Desautorizado pelo ministro do STF Dias Toffoli da aberrante tentativa de impor tornozeleira eletrônica a José Dirceu, o juiz Sérgio Moro admitiu ter se ‘equivocado’ no entender da questão, como informou o G1. Mesmo assumindo o erro, em despacho feito após a cassação, Moro fez um mea culpa e limitou-se a lamentar que a tentativa tenha sido interpretado como “claro descumprimento” da decisão do STF.
Mesmo sem sequer ter sido citado na decisão, o juiz de primeira instância reformou sua decisão no dia 29 de junho, apenas três dias depois de Dirceu ter sido solto por decisão da 2ª Turma do STF. Os ministros assim agiram por respeito ao princípio da presunção de inocência, entendendo que Dirceu deve aguardar em liberdade que o recurso apresentado por sua Defesa ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) seja julgado, pois há chance real de que sua pena seja reduzida, reformada ou mesmo suspensa no tribunal superior.
Contrariado em seu desejo de manter o ex-ministro atrás das grades (mesmo que às custas de garantias fundamentais), Moro fez o que julgou estar a seu alcance para desautorizar o STF: se não podia mantê-lo preso, ordenou que o ex-ministro utilizasse tornozeleira eletrônica. Intimou Dirceu a deslocar-se de Brasília a Curitiba para vestir o equipamento. Também aplicou uma série de constrangimentos à movimentação e comunicação do ex-ministro.
Mas quem acabou desautorizado foi o juiz de primeira instância do Paraná. Na segunda-feira (2), o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) cassou a decisão e assegurou, conforme disse, a “liberdade plena” de Dirceu. Toffoli deixou muito claro o motivo: o juiz de primeira instância estava se metendo onde não lhe cabia.
Alçado ao posto de “justiceiro” desde a escalada da Lava Jato e considerado “herói” por alguns, Moro cometeu uma série de “equívocos” desde o início da operação. Mas só recentemente seus erros têm sido revistos nas instâncias superiores.
É a quinta “derrota” da Lava Jato em pouco mais de um mês, como admitem até veículos da grande imprensa. No dia 14 de junho, mais de um ano após o aberrante episódio da condução coercitiva de Lula para um simples depoimento, o Supremo proibiu o uso desse expediente.
No dia 20 do mês passado, a Segunda Turma do STF inocentou a senadora e presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, das acusações infundadas de envolvimento em esquemas na Petrobras.
Dias depois, o Supremo concedeu Habeas Corpus de ofício a José Dirceu, a fim de corrigir a sanha punitivista de Moro e da força-tarefa. Na mesma semana, anulou as “provas” colhidas pela Polícia Federal no apartamento funcional de Gleisi na investigação contra o marido dela, Paulo Bernardo.
Agora, quando os erros da Lava Jato começam a ser corrigidos, uma pergunta ainda aguarda resposta: quando Sérgio Moro assumirá seus equívocos contra Lula?
Gosto pela convulsão social
Nem os mais ferrenhos defensores do juiz paranaense são capazes de negar sua seletividade, de tão escancaradas que são suas tentativas de interferir no debate público. Sobram exemplos, faltam justificativas convincentes.
No caso mais gritante, em março de 2016, vazou uma gravação sigilosa com conversas grampeadas da então presidenta Dilma com o ex-presidente Lula. Isso, por si só, já é crime, previsto no parágrafo 1º do Artigo 153 do Código Penal:
“Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública“. A pena é de um a quatro anos de detenção. Mas o caso foi ainda mais grave, porque o próprio grampo que interceptou as conversas era ilegal, uma verdadeira arapongagem da Polícia Federal, feita sem a devida autorização judicial.
O que aconteceu, então, com Sérgio Moro? Nada. Pediu “sinceras escusas ao STF” por ter vazado um grampo ilegal que interceptou a presidenta da República, como noticiaram G1, Folha de S. Paulo e outros sites e jornais. Admitiu que poderia ter “se equivocado em seu entendimento jurídico” e negou que tenha tido a intenção de “provocar polêmicas, conflitos ou provocar constrangimentos”, embora tenha feito depois várias declarações à imprensa dizendo não se arrepender. E ficou por isso mesmo.
