Caso o presidente Jair Bolsonaro esteja movendo uma “investigação paralela” sobre a morte do miliciano Adriano da Nóbrega, ocorrida durante operação policial no interior da Bahia na semana passada, a ação poderia ser tipificada como “obstrução de Justiça”. Trata-se de um crime comum, mas também um crime de responsabilidade, passível de impeachment, segundo o jurista Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Bolsonaro cobrou nesta terça-feira (19) uma “perícia independente” no corpo do miliciano. “Já tomei as providências legais para que seja feita uma perícia independente. Porque, sem isso, você não tem como buscar até, quem sabe, quem matou a Marielle”, disse em entrevista coletiva. “Tem outra coisa mais grave. Vai ser feita perícia no telefone apreendido com ele (Adriano). Será que essa perícia poderá ser insuspeita? Porque eu quero uma perícia insuspeita. Por quê? Nós não queremos que sejam inseridos áudios no telefone ou inseridas conversações no WhatsApp.”
Segundo Serrano, é preciso investigar se a intenção do presidente se converteu em ordens para iniciar a tal “investigação”, ou se foi apenas bazófia. ” É preciso verificar: Ele declarou uma intenção ilícita meramente, mas que alguém pode chegar a ele e fazê-lo recuar no plano jurídico-penal, ou iniciou a execução? Se iniciou, já cometeu crime”, disse o jurista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta quarta-feira (19). Ele criticou a “tolerância excessiva” das instituições com as condutas do presidente.
Agindo para se defender preventivamente, Bolsonaro estaria “vestindo a carapuça” que denunciaria o seu envolvimento e da sua família com o miliciano. Apenas na condição de acusado é que poderia, em sua própria defesa, solicitar a produção de provas, explicou Serrano. Como presidente, ele não pode interferir.
“Usar do poder do Estado para realizar uma investigação paralela da polícia é obstrução de Justiça claramente. Não há dúvida. Se ele quiser fazer uma investigação desse tipo, que o faça como investigado. Se ele se considera investigado, já estaria vestindo a carapuça de eventual relação com o que ocorreu com Adriano, o que é estranho”, destacou.
A intromissão no trabalho de investigação da polícia também foi objeto de protesto da maioria dos governadores. Em carta assinada por 20 dos 27 comandantes dos Executivos estaduais, eles afirmaram que esse tipo de declaração “se antecipando a investigações policiais para atribuir fatos graves à conduta das polícias e de seus Governadores, não contribuem para a evolução da democracia no Brasil”.
Humilhação
Além de humilhar as polícias estaduais envolvidas na investigação, Bolsonaro também rebaixa a própria Polícia Federal (PF), que não atua mesmo diante de indícios de cometimento de crimes como este, segundo Serrano. Ele diz que a PF foi “aprisionada” por um pequeno grupo de delegados colocados em postos-chave que são alinhados com o que ele chama de “bolsonarismo jurídico”, que compreende ataques e perseguições a inimigos políticos.