As brasileiras e os brasileiros nunca estiveram tão pessimistas. O coquetel negacionista do desgoverno Bolsonaro, que resultou num absurdo número de mortes por covid-19, impactos avassaladores sobre a atividade econômica e o recrudescimento da desigualdade e da fome, envenenou as expectativas de consumidores e empresários, conduzindo à pior percepção sobre a situação atual das finanças familiares e da economia em mais de quinze anos.
O estudo ‘Indicadores de Sentimento: Confiança e Incerteza’, do Instituto Brasileiro de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre), aponta que o risco percebido por consumidores em relação a emprego, renda e a própria saúde chegou a níveis históricos em março. Desde o início da série, em setembro de 2005, nunca havia ocorrido uma queda tão expressiva e generalizada dos índices de confiança.
A derrocada conduzida pelo ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, supera largamente os efeitos positivos da campanha de vacinação no Brasil, que se desenrola em ritmo aquém do desejado pela maioria. A queda acentuada do índice que mede as expectativas empresariais para os meses seguintes levou o nível desse indicador de pessimismo moderado para pessimismo.
“O destaque negativo foi a queda de 18,5 pontos da confiança do Comércio, influenciada por uma completa revisão de expectativas, que passaram de neutras para muito pessimistas entre fevereiro e março. É a primeira vez desde fevereiro de 2020 que o setor de Serviços não apresenta o menor nível de confiança entre os quatro setores”, avaliam os pesquisadores da FGV.
Em compensação, mesmo após a terceira queda seguida, a confiança da Indústria continua elevada. A distância entre o nível de confiança do setor e o da média dos demais setores é recorde desde 2010, quando foram criados os índices do Comércio e da Construção. Apesar de o Nível de Utilização da Capacidade Industrial (NUCI industrial) ter recuado em março, o indicador ainda está acima do nível pré-pandemia.
Já os índices de Situação Atual caíram em todos os grandes setores em março. “Após ligeira melhora das expectativas do Comércio no início de 2021, o indicador despencou 26 pontos em março, a maior variação negativa na série histórica. Com isso, as expectativas do Comércio são as piores entre os setores e consumidores”, afirma o estudo. No setor de Serviços, o mais afetado pela crise, dentre os cinco principais segmentos a percepção em relação à situação atual continua pior nos serviços prestados às famílias, seguidos por transportes.
Trabalhadores de baixa escolaridade
Em outro estudo, apresentado em 31 de março, o FGV/Ibre revelou que a pandemia de coronavírus impactou o mercado de trabalho como um todo, mas afetou principalmente os trabalhadores informais e os de baixa escolaridade. A redução do emprego foi significativamente maior entre eles, e as dificuldades continuarão no pós-pandemia.
“Quanto menor a qualificação e quanto mais baixos os salários, maior foi o abalo”, afirma o economista Fernando Veloso. A partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE, ele descobriu que, do total de 7,3 milhões de postos de trabalho perdidos em 2020, 76% eram ocupados por brasileiros com até dez anos de estudo.
Embora a redução do emprego formal no primeiro ano de pandemia tenha sido expressiva (-4,2%), a queda no emprego informal foi três vezes maior (-12,6%) na média do ano em termos proporcionais. Na média nacional em 2020, o número de ocupados no país encolheu 7,9%.
Em termos absolutos, dos 7,3 milhões de posto de trabalho eliminados no país no ano passado, 5,1 milhões eram de trabalhadores informais, com destaque para os domésticos sem carteira (-18,8%), empregados sem carteira (-16,5%) e conta própria sem CNPJ (-10,3%).
O pesquisador avalia que uma melhora do mercado de trabalho só deverá ser observada no segundo semestre, a depender do avanço da vacinação e da redução das incertezas econômicas. “Acredito que ainda será um cenário muito difícil, com salários crescendo muito pouco e desemprego caindo lentamente”, prevê.
Além do aumento do desemprego, milhões de pessoas saíram da população economicamente ativa, passaram a trabalhar menos do que gostaria ou simplesmente desistiram de procurar emprego, os chamados desalentados.
Em 2020, a taxa de desemprego média anual foi de 13,5%, a maior da série iniciada em 2012. Segundo o IBGE, o contingente de desalentados aumentou em 16,1% em relação a 2019, chegando a 5,5 milhões de pessoas. Já o número total de subutilizados ficou em 31,2 milhões, o maior da série anual, com alta de 13,1% (mais 3,6 milhões de pessoas).
Da Redação