Preso, torturado e exilado pela Ditadura Militar, Manoel da Conceição é um símbolo de resistência para o Partido dos Trabalhadores. Ainda criança, resistiu junto com sua família aos desmandos dos latifundiários e se apaixonou pelo trabalho na roça. Depois, foi resistência em defesa dos direitos para trabalhadores do campo, enfrentou coronéis e criou um sindicato que chegou a ter mais de 100 mil membros. Resistiu também ao regime militar, período em que foi preso e torturado diversas vezes até ser forçado a deixar o país.
Vítima da desigualdade, da injustiça histórica contra quem lida com a terra e de um regime sanguinário, Mané, como é conhecido, nunca abaixou a cabeça ou desistiu da luta pela democracia, pela justiça e pela igualdade. Por isso, está sendo reconhecido pelo Governo do Maranhão. Neste sábado (30), vai participar da solenidade de assinatura do projeto de lei estadual que concede pensão especial a Manoel, oferecida pelo governador Flávio Dino (PCB).
Para a companheira de Manoel, Maria Denise Leal, o ato é um reparação do estado pela violência praticada contra seu marido no período ditatorial. “É uma homenagem que tá circunscrita ao Golpe Militar de 64. Em vez de comemorar a ditadura, a gente faz o contrário, o governador vai fazer um ato democrático.
Ela, que é casada com Manoel há 44 anos, conta que o conheceu numa das vezes em que foi preso. O ano era 1974: “Eu não estava presa também mas prestava serviço na penitenciária e conheci ele lá”. Desde então, é companheira de vida e de luta, estando ao lado de Mané nos muitos momentos em que foi preciso resistir e ter força para seguir em frente.
“Foi uma vida inteira de dedicação aos direitos dos trabalhadores do campo, pela terra, pela produção, pelo preço justo para os seus produtos, pela terra. Nós quem trouxemos o Movimento Sem Terra para a região”, relembra Maria Denise que hoje atua como assistente social e advogada.
Sobre Jair Bolsonaro (PSL) e sua determinação para que as Forças Armadas comemorassem o Golpe Militar de 1974, dona Maria Denise afirma que não consegue descrever o que sente, “não tem classificação”. E continua: “o que ele quer fazer é acabar com os direitos do povo brasileiro”.
Da infância pobre no campo ao exílio
A vida de Mané nunca foi fácil. Nascido no município de Pirapemas, no interior do Maranhão em 1935 cresceu no campo junto com a sua família sob os desmandos de latifundiários. Na década de 50, foram expulsos das terras que cultivavam por um grande fazendeiro e, de expulsão em expulsão, chegaram ao Vale do Pindaré-Mirim, onde começou sua trajetória de lutas pelos direitos dos trabalhadores rurais.
Organizou um sindicato para os trabalhadores do campo em Pindaré Mirim, município no interior do Maranhão, que chegou a reunir 100 mil pessoas. Também lutou para que seus companheiros fossem alfabetizados e contribuiu para estabelecer o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra no município do interior do Maranhão.
Por tudo isso, tornou-se uma importante liderança na região e símbolo na luta pelos direitos do trabalhador rural e da reforma agrária. Enquanto lutava por um mundo mais justo, viu o Golpe de 1964 culminar em um regime ditatorial cruel que o perseguiu por anos. Mané foi preso e torturado diversas vezes até ser obrigado a deixar o país em março de 1976.
Em uma das violências atrozes que sofreu na Ditadura teve a perna amputada. Enquanto presidente do sindicato dos trabalhadores rurais de Pindaré Mirim chamou um médico da capital São Luís para atender moradores da região. Enquanto as famílias eram atendidas, o prefeito do município avisou que faria uma visita. “Nós aguardamos, de bom coração. E aí chegou foi a polícia – e, de novo, meteram bala”, como relatou em entrevista a revista Teoria e Debate, da Fundação Perseu Abramo.
Tentando intervir e proteger os homens e mulheres do campo que estavam presentes no atentado, saiu baleado e foi preso sem qualquer assistência médica. “Desta vez não morreu ninguém, só saíram feridos e eu com essa perna baleada. O pé esbagaçou todinho. Fui preso, passei oito dias na cadeia em Pindaré-Mirim, mas não deram nenhum tratamento e a perna gangrenou. Quando cheguei em São Luís, tiveram de amputar. Até hoje ando de perna mecânica”, contou à revista.
Mesmo assim, continuou resistindo. E a perseguição foi implacável. Foi preso e torturado muitas outras vezes. Mané relatou um a tortura que sofreu em das vezes que foi preso e lembrou que, nesse dia, acordou no hospital. “Depois do
tratamento, voltei novamente para a tortura. Em quatro meses fui seis vezes ao hospital levado como morto”, contou.
Quando foi exilado em 1976 na Suíça continuou aglutinando trabalhadores e discutindo a ideia de um mundo mais igualitário e denunciando a crueldade do regime ditatorial brasileiro. Assim que pode voltar para o Brasil, em 1979, voltou para os movimentos sociais. Participou da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores.
Aos 84 anos de idade, Mané apresenta alguns lapsos de memória, mas não esquece da luta que pautou sua vida. Nesta sexta-feira (29) esteve na sede do PT no Maranhão, onde também foi homenageado, e bradou “Lula livre!”
Por Jéssica Petrovna da Agência PT de Notícias