O presidente Lula participou, nesta quarta-feira (12), no Palácio do Planalto, da solenidade de entrega da Ordem Nacional do Mérito Científico e de retomada do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT). Em um gesto de reparação histórica, o presidente e a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, condecoraram entidades e pesquisadores, entre os quais a médica sanitarista Adele Benzaken e o infectologista Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda, que tiveram a honraria revogada em 2021. Também foram agraciados outros 21 cientistas que, em solidariedade aos dois colegas, haviam renunciado à indicação do governo passado.
Adele Benzaken, médica sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), foi retaliada pelo governo negacionista de Jair Bolsonaro por ter incluído a diversidade em uma campanha de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, quando era diretora do Departamento de HIV/Aids do Ministério da Saúde. O infectologista Marcos Vinicius Lacerda, por sua vez, sofreu o mesmo desrespeito por ter publicado estudos científicos que apontavam a ineficácia da cloroquina no tratamento da covid-19.
Durante o evento, o mote “a ciência voltou!” esteve presente em todos os discursos, que também lamentaram o abandono da ciência e a perseguição aos pesquisadores durante o governo obscurantista de Bolsonaro.
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“O real significado desse evento vai muito além de atos formais. Estamos reunidos aqui, hoje, para dizermos em alto e bom som: chega de obscurantismo! Basta de negacionismo! Chega de jogar cientistas às fogueiras! Não mais aquela da idade média, mas a que a mentira e o discurso do ódio acenderam na internet em grupos radicais na nossa sociedade”, disse Lula. “Chega de aceitar que cientistas como Adele Benzaken ou Marcos Vinícius Guimarães Lacerda tenham as suas condecorações revogadas. Ela, porque se preocupou com a saúde dos homens trans, ele porque ousou publicar a verdade, de que a cloroquina não combatia a covid”, acrescentou.
Lula também citou o físico Ricardo Galvão, demitido da diretoria do Inpe por Bolsonaro, em 2019, após o negacionista contestar dados do instituto que mostravam alta do desmatamento na Amazônia. Nomeado, em janeiro deste ano, como presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Galvão também foi um dos agraciados por Lula com a Ordem do Mérito Científico.
“Basta de testemunhar pesquisadores como Ricardo Galvão perdendo o seu cargo porque mostrava aquilo que os satélites registravam, e que todos com a mínima honestidade intelectual podiam ver. Nos últimos anos, a Amazônia estava sendo degradada a um ritmo cada vez maior e incontrolável”, afirmou Lula. “O Brasil não merece mais ter suas instituições aviltadas, a ponto de tanta gente série da ciência devolver a Ordem do Mérito Científico. Gente que, felizmente, aceitou receber a condecoração de novo, hoje, e aceitou porque sabe que a ciência voltou definitivamente nesse país”, ressaltou.
O presidente disse que “a ciência voltou porque temos pesquisadores e pesquisadoras brilhantes e combativos, que, apesar das perseguições dos últimos anos, não se deixaram abater, porque temos organizações da sociedade civil que sabem quando e como lutar”. Além disso, segundo ele, a ciência “voltou porque nossas instituições de pesquisa, apesar de todo o desmonte, de toda a falta de verbas, têm décadas de experiência, credibilidade e excelência, e conseguiram resistir”.
Lula, porém, observou que não basta a ciência voltar. “Precisamos ser incansáveis para que ela siga sempre conosco. E para que ninguém – nem mesmo quem ainda têm a cabeça na idade das trevas – tente mais uma vez fazer o relógio da história andar para trás”, enfatizou. Ele também destacou a relevância do trabalho científico nas áreas da saúde, da agricultura, da energia e de outros setores fundamentais para o desenvolvimento do país.
“Foi por acreditar nesse caminho que, ainda em fevereiro, reajustamos as bolsas da Capes e do CNPq, que estavam congeladas desde 2013 e irão beneficiar 258 mil estudantes e pesquisadores da graduação. Por isso também, encaminhamos ao Congresso Nacional em março o Projeto de Lei que recompõe o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, o FNDCT. O projeto foi aprovado, e o fundo passou a contar com perto de R$ 10 bilhões de reais”, frisou o presidente.
Ele também lembrou do anúncio, feito pelo governo em abril, da imediata recomposição dos orçamentos das universidades e dos institutos federais, com o aporte de recursos de R$ 2,4 bilhões para o fortalecimento do ensino superior, profissional e tecnológico. “Para além destas e de outras ações, contudo, o que mais importa é que a ciência e a tecnologia voltaram, de fato, a fazer parte da espinha dorsal do Estado”.
Agradecimentos
Durante a solenidade, a médica sanitarista Adele Benzaken agradeceu a Lula pelo ato de desagravo. “Reencontro com o senhor, presidente, e com todas as utopias que, por vários anos, nos ensinou a sonhar e a realizá-las. Ao senhor, presidente, aos representantes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, à Academia Brasileira de Ciências, ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação e, principalmente, aos companheiros que, solidariamente, se recusaram a receber a medalha de Ordem do Mérito no governo passado, minha gratidão eterna, muito obrigado”, disse.
Retomada
Desativado nos últimos cinco anos, o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) foi reinstalado por Lula durante a solenidade no Palácio do Planalto. Órgão de assessoramento do presidente da República, o colegiado é o principal fórum de debate com a comunidade científica, a sociedade e o setor produtivo sobre a Política Nacional de Ciência e Tecnologia. A última reunião ocorreu em 1º de agosto de 2018. Ainda durante o evento, Lula assinou decreto de convocação da 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, prevista para junho de 2024.
A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, comemorou a reinstalação do CCT. “Estamos reunidos para marcar, aqui, a reinstalação do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, o que se reveste de muito simbolismos, porque, afinal, são cinco anos sem esse conselho funcionar. É, nada mais, nada menos, o principal fórum de debates com a comunidade científica, a sociedade e o setor produtivo”, pontuou a ministra.
Luciana também afirmou que o governo, ao condecorar os cientistas, “faz jus à verdade e homenageia todas as pessoas que ofereceram relevantes contribuições à ciência sem distinção ideológica, sem vetos”. “É um ato de desagravo à ciência e de reparação histórica aos cientistas, professores e professoras, médicos, pesquisadores e pesquisadoras, brasileiros e brasileiras que foram injustamente perseguidos e ameaçados por um governo anticiência e antivida”, enfatizou a ministra.
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Sérgio Rezende, secretário-geral da V Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação e ex-ministro de Ciência e Tecnologia, disse que “para mim é uma grande satisfação estar em um evento como este, em que a ciência voltou, que marca uma nova página da história do Brasil”. Ele lamentou “os desastres dos últimos anos, em que chegamos a ficar desanimados”, mas disse que, “ felizmente, as coisas mudaram, nós estamos aqui agora, muitas ações já foram tomadas este ano, como o aumento das bolsas de estudo e a recuperação do FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico]”.
O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro lembrou que a entidade é a maior sociedade científica da América Latina, tendo completado 75 anos em 8 de julho. Segundo ele, em razão de uma lei de 2001, nessa data passou a ser comemorado o Dia Nacional da Ciência.
“Tenho a honra e a alegria de saudar este Brasil resgatado das trevas e que ressurgiu graças à ação decidida de muitos brasileiros, entre os quais a comunidade científica e acadêmica, que se incluiu desde o primeiro momento. A luta foi árdua, mas ela está trazendo frutos. Um deles é a restauração, aqui, agora, do Conselho Nacional de CIência e Tecnologia, que foi largado às traças pelo governo negacionista”, disse.
Da Redação