Dois milhões de crianças e adolescentes de 11 a 19 anos que ainda não haviam terminado a educação básica deixaram a escola no Brasil desde a pandemia, em 2020. Os números foram levantados pelo instituto Ipec para o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que nesta quinta-feira (15) lançou a campanha #VotePelaEducação, para alertar os candidatos nestas eleições sobre a grande crise do ensino brasileiro.
Realizada em agosto deste ano com meninos e meninas de todas as regiões do País, a pesquisa revela que as famílias mais pobres também são as mais atingidas pela evasão escolar. Se a média global de estudantes fora da escola é de 11%, nas classes D e E, ela chega a 17%. Quatro vezes mais que o índice de evasão nas classes A e B (4%).
A desigualdade social transparece ainda na principal causa da evasão. Entre quem não frequenta a escola, metade (48%) afirma que deixou de estudar “porque tinha de trabalhar fora”. Mais 30% dizem que saíram “por não conseguir acompanhar explicações ou atividades”. Em seguida, 29% alegam que desistiram porque “a escola não tinha retomado atividades presenciais” e 28%, porque “tinham que cuidar de familiares”.
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A evasão também assombra os estudantes que permanecem na escola. A pesquisa do Ipec revela que, nos últimos três meses, 21% dos estudantes de 11 a 19 anos de escolas públicas pensaram em desistir da escola. Entre os principais motivos está o fato de não conseguirem acompanhar as explicações ou atividades passadas pelos professores. O item foi citado por 50% dos que pensaram em desistir.
“O País está diante de uma crise urgente na Educação. Há cerca de 2 milhões de meninas e meninos fora da escola, somente na faixa etária de 11 a 19 anos. Se incluirmos as crianças de 4 a 10 anos, o número certamente é ainda maior. E a eles se somam outros milhões que estão na escola sem aprender, em risco de evadir”, alerta Mônica Dias Pinto, chefe de Educação do Unicef no Brasil.
Para ela, “é urgente investir na inclusão escolar e na recuperação da aprendizagem”, pois a maioria dos alunos assume estar feliz por ter voltado às aulas presenciais. Conforme a pesquisa, entre quem está frequentando a escola pública, 84% dizem estar interessados nos estudos, 71% se sentem animados e 70% estão otimistas com o futuro.
Ao comparar a escola de hoje com a de antes da pandemia, a maioria diz que os cuidados de higiene aumentaram (66%) nas escolas. O nível de exigência dos professores aumentou (56%), assim como o quanto os alunos aprendem nas aulas (55%) e até mesmo a frequência escolar (52%).
“Os dados mostram a importância da escola pública na vida de meninas e meninos em todo o Brasil”, aponta Mônica. “Os estudantes confiam na escola como espaço de aprendizagem e de interação com seus pares. Eles valorizam o esforço dos educadores e estão dispostos a retomar seu direito de aprender.”
Os estudantes revelaram que no país ainda há escolas fechadas, apenas oferecendo aulas remotas. Enquanto 92% dos estudantes de escolas públicas dizem que sua escola só tem aulas presenciais, 5% que afirmam ter aulas mistas, e 3% têm só aulas remotas.
“Não se pode mais aceitar que escolas continuem fechadas no Brasil em meados de 2022. É urgente tomar as medidas necessárias para que cada criança, cada adolescente possa estar presencialmente na escola, sem exceção”, finalizou a dirigente do Unicef.
Lula aposta em pacto nacional para retomada do Plano Nacional de Educação
Instituído pela Lei nº 13.005/2014, o Plano Nacional de Educação (PNE), que determina diretrizes, metas e estratégias para a política educacional até 2024, foi abandonado após o golpe contra Dilma Rousseff. E sua implementação foi travada pelo desgoverno Bolsonaro, que fez o orçamento para a Educação regredir ao patamar de 20 anos atrás.
A crítica foi feita pelo mestre em Educação Carlos Abicalil, em entrevista ao Jornal PT Brasil nesta sexta-feira (16). O também coordenador do Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas de Educação da Fundação Perseu Abramo afirmou que, caso Luiz Inácio Lula da Silva vença estas eleições, as diretrizes do PNE serão retomadas a partir de um grande pacto nacional do governo federal com estados e municípios.
