O Foro de São Paulo chega a sua 26ª edição com vários países da América Latina respirando novos ares democráticos após a escalada de extrema-direita, precarização de direitos trabalhistas e sociais, violência sistemática no continente, criminalização de manifestações de rua e transformações das relações trabalhistas a partir de novas tecnologias.
Sob esse cenário, um dos painéis de discussão será a articulação da organização com movimentos sociais e sindicais no pós-pandemia, reflexos da guerra da Ucrânia, desafio de redes sociais, ação unificada em defesa de mulheres latinas, trocas de experiências progressistas e redução do papel do Estado no bem-estar social.
Fazem parte dos debates a secretária Nacional de Mulheres do PT, Anne Caroline Moura, os representantes do Coletivo Internacional da JPT, Alexandre Pupo, do setor de Relações Internacionais e coordenação Nacional do MST, Messilene Gorete, o secretário de Relações Internacionais da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Antonio Lisboa, e o coordenador político da Confederação Sindical de Trabalhadores(as) das Américas (CSA Sindical), Ivan Gonzales.
O encontro misto (presencial e virtual) vai ocorrer em Brasília, de 29 de junho a 2 de julho, no Hotel San Marco e tem como tema “Integração regional para avançar a soberania latino-americana e caribenha”.
Mulheres
Segundo Anne Moura, o Foro de São Paulo ganha relevância neste ano após os avanços da extrema-direita no continente, cenário que começou a ser revertido a partir da eleição de democratas e progressistas em países como Brasil, Colômbia, Bolívia e Chile. Para a secretária nacional de Mulheres do PT, a saída desse cenário de corrosão de direitos está na educação, trocas de experiências internacionais, combate à violência contra mulheres latinas e defesa de ideias progressistas.
“Por termos vivido os últimos anos sob a chaga da extrema-direita nas Américas, o Foro de São Paulo ganhou mais relevância por se tratar de uma instância que estimula o debate, o pensamento e a troca sob a ótica progressista. Importante ressaltar que o Foro ocorre ao mesmo tempo em que governos de esquerda retornam ao poder em alguns países da América Latina”, disse Anne.
Para a dirigente, a esquerda de hoje não é a mesma dos últimos 20 anos. “A América Latina mudou bastante. A preservação dos nossos biomas, sobretudo as reservas de água doce, é uma preocupação que deve constar para todos os líderes. É fundamental alinharmos nossos projetos e trocar experiências.”
Anne afirma que, no caso de mulheres, a violência ultrapassa fronteiras. Neste sentido, “é urgente a criação de protocolos e acordos internacionais que resguardem as vidas das mulheres que estão nos cargos de poder e decisão e de suas assessoras”.
Juventude
Segundo Alexandre Pupo, secretário de Relações Internacionais da JPT, a região sofreu fortes impactos econômicos causados pela pandemia, impactos correlatos à guerra da Ucrânia e instabilidade política com os golpes que levaram à governos de direita e ao fortalecimento da extrema-direita no continente.
“Se o começo dos anos 2000 marcaram crescimento sem precedentes da efetivação de direitos sociais, trabalhistas e de gênero, os anos de 2015 em diante são um período de retrocesso e reação conservadora, mas nossos povos também sabem defender seus direitos e avançar nas mobilizações populares”, comentou.
Para o secretário, o Foro de São Paulo é um importante espaço de convergência, concentração de diferentes partidos de esquerda e espaço importante para o fortalecimento do campo progressista.
As “decadas ganadas” de maioria de governos progressistas na região não foram resultado de nenhum plano conspirador como a extrema-direita faz parecer, mas da potência que há quando os movimentos regionais populares, de trabalhadores, estudantes e mulheres se unem para intercambiar experiências, análises e projetos de políticas públicas.
Nesse sentido, “o Foro deve continuar tendo o papel de apoiar os governos populares, motivando e provendo espaço para articulações regionais que aperfeiçoam nossas gestões”.
CUT
Na avaliação de Antonio Lisboa, secretário de Relações Internacionais da CUT, o Brasil tem situações um pouco diferentes da de vários países latino-americanos e vive hoje um processo de recuperação dos direitos trabalhistas, sociais e humanos, que foram duramente atacados a partir de 2016 depois do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff.
