A insistência de o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, em manter a taxa de juros em 13,75% ao ano estrangula, paulatinamente, os principais setores da economia brasileira, além de impor dificuldades à sobrevivência dos mais pobres. Desta vez, foi o setor automobilístico que acusou o baque.
Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), a produção de automóveis no Brasil sofreu em abril queda de 19,4% em relação a março. A produção das montadoras recuou de 221,8 mil unidades para 178,8 mil.
É mais uma voz que se insurge no país contra a política de controle da inflação que Campos Neto alega como motivo para praticar no Brasil a mais alta taxa de juros do mundo. Para o presidente da Anfavea, Márcio de Lima Leite, o crescimento do mercado não vai acontecer se os juros não abaixarem.
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“Com esses juros elevados, o mercado continuará em processo de retração, não cresce. Vamos continuar dando notícias de paradas de fábricas ou as notícias serão piores se a taxa permanecer elevada. A taxa de juros hoje é incompatível com a expectativa de crescimento da indústria”, ponderou Leite.
A Anfavea informou que comunicou a Campos Neto a sua posição em relação à Selic, a taxa básica de juros. O estrangulamento financeiro das montadoras, segundo dados da entidade, impacta negativamente um setor que representava, em 2021, cerca de 21% do PIB industrial brasileiro e 4% do PIB total do país, com reflexos diretos e indiretos sobre milhões de empregos e milhares de médias e grandes empresas produtoras de peças.
Dados da entidade apontam também recuo das exportações brasileiras de automóveis em abril, que ficaram em 34 mil unidades frente às 45 mil do mesmo período de 2022 e às 44 mil de março deste ano, contribuindo negativamente com a balança comercial brasileira.
Isolamento
Campos Neto fica, a cada dia, mais isolado na defesa de taxa de juros genocidas e extorsivas, como classificou a presidenta Nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann. Em Londres, durante a coroação do rei Charles 3º, o presidente Lula voltou a criticar o presidente do Banco Central, nomeado por Bolsonaro.
“Ele tem compromisso com quem? Com o Brasil? Não tem! Ele tem compromisso com o outro governo, que o indicou. Isso é importante ficar claro. Ele tem compromisso com aqueles que gostam de taxa de juros alta. Porque não há outra explicação”, afirmou.
Além de 80% dos brasileiros, segundo pesquisa Datafolha, de 03 de abril, outras vozes que se insurgiram contra os escorchantes juros de 13,75% foram o Nobel de economia, Joseph Stiglitz, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, (“É muito caro tomar crédito. Os bancos não precisam de juros altos para ter lucros.”) e o presidente executivo do Bradesco, Octavio de Lazari (“Juros são proibitivos para se investir no Brasil.”), em fevereiro de 2022.
Em contrapartida à voz do povo e dos principais setores produtivos, 98% do chamado mercado, ou seja, 82 representantes da elite financeira nacional, apoia a política de juros altos.
“Carro popular”
Durante a reunião no Palácio do Planalto que marcou a volta do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, o chamado Conselhão, presente em seus primeiros mandatos como presidente, Lula reiterou a defesa de uma taxa de juros condizente com a realidade brasileira e voltou a falar sobre o preço do chamado carro popular.
“Qual pobre que pode comprar carro popular por R$ 90 mil? Um carro de R$ 90 mil não é popular. É para classe média”, afirmou Lula.
Sobre os juros, Lula afirmou: “É muito engraçado o que se pensa neste país. Todo mundo aqui pode falar de tudo, só não pode falar de juros. Ninguém fala de juros, como se um homem sozinho pudesse saber mais do que a cabeça de 215 milhões de pessoas”.
Da Redação