Conta de luz abusiva pesa nas contas de 90% dos lares brasileiros

Sete em dez famílias estão “muito preocupadas” com possibilidade de racionamento ou de apagões e culpam desgoverno Bolsonaro pela situação, aponta pesquisa

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Crise fabricada enriquece empresas de energia

Em 2021, nove em dez famílias brasileiras sentiram o impacto, em graus variados, do aumento brutal das contas de energia elétrica. A mesma proporção se diz preocupada com a possibilidade de racionamento ou de apagões no futuro próximo. Sete em dez famílias dizem estar “muito preocupadas” com apagões, mesmo percentual dos que afirmam que houve descaso do desgoverno Bolsonaro na crise hídrica.

Os dados fazem parte de reportagem do jornal Valor Econômico sobre um estudo do Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria) para o Instituto Clima e Sociedade (ICS). Dos 2002 entrevistados nas cinco regiões em novembro, 40% reduziram ou cancelaram a compra de roupas, sapatos e eletrodomésticos para pagar a conta de luz.

Outros 22% foram ainda mais afetados, tendo que reduzir a compra de alimentos básicos para garantir a luz em casa, índice que chega a 28% entre os nordestinos. E 14% deixaram de pagar outras contas básicas, como as de água e gás encanado.

Também restou apelar a recursos como tomar banho mais rápido e desligar as lâmpadas (49%), deixar de usar ou reduzir o uso de eletrodomésticos (44%), substituir lâmpadas por outras mais econômicas (42%) e evitar o consumo nos horários de pico (23%).

Enquanto 42% dos entrevistados apontaram o custo da energia como maior impacto no bolso, 52% disseram que o que mais pesou no bolso foi o aumento do botijão de gás. O gasto com gás e luz, conclui o estudo, já compromete metade ou mais da renda de 46% das famílias, e 10% já estão com quase toda a renda familiar comprometida.

Mesmo assim, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, não se acanhou de dizer, em entrevista à Folha de São Paulo no domingo (2), que “a crise de energia nunca ocorreu”. Segundo ele, o que houve foi “a maior escassez hídrica que o país já passou”.

“Passamos por um período de escassez hídrica que resultou no aumento do custo da geração de energia e isso abala o orçamento de todos nós. As luzes de Natal e a retomada das empresas mostram simplesmente a volta da atividade econômica”, afirmou Albuquerque, emulando as narrativas ilusionistas do colega Paulo Guedes.

O ministro explicou que o desgoverno Bolsonaro preferiu evitar o racionamento acelerando o ritmo de leilões (de energia, capacidade e de linhas de transmissão). A medida levou ao acionamento do parque de usinas térmicas a mais de R$ 2 mil o MWh (megawatt-hora), encarecendo as contas de luz e causando efeitos como a queda de 0,11% do Produto Interno Bruto (PIB) de 2021 e de 0,19% no indicador de 2022, conforme estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

No mercado de trabalho, aponta o estudo, a inflação sobre a energia elétrica deve resultar em perda de 166 mil empregos em 2021 e de 290 mil em 2022. Resultado direto da má gestão do volume dos reservatórios das usinas hidrelétricas ao longo de quase três anos de desgoverno Bolsonaro, que culminou no acionamento das usinas termelétricas, fonte de energia mais cara do sistema. E o cidadão que pague a conta.

Custo da energia elétrica vai continuar subindo

O sistema de bandeira tarifária aplica uma cobrança adicional às contas de luz quando sobe o custo da produção da energia. Em junho de 2021, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) passou a praticar a bandeira vermelha patamar 2, que representava cobrança adicional de R$ 6,24 a cada 100 kWh (quilowatt-hora) consumidos.

Em julho, a tarifa vermelha patamar 2 foi reajustada em 52% e a cobrança subiu para R$ 9,49. Na segunda quinzena de setembro do ano passado, entrou em vigor a bandeira “escassez hídrica”, que passou a acrescentar R$ 14,20, ou 49,6% a mais, na conta de luz para cada 100 kWh consumidos, e deve vigorar até abril de 2022.

Segundo a coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a nova bandeira custa R$ 3,45 bilhões por mês a mais no bolso dos consumidores. Em abril do ano, ao fim dos oito meses de vigência da tarifa, a população terá desembolsado R$ 27,6 bilhões.

“Este gigantesco volume de recursos será destinado a cobrir as receitas econômicas das próprias empresas do setor elétrico e até subsidiar grandes consumidores de energia elétrica”, alertou a diretoria do MAB em nota oficial.

“O povo está sendo taxado nas contas de luz para que os donos da energia e as grandes indústrias possam seguir lucrando alto em plena crise elétrica, que se soma à crise na economia nacional”, concluiu o documento. Com os novos aumentos, afirmou a entidade, o Brasil assumiu o ranking de energia mais cara do planeta.

Gilberto Cervinski, da coordenação nacional do MAB, afirma que o caos no setor elétrico foi desencadeado quando o desgoverno Bolsonaro permitiu que as empresas do setor operassem as usinas ao ponto de esvaziar completamente os reservatórios. Essa “crise hídrica” criou o ambiente de falta de energia que justificou a explosão nas tarifas.

E mesmo com a profusão de chuvas que reabastecem os reservatórios das hidrelétricas, novos aumentos da conta de energia elétrica já estão contratados para este ano. “Nossas estimativas apontam para um cenário de impacto tarifário médio em 2022 da ordem de 21,04%, quando avaliado todo o universo de custos das distribuidoras e incluídos esses impactos das medidas para enfrentamento da crise hídrica”, escreveu Claudio Elias Carvalho, superintendente adjunto de gestão tarifária da Aneel, em ofício enviado à assessoria da diretoria do órgão regulador em 5 de novembro do ano passado.

Da Redação

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