Questionado no Roda Viva (assista aqui) se enxergava alguma contradição entre ter pedido desculpas ao STF pela divulgação do grampo ilegal na presidenta e ter feito declarações em favor de sua decisão, ele voltou a defender a medida. “Eu pedi escusas pela controvérsia gerada, mas jamais pedi escusas a respeito da divulgação daqueles áudios”, afirmou, frivolamente, como se não estivesse confessando um crime.
Tão longe, tão perto (dos tucanos)
Em 2016, Moro foi flagrado tendo uma risonha conversa com o senador Aécio Neves, articulador do golpe contra Dilma, investigado por Furnas e acusado mais tarde por um notório esquema com direito a malas de dinheiro, obstrução de justiça e até gravações com ameaças de morte em forma de piada. Não foi a primeira nem a última vez que Sérgio Moro foi visto em convescote com tucanos. Só nesta reportagem, há dez ocasiões.
Indagado pelo jornal alemão Deustche Welle sobre os motivos que o levaram a tão sorridente encontro com Aécio, Moro saiu-se dizendo que ambos estavam em um evento público, e que os casos de Aécio não estão sob sua jurisdição. Disse também que “foi uma foto infeliz”.
O tema voltou à baila quando, quarenta dias depois de condenar Lula, o juiz paranaense posou pomposo ao lado de João Doria, candidato do PSDB ao governo de São Paulo, durante um evento patrocinado pela empresa do tucano em… Nova York. O próprio Moro julgou – e negou – pedido da Defesa para que fosse declarado suspeito a julgar o caso de Lula após a foto. Ele jura ser imparcial.
Ilegalidade e exceção na gênese da Lava Jato
Uma reportagem do UOL publicada há dois anos aponta ilegalidades postas em prática por Moro já no embrião da Operação Lava Jato. Documentos obtidos à época mostram grampos ilegais, manobras para manter os processos com a 13ª Vara Federal de Curitiba e até pressão a encarcerados. O elo entre o deputado Jose Janene (já falecido) e o doleiro Alberto Youssef, em 2006, surgiu da gravação de conversa advogado-cliente, conforme aponta um documento da própria PF. A ilegalidade patente foi autorizada por Moro. Os desdobramentos dessa conversa levariam à ligação de Youssef com Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras e primeiro delator da LJ.
Para não falar da chamada “usurpação de competência” que Moro praticou para puxar para si o processo contra Lula. Afinal, a Petrobras tem sede no Rio de Janeiro. O imóvel e o sítio que Moro insiste em atribuir a Lula, ficam no estado de São Paulo. E é no mesmo estado que vive o ex-presidente. Por que, então, o processo deveria estar nas mãos de um magistrado em Curitiba? Como apontam juristas, a ânsia persecutória de Moro fere o direito do juiz natural e da livre distribuição do processo.
A falácia do “Ato de Ofício Indeterminado”
O processo contra o ex-presidente Lula foi o apogeu de um expediente que começou ainda em 2012. Sem ter como comprovar que ministros eram cúmplices/mandantes dos casos julgados no chamado Mensalão, apelou-se à chamada “teoria de domínio do fato”, segundo a qual seria impossível um mandatário não saber que um crime estivesse sendo cometido. Mesmo sem provas. Uma aberração no direito brasileiro que motivou condenações por “ato de ofício indeterminado”.
A tese de nome pomposo não esconde um fato incontornável: não há qualquer prova de que Lula tenha beneficiado alguém para ganhar o tal tríplex. Como não havia em outros casos envolvendo Gleisi e Dirceu. A Lava Jato se valeu desse e outros expedientes controversos para tirar de circulação o candidato mais popular dessas eleições. Em troca de preferência nos vazamentos seletivos de Moro e dos interesses patronais, parte da imprensa tentou engambelar a opinião pública. Em alguns casos, instâncias superiores da Justiça encamparam a teoria.
Por Redação Agência PT de Notícias