Neste domingo (22), o boa noite direcionado a Lula foi diferente. Ao invés do já tradicional ato inter-religioso, foi realizada uma mística em homenagem aos 100 anos de Nelson Mandela e aos 107 dias da Vigília Lula Livre e da prisão política do ex-presidente.
No chão, os dizeres “Vigília Lula Livre é quilombo” foram escritos com sal e depois inflamados com álcool, simbolizando a resistência dos dois líderes. Manifestantes de movimentos populares ditavam palavras como “liberdade”, “justiça” e “força” em formato de jogral, para que Lula pudesse ouvi-las.
Mandela
Nelson Mandela, símbolo mundial da luta antirracista e por liberdade para seu povo, foi o primeiro presidente negro da África do Sul, depois de ter sido condenado à prisão perpétua e permanecido recluso por 27 anos, em decorrência da acusação de traição ao regime segregacionista do Apartheid, vigente no país por 46 anos.
O regime, instaurado em 1948, era baseado no conceito de que, caso houvesse integração racial, haveria perdas de personalidade para todas as etnias. As leis eram racistas e proibiam, por exemplo, a relação sexual e casamento entre pessoas de grupos étnicos distintos. A Lei de Terra Nativas garantia que 92,5% das terras fossem destinadas à população branca, que compunha dois quintos do povo sul-africano. Aos negros, que compunham dois terços do contingente populacional, a lei destinava o acesso a 7,5% do território.
Em 1950, foi sancionada a Lei de Supressão ao Comunismo, que colocou diversas organizações de combate e oposição ao Apartheid na clandestinidade. Dentre elas, o Congresso Nacional Africano (CNA), da qual Mandela fazia parte.
Florestan Fernandes
Para Ana Carolina Dartora, professora e pesquisadora na área da educação, O Brasil se descobriu um país racista graças à África do Sul. “Sempre houve o mito da democracia racial e a ONU delegou a Florestan Fernandes que fizesse um estudo sociológico que demonstrasse que era possível que relações pacíficas inter-raciais fossem possíveis, pensando em demonstra-las à África do Sul, que na época vivia sob o regime do Apartheid”, explica.
O Sociólogo, na década de 1950, descobriu durante seus estudos encomendados pela UNESCO, que as relações sociais no Brasil se compunham, na verdade, em questões de raça e classe. “Isso ajudou a tirar o véu de paz racial que envolvia o Brasil”, completa.
Segundo Ana Carolina, a primeira mudança real de postura quanto a esta realidade foi mantida pelos governos de Lula e Dilma, que sancionaram uma série de leis que promoviam o acesso da população negra e pobre a bens de consumo e à educação superior. “Com cotas nas universidades, estima-se que a diferença de igualdade entre negros e brancos seja de 20 anos. Sem cotas, esse número era 100 anos”, pontua a professora. Ela afirma ainda que esse é um dos maiores legados dos governos do PT à população negra, juntamente com a sensação de pertencimento da qual a população negra desfruta hoje no Brasil, a partir de leis que incluem a África no currículo escolar obrigatoriamente.
Foi também durante esse período que o Brasil estabeleceu relações econômicas e diplomáticas com o país natal de Mandela, com a criação do BRICS, bloco de comércio entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Ações como estas destacaram o Brasil internacionalmente, aumentando sua referência externa e soberania nacional interna, numa postura descrita pelo próprio Lula como “ativa e altiva”.
Nelson Mandela, após assumir a presidência de seu país, também se preocupou com ações afirmativas e se usou de muitos símbolos para a reconciliação nacional, como o rugby, esporte que é paixão nacional na África do Sul e que passou a ter uma seleção mais igualitária, como descrito no filme “Invictus”.
Com isso, a nação sul-africana, que já acumulava sanções econômicas de muitos países por conta do seu regime racista, recuperou sua imagem internacional depois que elegeu Mandela democraticamente. Em suas palavras: “Parece impossível, até estar feito”.
Por Brasil de Fato