*“A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II- referendo; III – iniciativa popular”.*
Capítulo IV, Dos Direitos Políticos, Art. 14. Constituição da República Federativa do Brasil
O Senado trava, neste momento, uma das mais importantes batalhas políticas de sua história. Em 26 de outubro, começou a tramitar na Casa a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, que pelos próximos 20 anos limitará os gastos e investimentos públicos apenas à correção da inflação, independentemente do que venha a acontecer com a economia.
Como se sabe, o governo tem muita pressa em aprovar a medida, tanto que bloqueou o debate na Câmara dos Deputados, onde ela foi aprovada à revelia da sociedade e sem a mínima discussão. Agora, as lideranças do governo golpista agem para que o mesmo ocorra no Senado.
Os tecnocratas oficiais e essas mesmas lideranças alegam que a PEC é essencial para promover o equilíbrio fiscal e evitar o suposto “descontrole da dívida pública”. Mas eles têm plena consciência de que está cada vez mais difícil convencer a população sobre tamanha falácia. Por isso correm para aprová-la. Por isso não querem ouvir a opinião do povo, cujo destino por duas décadas está sendo traçado.
Mas o rolo compressor do governo não nos intimida. Mesmo com a aprovação do parecer favorável do relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e a rejeição de todas as emendas ao texto apresentadas pelos senadores da oposição, nós dos partidos de esquerda ainda vamos brigar muito contra essa afronta à Constituição.
Neste momento, buscamos o apoio de outros colegas para a reapresentação, em plenário, de emendas rejeitadas na CCJ no último dia 9. Entre elas, a de minha autoria, que estabelece a realização de um referendo para que o povo diga se aprova ou não a draconiana contenção dos gastos públicos por tanto tempo. Temos a esperança de conseguir as 27 assinaturas necessárias ao acolhimento das emendas pela Mesa Diretora. Muitos senadores estão atentos à crescente voz das ruas. Entre alguns deles também crescem as dúvidas sobre os questionáveis “benefícios” de uma mudança tão radical na política econômica do país.
Não sejamos hipócritas, todos sabem que o governo mente. Se é verdade o que eles prometem, ou seja, que não vão reduzir os recursos da saúde e da educação, por que então vão retirar essa garantia da Constituição? Só me convencerá de que nada vai ser mexido nessas áreas se elas forem excluídas dessa PEC. Caso contrário, esses recursos serão, sim, diminuídos para pagar o serviço da dívida pública.
Aliás, em outro argumento não menos hipócrita, Michel Temer e sua turma alardeiam como principal argumento a favor da PEC da maldade o estouro da dívida pública. É mais uma mentira. O PT não aumentou a dívida pública. Durante os governos do PT, tivemos reduções substanciais da dívida pública brasileira, basta olhar os dados do Banco Central. Quem promoveu o aumento alarmante dessa dívida foi o governo tucano. Quem diz não sou eu, é o Banco Central. De 1995 a 2002, Fernando Henrique Cardoso fez a dívida crescer inacreditáveis 752%. No governo do Lula, a dívida pública cresceu 79%, no governo da Dilma, 31%, mesmo com o estouro ocorrido em 2014 e 2015. Isso foi menos que a inflação do período. É ou não é uma falácia?
Ora, chega de mentiras! Derrubaram a presidenta Dilma com o único objetivo de deixar o caminho livre para fazer o que estão querendo fazer, que é irrigar os bancos com mais juros e os rendimentos dos mais ricos. Por que não reduzem os juros, por que não taxam os lucros e dividendos da casta sempre privilegiada, por que não cobram impostos das grandes fortunas e sobre as grandes heranças? Nós da oposição estamos sugerindo isso.
Para o andar de cima, a PEC 55 não existe. Vai sobrar para o aposentado, para o dependente do SUS, para o pai que tem filho em escola pública e para os extremamente pobres que dependem do amparo do Estado. É por isso que eles têm medo do referendo, medo de enfrentar o debate popular.
Por favor, como prega a nossa Constituição, respeitem a soberania popular. O povo tem que se manifestar sobre quem vai pagar a conta desse ajuste fiscal.
Gleisi Hoffmann é senadora pelo PT do Paraná. Foi ministra-chefe da Casa Civil do governo Dilma Rousseff.