Partido dos Trabalhadores

Com 400 mil mortos, ministro da Defesa diz que governo “não falhou”

Sem argumentos, em audiência na Câmara, general Braga Neto defendeu gestão de Pazuello, distorceu dados sobre a vacinação e calou sobre ameaças golpistas estimuladas por Bolsonaro

Sérgio Lima

General Braga Neto

Apesar das inúmeras evidências do negacionismo e da incompetência do governo Bolsonaro no combate à pandemia, que levaram o Brasil à segunda colocação mundial de mortes pela Covid-19 – com mais de 411 mil óbitos – o ministro de Defesa, general Braga Netto, disse nesta quarta-feira (5) que “o Brasil não falhou no combate à Covid”.

A afirmação ocorreu durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CREDEN) da Câmara dos Deputados, que recebeu o ministro da Defesa e os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, para explicarem as prioridades da Defesa para 2021.

Ao ser questionado por deputados da Oposição sobre a gestão do ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, Braga Netto defendeu o trabalho do militar, que inclusive já foi convocado a prestar depoimento na CPI da Pandemia no Senado. Previsto para acontecer nesta quarta (5), o depoimento de Pazuello foi adiado para o dia 19 de maio após o ex-ministro da Saúde alegar que teve contato com pessoas que testaram positivo para a Covid-19.

De acordo com Braga Netto, o governo fez o possível no combate à pandemia e as vacinas não foram compradas antes porque não existia essa possibilidade. A declaração do ministro da Defesa já foi desmentida pela fabricante de vacina Pfizer, que declarou à imprensa brasileira que tentou vender, em agosto do ano passado, 70 milhões de doses do imunizante para o Brasil. As doses seriam entregues a partir de dezembro de 2020.

Porém, a oferta foi recusada pelo governo brasileiro com a justificativa de que a fabricante estaria exigindo cláusulas abusivas. No entanto, as exigências da Pfizer eram as mesmas acordadas com todos os países que compram a vacina. O Instituto Butantã também tentou vender 60 milhões de doses ao governo Bolsonaro, ainda em 2020, e na época a oferta também foi recusada.

Distorção sobre a vacinação no Brasil

O ministro da Defesa também distorceu dados para tentar melhorar a situação do governo Bolsonaro em relação a vacinação. Ele citou, por exemplo, que o Brasil é o 5º país do mundo em número de doses aplicadas. O deputado Henrique Fontana (PT-RS), no entanto, lembrou Braga Netto que ele “esqueceu” de dizer que proporcionalmente o Brasil está muito mal no ranking de vacinas por habitante, que coloca o Brasil apenas na 56ª posição mundial.

“Por favor, ministro Braga Netto, corrija essa informação de que o País está bem porque ocupa a 5ª posição em vacinação total no mundo. Todos aqueles que analisam tecnicamente o assunto levam em conta a vacinação em relação ao número de habitantes, em busca de uma imunização coletiva. Segundo esses especialistas, o Brasil precisa atingir a meta de 322 milhões de doses aplicadas (1ª e 2ª dose) em pessoas acima de 18 anos, para atingir essa imunidade. Até agora tivemos a aplicação de apenas de 49,6 milhões de doses, faltando ainda outras 272,3 milhões”, alertou.

O parlamentar gaúcho disse ainda ao ministro da Defesa que, no ritmo atual de vacinação (média de 661,4 mil doses aplicadas diariamente nos últimos 7 dias), o Brasil vai demorar mais 411 dias para concluir a meta, jogando a conclusão da vacinação contra a Covid para a metade de 2022. Sem resposta convincente ao deputado Henrique Fontana, Braga Netto disse que não queria polemizar e reafirmou que o País está em 5º no ranking de vacinação (em número de doses).

Já o deputado Paulão (PT-AL) questionou o ministro da Defesa sobre os R$ 43 milhões em recursos públicos utilizados para a produção de cloroquina nos laboratórios do Exército, “como tratamento preventivo” à Covid, justamente na gestão do general Pazuello. O medicamento é contraindicado pela ciência. “Penso que esse recurso poderia ter sido mais bem aplicado na saúde pública”, observou o alagoano. Apesar da indagação, Braga Netto não explicou os gastos com a produção do medicamento defendido pelo presidente Bolsonaro.

Militarização do governo Bolsonaro

Vários parlamentares também questionaram o ministro da Defesa sobre o número exagerado de militares ocupando cargos no governo Bolsonaro. Em resposta, Braga Netto respondeu que há exagero da imprensa sobre esse número e que não existe proibição legal para isso. Questionado pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP) sobre “quantos militares ocupam cargos comissionados no governo, e que não são de natureza militar”, o ministro da Defesa simplesmente não respondeu.

Ignorando ainda as várias acusações de incompetência que pesam contra o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, Braga Netto respondeu que é normal um militar ocupar um cargo por indicação política quando se exige “expertise e competência”. A declaração entra em contradição com ações do Ministério da Saúde sob o comando do general Pazuello, considerado por ele mesmo “especializado em logística”.

Na época de Pazuello, o Ministério da Saúde deixou 8 milhões de testes contra a Covid perderem a validade, enviou errado milhares de doses de vacinas para dois estados brasileiros ao confundir as abreviações AM (Amazonas) e AP (Amapá), e mais recentemente descobriu a existência de mais de 100 mil doses de vacinas “perdidas” em seu estoque.

Manifestações antidemocráticas

Parlamentares petistas ainda questionaram o ministro da Defesa sobre as manifestações antidemocráticas promovidas por bolsonaristas desde o início do atual governo, e que pedem intervenção militar no País com o fechamento do Congresso e do STF. O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) lembrou ao ministro da Defesa que o presidente Bolsonaro costuma apoiar esses atos, por palavras e gestos, inclusive sobrevoando de helicóptero essas manifestações.

Revelando o incômodo com a indagação, Braga Netto respondeu que não iria comentar declarações e atos do presidente da República. “Essa pergunta deve ser feita a ele”, disse, esquivando-se.

Do PT na Câmara