Desde o dia 9 e até 14 de agosto acontece em Brasília a 1ª Marcha das Mulheres Indígenas, que tem como tema: “Território: nosso corpo, nosso espírito”. A Marcha é uma conquista de muitas mulheres, pertencentes a diversos povos que lutam diariamente a fim de dar visibilidade e voz para as suas causas próprias. A Marcha é fruto de uma extensa luta por reconhecimento e espaço dentro dos movimentos indígenas e também perante a sociedade brasileira. Telma Taurepang, atual coordenadora da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB) – vem de um povo de mulheres de luta e foi a primeira coordenadora mulher no Conselho Indígena de Roraima.
Telma conta que essa luta vem de longe. “No ATL (Acampamento Terra Livre) de 2016, aconteceu a primeira plenária de mulheres indígenas. Aquele momento foi um marco histórico para nós mulheres. Esse reconhecimento da luta das mulheres, do nosso protagonismo dentro da Mobilização Nacional Indígena, dentro do país. Em 2017, surge a segunda plenária, em que foi homenageada nossa liderança Rosane Kaingang. Na sequência, em 2018, ocorreram três plenárias das mulheres indígenas. Então, isso impulsionou o coletivo, a voz das mulheres indígenas para que realmente acontecesse a 1ª Marcha das Mulheres Indígenas. Mas antes disso, lá em 2014, em Campo Grande, surgiu a discussão para que houvesse essa marcha. Esse grupo deu referência à voz das mulheres indígenas em um projeto dentro da ONU. Começaram lá as discussões e o planejamento para essa marcha que vai acontecer. Então essa é uma luta muito grande, em um contexto que vem há muito tempo sendo de muita resistência e que muitas das vezes nos deixam um pouco de lado, quando temos algumas organizações que não reconhecem ou que não nos veem dessa forma positiva dentro do próprio movimento indígena. ”
Diversidade de povos
Esse momento representa de uma só vez um passo a mais na luta de suas ancestrais e um desafio de articulação e união para potencializar as demandas e temas levantados por essas mulheres. As pautas estão em construção e terão na Marcha a oportunidade de serem discutidas. Como há uma diversidade de povos, há uma diversidade de pautas e uma das tarefas é encontrar a intersecção entre os pontos que mais dialoguem entre as mulheres, como aponta Braulina Baniwa, mestranda em Antropologia Social pela Universidade Brasília. “As pautas são complexas, não existe uma pauta que representa e que dialoga com os desejos de todas, por isso a ideia do Fórum, são mais de 300 povos diferentes. Então, a ideia é chegar próximo de algo que contemple a todas”.
Apesar disso, desde outros momentos como Acampamentos Terra Livre, as mulheres indígenas acompanham e sabem quais questões são inerentes a todos os povos.
A questão do território vai muito além do que as nações não indígenas entendem. Não à toa, o tema da marcha passa por ele e entende a terra como extensão dos corpos e pessoas indígenas, estabelecendo uma relação de cuidado mútuo, de subsistência. A educação escolar diferenciada é outro ponto, pois é uma conquista dos movimentos indígenas e assegura que os conhecimentos ancestrais não sejam ignorados no espaço escolar, que as especificidades de cada contexto étnico se apropriem das ferramentas educacionais e promova uma educação que respeite a diferença e ajude no diálogo e luta dos povos originários do Brasil.
Saúde indígena
A saúde indígena é também uma fonte de atenção prioritária entre as mulheres. O atendimento de saúde público qualificado e específico para as etnias é necessário e também a atenção para problemáticas atuais como a alimentação. Taurepang pontua: “Uma das coisas que nos deixam mais preocupadas é a saúde da mulher. A mulher, como os povos indígenas diminuíram a sua idade, devido à entrada de laticínios dentro das comunidades indígenas, o conservante dentro da comunidade indígena. E aí eu digo isso porque tenho um pai de 86 anos que parece ter 50. Mas hoje a gente tem uma população que começou a decair conforme os gêneros alimentícios que começaram a entrar dentro da comunidade. Então, essa questão da saúde da mulher é muito visível na questão do próprio câncer que surge nas aldeias, né? Tanto da mama como o câncer de útero. Então a gente precisa na realidade melhorar nossa saúde, mas como iremos melhorar nossa saúde se começa a entrar produtos industrializados? ”
Há outros pontos como os altos índices de suicídio, a questão da violência contra as mulheres e a intervenção muitas vezes atropelada do Estado brasileiro nesses casos, além da questão das mulheres indígenas em contextos urbanos, que fazem parte de 38% do contingente indígena brasileiro, como chama a atenção Avelin Buniacá Kambiwá, do Comitê Mineiro de apoio às causas indígenas.
E são elas, as mulheres, que dão a última palavra: “O foco, objetivo da marcha é dar visibilidade as ações das mulheres indígenas do Brasil, discutindo questões inerentes as suas realidades, reconhecendo esse protagonismo. E que a gente possa também dar as novas lideranças, a capacidade, a defesa e a garantia dos seus direitos humanos. A nossa resistência ela sobrevive porque estamos vivas, nós somos a resistência”, conclui Telma.
Por Cimi