Em novembro de 2021, após Jair Bolsonaro acabar de uma só vez com o Bolsa Família e o Auxílio Emergencial, cortando a ajuda de 29 milhões de famílias, a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome Tereza Campello denunciou o que chamou de “a maior exclusão social já realizada no Brasil”.
“São mais de 29 milhões de famílias completamente excluídas, sem que ninguém tivesse tentado saber se essas famílias continuam precisando. Como se a pandemia tivesse terminado, como se a economia estivesse bem e como se essas famílias tivessem voltado à sua vida normal”, alertou Tereza.
Quatro meses depois, pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre) mostra o que aconteceu com essas famílias: sem emprego e atordoadas com a inflação, elas se afundam em dívidas. Segundo sondagem especial realizada pelo instituto, divulgada na quarta-feira (16) pela Folha de S. Paulo, uma em cada três famílias brasileiras possui dívidas em atraso.
A inadimplência atinge especialmente os lares mais pobres, com renda até R$ 2.100. Chega a 58% nessa faixa, que é a que mais sofre com a inflação. E mesmo famílias com ganhos acima de R$ 9.600 têm dificuldade de pagar todas as dívidas. Nessas, o índice das que têm dívidas atrasadas chega a 10%. Já a taxa de atrasos com mais de 30 dias é de 21%, a maior já observada pelo Ibre, que faz o levantamento desde 2012.
Quando perguntada por que as famílias estão endividadas como nunca, a coordenadora das sondagens do consumidor do FGV-Ibre, Viviane Seda Bittencourt, praticamente confirma o alerta dado por Tereza Campello em novembro passado.
“A gente teve interrupção do Auxílio Emergencial, há dificuldade de voltar ao mercado de trabalho, e o setor de serviços não voltou a contratar como a gente esperava”, disse Viviane à Folha, acrescentando que o início do pagamento do Auxílio Brasil, o programa que substituiu o Bolsa Família, não foi suficiente, uma vez que “o número de beneficiários do Auxílio Emergencial era bem maior”.
Rodolpho Tobler, também do FGV-Ibre, acrescenta que o aumento dos preços é outro imenso problema. “A inflação está sendo a grande vilã. O crédito está caro, a inflação ainda está alta e o mercado de trabalho não reagiu suficientemente para compensar isso.”
Água, luz e telefone atrasados
Reportagem da BBC Brasil mostra que uma particularidade da inadimplência atual é o aumento das contas básicas como água, luz e telefone em atraso. Segundo dados da Serasa, as contas básicas já representavam 23,9% das dívidas em dezembro de 2021, comparado a 20,4% no mesmo mês de 2020.
Fernando Gambaro, coordenador da Serasa, disse à BBC que parte desse aumento se deve a alta de preços, particularmente da luz. No entanto, ressalta, esse tipo de inadimplência indica uma piora da situação da renda das famílias, já que em geral as pessoas priorizam as contas básicas em momentos de aperto. Um atraso nessas contas, portanto, revela uma situação de dificuldade financeira extrema.
Da Redação