Instalada no mês de outubro, a Subcomissão Temporária Grande Impulso para a Sustentabilidade já está trabalhando e tem agenda cheia para os 90 dias previstos para seu funcionamento.
Na próxima terça-feira (5), o colegiado abre um ciclo de seminários que pretendem ampliar a conscientização sobre o papel do tripé formado pela sustentabilidade social, ambiental e econômica em um projeto contemporâneo de desenvolvimento. Com representantes da ONU, OCDE e Cepal, o evento vai debater temas como O mundo no século XXI: a Agenda 2030 e os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, Reformas Estruturais para o Crescimento Verde e Sustentabilidade como Modelo de Negócios.
A subcomissão é presidida por seu idealizador, o senador Jaques Wagner (PT-BA), empenhado em afastar o preconceito que alguns segmentos ainda têm sobre o tema e contribuir para “mudar o enfoque do debate sobre a geração de emprego e desenvolvimento da economia”.
Governador da Bahia por dois mandatos (2007 a 2014), Wagner participou dos ministérios do presidente Lula (nas pastas do Trabalho e das Relações Institucionais) e da presidenta Dilma (Defesa e Casa Civil), além de ter integrado o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República.
É essa experiência que o senador traz para o trabalho na subcomissão, que funciona no âmbito da Comissão de Meio Ambiente CMA). “Nosso objetivo é formular políticas públicas e propor reformas estruturais e de desenvolvimento econômico e social que representem um novo arranjo verde para o desenvolvimento sustentável”, explica ele.
Nesta entrevista, Jaques Wagner também analisa os retrocessos na área ambiental desencadeados a partir do governo Bolsonaro, denunciando a “moleza” e o “desprezo” demonstrados em face ao derramamento de óleo nas praias do Nordeste. “É um desprezo criminoso, típico de um governo que não tem qualquer apreço pela questão da sustentabilidade”, resume o senador.
PT no Senado – Como vai trabalhar a Subcomissão Temporária Grande Impulso para a Sustentabilidade? A ideia é influenciar imediatamente o debate legislativo?
Jaques Wagner – A participação dos parlamentares, evidentemente, também é muito importante. Até porque as leis que saem aqui do Congresso podem ajudar ou prejudicar a questão da sustentabilidade.
Um exemplo é a discussão sobre a tributação verde, estímulos à preservação ambiental na atividade econômica, no âmbito do debate sobre a reforma tributária.
Mas o saldo concreto que a gente espera dos trabalhos da subcomissão e dos seminários que vamos realizar é abrir a cabeça das pessoas, pois a conscientização é fundamental.
PT no Senado – Depois de um período de avanços, voltou a ser urgente conscientizar a sociedade sobre o conceito de sustentabilidade?
O mundo está dando uma guinada. Seja por conta da mudança climática e do aquecimento global, mas hoje já se trabalha com o conceito de economia circular, uma economia que não deixa resíduo, onde o resíduo acaba sendo um novo vetor de desenvolvimento.
O conceito de big push para a sustentabilidade, como se chama no exterior – que no Brasil traduzimos como “grande salto” ou “grande impulso” — é uma mudança nas cabeças das pessoas.
Durante algum tempo, aqueles que preferiam combater a sustentabilidade ambiental e social sempre apresentavam esses dois conceitos como antagônicos ao processo de desenvolvimento.
Aqui no Brasil, vimos recentemente as queimadas na Amazônia e a destruição de rios e de reservas hídricas — nos acidentes de Mariana e Brumadinho — em função da construção de novos empreendimentos.
PT no Senado – A noção de que preservação ambiental e responsabilidade social não são antagônicos ao crescimento econômico já foi relativamente bem absorvida neste começo de Século 21. Mas o que o senhor propõe é ir além, tratar a sustentabilidade como um fator indissociável para o desenvolvimento.
A China, que hoje é um dos países que mais cresce no mundo, já abraçou fortemente a questão da sustentabilidade. Cidades chinesas como Shenzhen — que é uma cidade, mas tem 15 milhões de habitantes, a população do estado da Bahia — já tem todos os táxis, todos os ônibus, todo o transporte coletivo movido a eletricidade. Não tem mais qualquer emissão de carbono no transporte público. Eles chegaram a isso pela tecnologia.
O planeta não conviverá com a forma de desenvolvimento que degrada. Esse é um grito do mundo inteiro. A juventude tem uma pegada mais decidida frente ao tema, até porque ela está contemplando seu futuro no planeta. Talvez quem esteja na faixa etária dos 70 ou 80 anos não consiga vislumbrar a catástrofe. Mas os jovens estão vendo as fontes de água potável serem degradadas, as geleiras nos polos se degradando.
O big push ou o impulso de sustentabilidade é exatamente o despertar — na cabeça das pessoas, dos pequenos e médios empresários — para essa nova forma de encarar o processo de desenvolvimento.
PT no Senado – Nesta terça-feira (5), a subcomissão realiza o primeiro seminário de um ciclo de debates sobre o tema. Qual a sua expectativa?