“O primeiro grande compromisso do presidente Lula, como ele já afirmou inclusive em debates públicos, é uma pactuação efetiva de compromisso comum entre o governo federal e governadores e prefeitos”, disse Abicalil. “No caso da Educação Básica, é essencial esse compromisso, pois prefeitos e governadores operam a rede de escolas públicas mais importantes do país, onde estão mais de 70% dos estudantes da Educação Básica, e, efetivamente, uma boa parcela também dos estudantes do ensino superior.”
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Essa pactuação, explica o mestre em Educação, diz respeito sobretudo a um diagnóstico preciso do que ocorre após o desmonte de estruturas nacionais de monitoramento do setor, como o Inep, o CNPQ e o Capes no caso do Ministério da Educação. As instituições são consideradas por ele ferramentas importantíssimas para o diagnóstico e para a proposição de resoluções dos grandes problemas que dão nó na educação brasileira. E sem perder de vista os impactos pós pandemia.
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“Nós voltamos, por exemplo, no ensino médio, a um espaço de desistência equivalente ao início deste século, portanto, um retrocesso de 20 anos. Isso está profundamente vinculado ao empobrecimento atual das famílias”, analisa Abicalil. Por isso, será preciso atualizar as informações, reestruturar os organismos nacionais de coordenação e retomar os níveis de investimento em Educação.
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“A meta de investimento do PNE era de 10% do produto interno bruto (PIB) em 2020. Chegamos em quase 6% em 2016, quando houve o golpe, e agora estamos voltando ao patamar de 4,5%”, enumera o pesquisador. “Essa reversão é fundamental, e deve ser comandado e ordenado pelo Governo Federal, mas em associação ao esforço de estados e municípios.”
Abicalil: “Limites fiscais da EC 95 devem ser varridos”
O segundo grande passo, diz Abicalil, “é varrer os limites fiscais derivados da Emenda Constitucional (EC) 95, do teto de gastos, que estão impedindo a retomada dos investimentos, e recuperar o esforço perdido”.
A terceira das grandes iniciativas, aponta ele, também tem a ver com o Plano Nacional de Educação: “É a retomada do processo democrático para planejar o que virá a partir de 2023 e 2024”, recuperando a tradição petista de governos democráticos e populares, que vem desde as primeiras prefeituras comandadas pelo partido, nos anos 1990.
A ideia é constituir um fórum nacional de educação inspirado no Fórum Nacional Popular, instituído em 2018 pela organização da Conferência Nacional Popular da Educação (Conape). A referência nessa retomada do diálogo com a sociedade civil será a Carta de Natal, aprovada em julho passado por mais de 40 organizações nacionais do campo da Educação na capital potiguar, durante a Etapa Nacional da Conape 2022.
“A quarta iniciativa é um diagnóstico claro da Rede Federal de Educação”, prossegue Abicalil. “Ele tem a ver com a continuidade do processo de expansão das universidades e dos institutos federais, a garantia da conclusão das obras deliberadamente interditadas pelos cortes orçamentários a partir de 2016 e, efetivamente, reorganizar essa oferta de educação pública voltada ao projeto de desenvolvimento do país”.
O dirigente da Fundação Perseu Abramo afirma que a regulamentação do Sistema Nacional de Educação está pendente desde 2014, via uma lei complementar que inclusive está disposta no plenário da Câmara dos Deputados em regime de urgência. Nesse caso, será preciso tratar do controle da oferta privada de ensino.
“Aí nós temos, no caso do ensino superior, a gravidade da fortíssima expansão sem controle e sem avaliação das matrículas no ensino à distância (EAD)”, aponta Abicalil. “E ineditamente, tragicamente, uma redução dramática das matrículas nas instituições públicas de ensino superior justamente agora, quando elas jogam papel fundamental para a retomada de um processo de desenvolvimento e reconstrução que recoloca o Brasil na magnitude de sexta potência econômica que já tivemos no passado.”
Dessa forma, diz Abicalil, será possível retomar o entendimento que orientou os Governos Lula e Dilma, de que a Educação não é um gasto, mas “um direito expandido no investimento estratégico, tanto para a promoção da cidadania quanto para resolução de problemas de desenvolvimento econômico e social”.
“Um dos desafios fundamentais para a superação da crise na Educação é exatamente a vinculação de processos educativos, desde a creche até o ensino superior e a pós-graduação, com um programa de desenvolvimento nacional que seja includente, que seja de desenvolvimento econômico em todas as regiões, de superação da desigualdade, de vínculo territorial, de oportunidade para a juventude e alavancador de oportunidades para o futuro”, concluiu o mestre em Educação.
Da Redação, com informações do Unicef