Com um discurso de “combate à corrupção” e de uma suposta necessidade de levantar capital com urgência para o pagamento de dívidas, o governo golpista de Michel Temer vem tentando implementar um agressivo plano de desintegração da Petrobras desde os primeiros meses após o golpe.
Segundo a Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet), a venda de ativos e a concessão da exploração para empresas estrangeiras não é apenas desnecessária, como ainda pode causar problemas a médio prazo no pagamento das dívidas, além de aumento nos custos de operação, beneficiando apenas o capital estrangeiro. Para o Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados, Pedro Garrido da Costa Lima, o processo desrespeita a lei de desestatização brasileira (9.491/1997).
Como se não bastasse, um dos primeiros atos do governo golpista foi a aprovação do Projeto de Lei 4567/16, de autoria de José Serra, que tirou da Petrobras a exclusividade como operadora única de todos os blocos contratados no regime de partilha de produção em áreas do pré-sal.
Um mês após o golpe, o projeto começou a tramitar e foi sancionado em novembro de 2016, entregando o petróleo para operadoras estrangeiras. A estatal norueguesa Statoil adquiriu a participação da Petrobras no bloco exploratório BM-S-8 (Carcará) por apenas US$ 1,25 bilhão, sendo que o bloco valeria US$ 12 bilhões, de acordo com contas da Aepet.
O presidente da Aepet, Felipe Coutinho, afirmou que este projeto “atendeu às demandas das multinacionais do petróleo. O que está em jogo é a renda petroleira”. Para ele, “a venda da Petrobras, o fim da obrigatoriedade de conteúdo nacional, os leilões, todas essas iniciativas favorecem as multinacionais do Petróleo”. “Vemos uma tendência de aplicação de um modelo neocolonial, em que se acelera a extração de um produto estratégico a favor das multinacionais. Nenhum país se desenvolveu exportando petróleo.”
Privatização
O Plano de Negócios e Gestão 2017-2021 prevê a venda de US$ 21 bilhões em ativos até o próximo ano – em outras palavras, privatização de atividades como a produção de biocombustíveis, distribuição de gás de cozinha, produção de fertilizantes e das participações em petroquímica.
Esse plano foi suspenso pelo Tribunal de Contas da União em dezembro de 2016 e liberado em fevereiro, com a condição de que a estatal reiniciasse o processo de vendas sob um novo conjunto de regras, mas sem questionar a venda de ativos e nem os contratos que foram assinados.
O presidente da Aepet, Felipe Coutinho, defende que a privatização parcial por meio da venda de ativos é desnecessária. Ele apresentou junto do economista José Carlos de Assis uma alternativa ao atual Plano de Negócios e Gestão, em que afirma que “usando parte da geração de caixa, na mesma proporção alocada em seu plano atual, a companhia pode ir amortizando sua dívida e trazê-la para um nível razoável, sem afetar a distribuição de dividendos e os investimentos previstos”.
O documento ainda afirma que “a venda de ativos produz exatamente o oposto no médio prazo. Reduziria a capacidade futura de geração de caixa da empresa, pois os ativos que se pretende privatizar, como BR Distribuidora, Liquigás, Termoelétricas e Transpetro, são altamente lucrativos”.
Cadeia produtiva
A venda dos ativos não só retira a capacidade de gerar caixa da Petrobras, como atrapalha a cadeia produtiva do petróleo no país e até mesmo aumenta os custos da produção e distribuição.
Alguns casos emblemáticos são a venda de 51% da BR distribuidora e a privatização completa da Liquigás e de 90% dos gasodutos da Nova Transportadora do Sudeste (NTS).
No caso da BR distribuidora, empresa estratégica na cadeia de petróleo que teria 51% das ações vendidas sem licitação, o processo foi suspenso pela Justiça após ação movida pelos petroleiros José Hunaldo Nunes Santos e Fernando Borges da Silva. Com o controle da empresa, investidores estrangeiros poderiam até mesmo manipular o preço do combustível nacional.
Já a Liquigás foi vendida para a Ultragaz, subsidiária da Ultrapar, em negócio de R$ 2,8 bilhões. Segundo a Aepet, a venda foi um erro estratégico, uma vez que a empresa teve lucro líquido de R$ 114 milhões em 2015, com crescimento projetado de 1,5% ao ano. Além disso, a empresa repassou um ativo de 24,9 milhões de botijões de gás que valeriam sozinhos R$ 2,66 bilhões.
No caso dos gasodutos da NTS, 90% da estatal foi vendida para a canadense Brookfield Infrastructure Partners pelo valor de aproximadamente US$ 5 bilhões. A Aepet explica que o negócio de gasodutos é um monopólio natural e repassá-lo à iniciativa privada deverá aumentar os custos, uma vez que, de acordo com a lei 11.909/2009, o transportador tem direito a remuneração suficiente para seu investimento (lucro) mediante reajuste tarifário periódico. Ou seja, mesmo quando não houver necessidade de uso da capacidade instalada, a Petrobrás terá que pagar pelo uso do sistema.
Ilegalidade
A Lei nº 9.491/1997, em seu artigo 3º, proíbe a desestatização das empresas públicas e das sociedades de economia mista que exerçam atividades de competência exclusiva da União, não se aplicando às participações acionárias detidas por essas entidades. Um exemplo é o transporte de gás natural, que estaria vetado pela lei.
Segundo Pedro Garrido, “o problema é que a Petrobras não segue as normas dessa legislação, o programa de parceria de investimentos criado em maio por Medida Provisória não revoga essa legislação para desestatizações”.
Garrido ainda ressalta que o governo se utiliza do decreto 2.745/1998 para justificar as privatizações, mas esse decreto se aplica somente à compra e venda de bens e serviços, e não à venda de ativos. “Utilizam esse decreto como subterfúgio para desviar da legislação.”
Para o assessor legislativo da Câmara, existe uma pressa em se vender os ativos da estatal brasileiro, por isso a lei está sendo desrespeitada. “Se fossem seguir a lei para a venda de subsidiárias teriam que lançar edital com prazo mínimo para interessados ofertarem, contratar consultorias especializadas para realizar avaliação dos ativos, de acordo com avaliações de mercado, e estaria tudo publicizado, e ainda teriam que realizar os leilões ou a forma de licitação considerada para a venda efetiva. Demoraria muito mais tempo”, explica.
Garrido ainda afirma que a última decisão do Tribunal de Contas da União, de permitir que se reinicie o processo de venda de ativos, deslegitima o próprio órgão. “O próprio TCU arruma uma espécie de jeitinho de dar uma explicada na continuidade”, disse ele. “É como se as subsidiárias não fosse empresas públicas e não estivessem sujeitas a controle da união. Abre um precedente perigoso. As subsidiárias são empresas públicas e respondem a um interesse público. Foram criadas por lei com vistas ao interesse público”, conclui.
Por Pedro Sibahi, da Redação da Agência PT de notícias