Anunciado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro como ministro do Meio Ambiente, o advogado Ricardo Salles tentou vender 34 áreas florestais e estações experimentais de produção de madeira vinculadas ao Instituto Florestal em 2017, quando era secretário estadual de Meio Ambiente na gestão de Geraldo Alckmin (PSDB).
Por meio da Resolução 06/2017 da Secretaria, publicada em 17/01/2017 no Diário Oficial, ele constituiu comitê de avaliação para o chamamento público “visando à prospecção de interessados em concessão de uso ou aquisição de áreas”.
Na lista dessas áreas, 12 florestas estaduais, entre elas a de Cajuru, com 1.909 hectares, 18 estações experimentais, como a de Itapetininga, com 6.706 hectares, além de dois hortos florestais e dois viveiros.
Porém, não há em SP legislação que autorize o governo a vender essas áreas, mas apenas alienar temporariamente. Tanto é que, dias depois, a Secretaria Estadual do Meio (SMA) divulgou esclarecimentos a respeito.
“O setor privado vai primeiro informar em que condições e se tem interesse em novas áreas. Elas vão ser objeto de uma nova lei. Mas não vamos fazer toda a mobilização no legislativo e criar uma lei liberando áreas para as quais não houver interesse. Vamos ver quais atraem interessados e então propor a lei”, destacou Ricardo Salles no comunicado.
Em março, o Ministério Público de São Paulo abriu inquérito para apurar improbidade administrativa no chamamento. Entre as irregularidades apontadas, o edital descumpria princípios, como a impessoalidade. Na ocasião, o promotor Ivan Carneiro Castanheiro, do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente de Piracicaba, um dos autores da representação, explicou que houve “dirigismo” no processo.
“Quando se pergunta ao eventual interessado qual área quer explorar, quanto quer pagar, em quais condições, sob o argumento de conceder ou vender só aquelas áreas para as quais haja um interessado. Acaba sendo um dirigismo da licitação porque viola o princípio da impessoalidade”, afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo.
Chamou atenção dos promotores, entre outras coisas, o sigilo que marcava o andamento do processo. A advogada da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC), Helena Goldman, denunciou ter sido expulsa de uma reunião entre representantes da SMA e empresários para discutir as concessões.
Processo suspenso
No final de abril, a Justiça paulista suspendeu o processo de venda das áreas florestais e experimentais. A juíza da 5ª vara da Fazenda Pública, Simone Viegas de Moraes Leme, argumentou que a legislação federal que protege unidades de conservação determina que a desafetação ou redução dos limites de área protegida depende de lei estadual.
E que a Lei 16.260/2016 autoriza apenas a concessão de exploração de áreas.
Salles, que já vinha sendo investigado pelo Ministério Público estadual em inquéritos civis de improbidade administrativa desde o começo de 2017, tornando-se réu em uma ação civil pública na qual é acusado de alterar o zoneamento da proposta de plano de manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê para beneficiar empresários.
No começo de agosto, o MP paulista abriu novo inquérito envolvendo o secretário por intermediar uma proposta de negociação do imóvel da sede do Instituto Geológico, em São Paulo, apesar de a transação ser desaconselhada por assessoria do governo.
Desgastado, foi exonerado no final de agosto pelo governador tucano Geraldo Alckmin, de quem havia sido secretário particular.
Em audiência pública em setembro do ano passado, na Assembleia Legislativa de São Paulo, o então secretário Maurício Brusadin, sucessor de Salles, afirmou que, naquele momento, o projeto de venda das florestas não contava com apoio do governador Geraldo Alckmin.
Ricardo Salles concorreu a uma vaga na Câmara pelo partido Novo. Mesmo não obtendo os votos suficientes, ficou como suplente. Sua campanha foi marcada por ataques e promessas de criminalização dos movimentos sociais.
A gestão de Salles ficou marcada como a de pior desempenho nos últimos 30 anos, segundo servidores dos institutos de pesquisa vinculados à pasta, como o Botânico, Florestal e Geológico. Em nota, a APqC, que reúne os pesquisadores, durante o período em que permaneceu à frente da Secretaria, Salles cometeu uma série de equívocos administrativos, além de acumular ações e denúncias de improbidade.
Para o vice-presidente da entidade, Joaquim Adelino, a nomeação de Ricardo Salles para o Ministério do Meio Ambiente seria “catastrófica” e colocaria em risco as políticas ambientais no Brasil. “Trata-se de alguém incapaz de entender a importância da ciência para o desenvolvimento nacional e que já provou ter ligações com representantes de setores que não têm qualquer compromisso com a educação ambiental, a bioecologia e a conservação da natureza”, disse.