Jaques Wagner – A ideia do seminário é despertar e amadurecer a consciência para a sustentabilidade econômica, ambiental e social e, a partir daí, buscar efeitos práticos.
Queremos contribuir para mudar o enfoque do debate sobre a geração de emprego e desenvolvimento da economia. Nosso esforço é para quebrar preconceitos que as pessoas ainda têm sobre o tema.
Serão apresentados exemplos práticos dessa concepção. Por exemplo, vamos trazer um palestrante do Uruguai, país que caminhou muito nesse sentido. Hoje, todos os países do mundo têm uma preocupação muito grande com a sustentabilidade.
A reflexão que será apresentada no seminário é um esforço coletivo da Comissão de Meio Ambiente do Senado, da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e de empresas que já abraçaram esse novo conceito — desse tripé que abarca a sustentabilidade ambiental, social e econômica. Teremos um ciclo de cinco seminários ou audiências públicas.
PT no Senado – Ainda que seja um tema já tratado amplamente no mundo, a busca da sustentabilidade não anda muito popular no atual governo…
Jaques Wagner – Infelizmente, o momento que a gente vive no Brasil é negacionista. O atual governo nega o aquecimento global. O presidente da República chega a dizer que “estimula queimadas” para “garantir o desenvolvimento”.
Mas o que queremos mostrar com o trabalho da Subcomissão Temporária Grande Impulso para a Sustentabilidade é um novo conceito, que foi muito trabalhado na Cepal, unidade da Organização das Nações Unidas (ONU) voltada para pensar o desenvolvimento dessas regiões.
Em um ano [de governo Bolsonaro] nós regredimos 10 anos. Basta ver a situação da Amazônia.
Não vou citar o caso do óleo nas praias do Nordeste, porque ainda não é possível apontar um culpado. Ainda não está claro se o dano ambiental é resultado de um acidente ou um crime ambiental.
Mas a lerdeza, a moleza do governo para reagir é grave. Completamos 60 dias do desastre e ainda não temos um diagnóstico preciso do que está ocorrendo. Eu acho isso incrível: com tanta tecnologia, com tanto radar, com tanto satélite, e a gente até agora não tem uma resposta.
PT no Senado – Mas essa inação do governo é só moleza ou seria a expressão do descaso com o Nordeste e com o meio ambiente?
Jaques Wagner – O problema começa no desprezo com a questão. Aliás, o desprezo é anterior ao acidente, ou crime ambiental — ainda não sabemos o que foi, exatamente. Esse governo está desmontando os órgãos de fiscalização ambiental. O objetivo era acabar com o Ministério do Meio Ambiente, transformando-o em um apêndice do Ministério da Agricultura.
Esse desprezo já é criminoso. Nem mesmo o acionamento do Plano Nacional de Contingência pôde ser feito, porque eles desmontaram todos os fóruns que havia nessa área.
Quando digo que não aponto o dedo para o governo no caso do óleo, quero dizer que não dá para dizer que houve ação direta no derramamento. Mas a responsabilidade de reagir ao acidente é do governo. E, neste aspecto, ele está se mostrando extremamente lento.
Mas você tem razão: tudo começou com o desprezo. As primeiras manchas de óleo, para o governo, não eram nada. Depois, quando a grita começou a ficar muito grande, quando as praias paradisíacas do Nordeste, nossa pesca artesanal e nossos manguezais começaram a ficar totalmente degradados, só aí eles começaram a reagir.
E mesmo com 40 dias do acidente, não vi ser montada uma sala de situação para acompanhar e reagir ao problema. Eu fui chefe da Casa Civil da presidenta Dilma Rousseff, estou falando a partir dessa experiência. Como é possível não haver uma sala de situação para garantir a transversalidade necessária entre os diversos órgãos e ministérios?
Então, é claro que esse é um governo que não tem qualquer apreço pela questão da sustentabilidade. Um governo que tem integrantes negacionistas, gente que acha que a terra é plana, que acha que aquecimento global é uma coisa endógena ao planeta — e até uma parte do problema pode ser endógena, mas é evidente que a presença humana na Terra, a emissão de carbono, a degradação de rios e florestas contribuem muito para eventuais efeitos próprios do planeta.
Seminário Grande Impulso para a Sustentabilidade no Brasil
Quando: Terça-feira (5/11), a partir de 8:30h
Onde: Auditório Petrônio Portella, Anexo II do Senado.
Clique para fazer sua inscrição
Palestrantes:
Niky Fabiancic, coordenador-residente da ONU no Brasil
Alicia Bárcena, secretária executiva da Cepal
Roberto Kreimerman, ex-ministro de Indústria, Energia e Mineração do Uruguai
Denise Hills, diretora global de Sustentabilidade da Natura
Solange Ribeiro, diretora presidente adjunta da Neoenergia
Luiz de Mello, diretor do Departamento Econômico da OCDE.
Por PT no Senado