O Brasil está se fechando para o mundo. A sentença é do advogado e cientista político Jorge Rubem Folena de Oliveira, em entrevista para a Rádio Brasil Atual, sobre a saída do país do Pacto Global para a Migração da ONU. O governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro (PSL) está articulando a ruptura que praticamente isola o Brasil, incluindo-o em um grupo reduzido de países atualmente com governos ultraconservadores, como Hungria, Polônia e, sobretudo, Estados Unidos.
A decisão foi alvo de críticas de setores diversos, como o ex-chanceler do governo Temer, Aloysio Nunes (PSDB), e o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT). O tucano alertou para a “necessidade de respostas de âmbito global” para os problemas relacionados às migrações. Já o petista, que disputou o segundo turno do pleito presidencial contra Bolsonaro, destacou a decisão como um ato de submissão do governo aos Estados Unidos. “Macaquear os Estados Unidos virou política de Estado”, disse.
“Retirar o Brasil do pacto de migração terá pouco efeito ‘prático’ interno, a não ser fomentar a xenofobia”, continuou Haddad. De fato, o pacto – que foi construído por consenso de 152 países signatários e tem validade por dois anos – não tem status de tratado internacional, ou seja, seu descumprimento não implica em punições ou sanções, assim como sua adoção não cria direitos. A carta serve mais como um tratado ético com objetivos conjuntos para garantir o respeito aos direitos humanos dos migrantes, bem como aproveitar o potencial dessas pessoas para o desenvolvimento conjunto das nações.
Para Folena, o novo governo apenas segue sua linha de desrespeito e ataques contra a pluralidade. “Bolsonaro é um repetidor das ideias de Donald Trump (presidente dos Estados Unidos). Atacar imigrantes faz parte do dia a dia, da vida política deles. Agora, (o presidente) rompe com um trabalho feito pelo Brasil durante muitas décadas em relação à migração. O Brasil sempre recebeu bem as pessoas, é um país de imigrantes”.
Na última semana, até mesmo o Papa Francisco defendeu o pacto entre nações para a imigração. “As recentes emergências mostraram que é necessário haver uma resposta comum, coordenada por todos os países, sem prevenções e respeitando todas as instâncias legítimas, tanto dos Estados como dos migrantes e refugiados”, disse.
Francisco teme uma onda de xenofobia, e analisou o atual momento geopolítico do mundo como de “entre guerras”. “As tendências populistas e nacionalistas prevaleceram sobre a ação da sociedade de nações. O reaparecimento desses impulsos hoje está progressivamente enfraquecendo o sistema multilateral, Isso é fruto de uma falta geral de confiança, uma crise de credibilidade da política internacional e da crescente marginalização dos mais vulneráveis”, completou.
Para Folena, o ministro das Relações Exteriores de Bolsonaro, Ernesto Araújo, que articula a saída do Brasil do pacto, trabalha na contramão da dignidade e da cooperação entre as nações. “Esse ministro tem se apresentado de uma forma muito primária. Não tem uma visão universal para ocupar um cargo de tamanha envergadura. Ele teria que se colocar de forma mais adequada no cenário internacional. Não tem visão global e fecha o Brasil para o mundo.”
“Faz parte desse grupo que chegou ao poder, um grupo que pensa pequeno”, completa. O analista diz que Bolsonaro alegar “defesa da soberania” é paradoxal. “Esse é um fascismo caboclo, interessante mesmo. Ao mesmo tempo em que falam em nacionalismo em matéria de costumes, por outro lado abrem as portas do país para o capital especulativo internacional tomar conta. Enfraquecem o Estado nacional. Eles têm uma visão nacionalista que não defende o Brasil. Não defende o patrimônio, a cultura. Eles estão permitindo que interesses estrangeiros acabem com o país”, finaliza.