O partido de Bolsonaro, que supostamente seria o primeiro a compor a base governista, contribui para aumentar a barafunda criada pelo governo. A bem da verdade, ninguém pode dizer que foi enganado. Antes de assumirem, já dividiam entre si o direito de atacar esse ou aquele partido ou parlamentar.
A nova política, como diz Bolsonaro, nada mais é do que a antipolítica. Em vez de construir relações no Congresso e atrair parlamentares para a base do governo, o maior esforço é para escrachar publicamente a todos, aliados ou adversários.
Nisso são coerentes. Durante jantar nos EUA, Bolsonaro discursou que, antes de construir, é preciso desconstruir muita coisa. Nisso, estão se mostrando esforçados, inclusive o sistema que o elegeu.
No governo misturam religião com políticas públicas, destroem as relações externas, brigam com um dos principais parceiros comerciais, a China, que se acerta com os americanos e nos deixam falando sozinhos.
A vitória de Bolsonaro significou uma onda gigantesca por mudança. Lembremos que o PT foi derrotado no segundo turno, mas o PSDB amargou 4% na eleição para presidente. Marina Silva, que obtivera em torno de 20% em duas eleições, caiu para 1%. Esse público perdeu em maioria para Bolsonaro. No empresariado urbano, nos produtores rurais, mercado financeiro e nas grandes corporações de Estado, como juízes, MP, polícias, advogados, auditores, ele teve maioria esmagadora. O mais espantoso é que ele não falou nada na campanha. Não apresentou nada do que pretendia fazer. Recebeu uma carta branca para governar como quisesse. Nesses três meses ele está justamente fazendo isso: governa como quer, não se considera obrigado a dar satisfações a ninguém. A elite brasileira apostou no escuro e sem responsabilidade. Pensando em seus interesses. Vai pagar o preço. O pior é que o povo está pagando junto.
Os que lhe deram carta branca não estão gostando do que estão vendo. Filhos enrolados em maracutaias no legislativo, ligações com milícias, um partido que nem existia e que apareceu já cheio de laranjas penduradas e verbas desviadas.
Agenda que não havia sido anunciada, como essa reforma da Previdência, intenções bélicas contra a Venezuela, aliança prioritária com Israel, em detrimento dos árabes. E ainda vem a tal agenda de costumes, que tem um monte de maluquices que até os conservadores ficam de cabelos em pé. Já tem muita gente querendo cassar a tal carta branca.
Já estão convidando o Mourão para reuniões, no mercado financeiro, já dizem que a tal reforma da Previdência sairá chocha ou nada sairá, no setor do agronegócio já estão de cabelos em pé há algum tempo e outros sinais de que a ficha está caindo. Bolsonaro não dá conta de governar um país com a complexidade do Brasil. Só que ele não está fazendo nada de extraordinário, apenas se revela. Fez campanha sem dizer nada a respeito de nada, não compareceu a debates e pouco foi questionado. Mostra a sua cara aos que o apoiaram em massa e cegamente. Todos se assustam. Mas é o Bolsonaro. Ele estava aí, nessa “nova política, há 28 anos e foi comprado e vendido ao povo como uma imensa novidade, um salvador da pátria. É esse o Bolsonaro que foi eleito. E ainda nem começou a esgrimir a sua pauta de “costumes” com todas aquelas maluquices. Quando isso aparecer, vai haver pânico.
O que estamos vendo no andar de cima nada mais é que a hipocrisia dos que apostaram todas as fichas nele e agora se dizem surpreendidos. Acharam que Paulo Guedes ia se responsabilizar pela área econômica, que Moro fosse cuidar da Justiça como se eles fossem os verdadeiros eleitos para tanto. Acharam que os militares convocados para a administração, quase uma divisão inteira já nomeada, seriam os avalistas e tutores desse incompetente. Mas parece que ele resolveu assumir que governa o país, para desespero de seus avalistas. E não poderia ser diferente, porque ele é quem, mesmo numa eleição questionável, foi eleito. Mas apostaram que bastariam dois dedos de prosa e o Congresso iria assumir a pauta da equipe econômica e a agenda de Sérgio Moro. Dá vontade de rir.
Agora, os parlamentares que fizeram sua campanha querem debater os temas e são tratados como picaretas, o presidente insinua que querem lhe fazer (ou já fizeram) pedidos impublicáveis, típicos da velha política.
Se o mercado financeiro quiser, podemos desenhar para que entendam: Bolsonaro é quem manda e ele vai fazer o que sabe, vai para o Twitter mobilizar sua base e atacar a todos que considera da velha política. A votação da Previdência, bem como outros projetos polêmicos.
A pauta na área social, Educação, Direitos Humanos, política para mulheres, tudo isso ainda nem apareceu na arena política. Bolsonaro deve estar pensando que basta mandar tudo isso para o Congresso e insuflar sua base, que os parlamentares serão encurralados e votarão depressa, para se livrarem da pressão nas redes sociais.
A crise que vive o Brasil é uma das maiores da história recente. A indução, pela classe dominante, da eleição de Bolsonaro, está apresentando a fatura. O pior, de tudo isso, é que nosso povo está sofrendo com o desemprego, baixa renda, cortes de programas sociais, volta da miséria e da fome. Tudo só tende a piorar. Os condutores dessa desgraça são irresponsáveis, inconsequentes e ordinários. Não mereciam ser chamados de brasileiros!
Gleisi Hoffmann é deputada federal (PT-PR) e presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores