultou em aumentos que chegaram a 40% para os salários dos postos mais altos da carreira militar.
Em 2020, os militares tiveram seu ganhos salariais engordados com um reajuste de até 73% a título de “adicional de habilitação”. O penduricalho é concedido aos militares das Forças Armadas que fazem cursos ao longo da carreira. Com um custo orçado em R$ 26,54 bilhões em cincos anos, a vantagem já foi incorporada na folha de pagamento de julho dos militares. Generais poderão ganhar até R$ 1.600 a mais.
Em plena pandemia, com o Fundeb ameaçado, o impacto será de R$ 1,3 bilhão neste ano, de acordo com nota técnica do Ministério da Economia e dados do Ministério da Defesa. Na última quinta-feira, 20, o TCU (Tribunal de Contas da União) decidiu manter o pagamento de reajuste correspondente de 12%. Os ministros julgaram improcedente o pedido do Ministério Público de Contas pela suspensão do reajuste durante a pandemia.