Nesta terça-feira, 16, o ministro da Economia, Paulo Guedes, cometeu novo disparate. “Vejo um futuro brilhante porque é muito difícil a gente piorar”, disse. Em evento a investidores, o Posto Ipiranga não conseguiu esconder a soberba: “A democracia está cada vez mais robusta e mais flexível”, comentou, em evento do Instituto de Garantias Penais. Só não arrancou risos, porque não falava no circo de horrores do auditório do Ministério da Fazenda: “O Brasil vai surpreender e atravessar as duas [ondas], o Congresso está conversando e vamos prosseguir com as reformas”, declarou.
O Posto Ipiranga já foi capaz de previsões risíveis. No ano passado, Guedes previu que a economia brasileira navegaria em voo de cruzeiro, mesmo com a cruel política de austeridade, impondo cortes no orçamento público, congelando gastos sociais – na saúde e na educação, sobretudo – e suspendendo investimentos públicos. Diante do “pibinho de 1%” de 2019, o ministro não teve dúvidas. Voltou a prometer o paraíso este ano, depois de aprovada a reforma da Previdência.
Solapado pelo próprio fracasso, ele retomou o surto. Diante da hecatombe que se abate sobre o país, cuja previsão de queda para a economia em 2020 varia entre 7% e 11% – de acordo com previsões que vão do mercado financeiro até o FMI – Guedes delira agora talvez pela febre provocada pela morte de quase 50 mil pessoas vítimas do Covid-19, ou pelo sol que ofusca 1 milhão de pessoas infectadas pelo novo coronavírus. De qualquer jeito, Guedes carrega nas costas a responsabilidade pelos milhões de trabalhadores demitidos no país – o desemprego cresceu 10,8%, em maio.
Nada disso parece estar diante dos olhos de Paulo Guedes, míope diante da barbárie imposta ao país pelo governo selvagem de extrema-direita, liderado pela tibieza do presidente. O ministro parece ocupado demais em bajular Bolsonaro, enquanto entrega nacos da riqueza nacional a especuladores e faz girar o mercado financeiro, cevado pelos juros mais altos do mundo em tempos de pandemia. De fato, o ministro enxerga pouco, talvez por usar as lentes vistosas dos óculos de Augusto Pinochet, o ditador chileno a quem serviu nos anos 80.
Mundo entre a surpresa e a perplexidade
Mas, uma coisa Guedes tem razão. O mundo foi surpreendido. Ninguém esconde perplexidade com o Brasil de Bolsonaro. As declarações estapafúrdias do presidente, que nega a pandemia, desdenha de especialistas em saúde pública e sabota as medidas de isolamento social para enfrentar o coronavírus, não deixam margem a qualquer chefe de Estado do mundo: o maior país da América do Sul virou o principal foco da pandemia, que cresce de maneira descontrolada. E, como tem reiterado a imprensa estrangeira, enquanto quase todos os governantes do planeta adotam medidas para melhorar a vida do povo, no Brasil, o presidente e seus asseclas pintam o país de luto.
Ao tempo em que Bolsonaro vocifera contra esquerdistas, o investidor estrangeiro foge do Brasil, porque teme perder dinheiro num país em que a crise institucional é estimulada diariamente pelo presidente e os filhos, todos incapazes de conviver com críticas ou adversários. Aqui, apoiadores do presidente querem o fechamento do Congresso, defendem a prisão de juízes da Suprema Corte, mas os especuladores não se importam. E nada disso parece incomodar Paulo Guedes, o cardeal da morte na missa de corpo presente da democracia.
“Vejo um futuro brilhante porque é muito difícil a gente piorar”, diz o Rolando Lero da Esplanada. “Nosso viés cultural já nos botou num buraco, então nós vamos ter que melhorar”, completou. Basta olhar para as ruas brasileiras, com o desemprego atingindo 13 milhões de trabalhadores, a desigualdade crescente e a violência explodindo para perceber que o ministro da Economia vive no céu manchado pelo sangue dos pobres que ele esfola agora, mais uma vez, talvez saudoso dos tempos em que trabalhava no governo de Pinochet, no Chile, de triste memória para os democratas e o mundo civilizado.