“Já naquele momento do golpe houve vários ataques, especialmente, aos povos indígenas e quilombolas. Depois, veio a reforma trabalhista, que retirou direitos dos trabalhadores e retrocedeu as relações de trabalho no Brasil há praticamente um século”, afirmou.
Segundo Lisboa, o cenário nacional de destruição foi amplamente agravado a partir da eleição de Jair Bolsonaro, com ataques a direitos humanos, sociais, trabalhistas, às juventudes de periferia, trabalhadores rurais, reservas indígenas, população LGBTQIA+ e mulheres.
“Com a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nós estamos recuperando esse processo, especialmente com o diálogo social. Medidas já foram tomadas para o fortalecimento da organização e direitos das mulheres, a preservação dos povos originários, especialmente, a população ianomâmi”, comentou. “Então, nós estamos, depois de 7 anos de tragédia, recuperando aquilo que perdemos.”
Para Lisboa, o Foro de São Paulo é decisivo na formulação das estratégias da esquerda latino-americana pelo menos nos últimos 30 anos e na defesa dos direitos trabalhistas e sociais.
“Eu acredito que uma aliança bem feita do Foro de São Paulo com os movimentos sociais, sem dúvida, pode fortalecer a luta dos trabalhadores e trabalhadoras da região”, afirmou.
CSA Sindical
Segundo Ivan Gonzalez, coordenar político da Confederação Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras das Américas (CSA Sindical), grande parte do continente latino-americano e organizações operárias e sindicais enfrentam violência sistemática, campanhas de agressões em debates políticos e falsas narrativas, com criminalização das formas de manifestação, de luta, de greves e de mobilizações.
“Sucessivos governos conservadores e neoliberais mostraram suas piores facetas durante a pandemia de Covid-19, resultando no agravamento de situações estruturais como pobreza, desigualdade, precariedade, trabalho em condições informais, empregos sem salário mínimo nem carga horária definida, desigualdade salarial entre mulheres e homens, falta de proteção social e fragilidade do diálogo social”, comentou o dirigente.
Gonzáles diz que o cenário atual da América Latina exige uma resposta articulada para a construção de unidade programática e mobilização de uma agenda positiva na construção da verdadeira democracia econômica, social e política. Neste sentido, o Foro de São Paulo é um espaço importante para a concertação de estratégias de luta e solidariedade entre os partidos políticos, o sindicalismo e demais movimentos sociais.
“A CSA Sindical reivindica o Sindicalismo Sociopolítico como uma forma de comprometer aos sindicatos as necessárias transformações sociais e políticas de nossos países. Além do local de trabalho e das questões laborais, é preciso um sindicalismo que milite nas agendas democráticas e pela transformação de nossas sociedades”, ponderou.
O coordenador diz que o respeito e autonomia de cada ator permite construir agendas para mobilizar pautas progressistas e populares, incidir frente a governos e defender uma participação democrática nas diferentes instâncias de tomada de decisões.
“Defendemos um diálogo democrático com os partidos e governos progressistas, com o reconhecimento do papel dos sindicatos como atores sociais e políticos. O sindicalismo tem um compromisso na defesa dos governos progressistas sem renunciar aos interesses da classe trabalhadora”, afirmou.
MST
A coordenadora nacional do setor de relações internacionais do MST, Messilene Gorete, relata que o continente latino-americano sofre com a crise estrutural do capitalismo mundial, principalmente depois da pandemia de Covid-19.
Em dezembro de 2019, pouco antes de o início da pandemia, relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) já apontava a América Latina como uma das regiões com a maior desigualdade de renda do mundo.
“Um relatório de panorama social, realizado em 2022 pela Cepal, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, aponta que 201 milhões de pessoas, ou seja, 32,1% da população total da região, vivem em situação de pobreza, dos quais 82 milhões, 13,1%, se encontram em pobreza extrema”, disse.
Messilene fala que o Foro São Paulo é referência e unidade politica, ideológica e de projeto para todos os partidos de esquerda no continente. “Para fazer a luta contra a extrema-direita na nossa região, defender os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras e os nossos governos populares é mais que necessário ter o Fórum São Paulo, um espaço dedicado à unidade da esquerda política.”
Da Redação