Partido dos Trabalhadores

No Senado, Contarato rememora Campos Neto: “BC deve fomentar o pleno emprego”

“O senhor sabe quanto custa um litro de leite?”, indagou o o líder do PT ao presidente do BC, nesta terça (25). “Um dos fundamentos da República é a erradicação da pobreza. O que o BC tem feito para cumprir esse objetivo?”

Foto: Alessandro Dantas

Contarato interpela Campos Neto: “Temos que sair da Faria Lima e interagir com a população que mais precisa"

Uma das principais atribuições previstas em lei ao Banco Central, quase sempre esquecida por economistas neoliberais, é o compromisso com a geração de empregos no Brasil. Convidado à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE), nesta terça-feira (25), para debater o tema dos juros, o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, não conseguiu explicar por que decidiu seguir pelo caminho inverso dessa obrigação.

À frente de uma política monetária desastrosa que emperrou o crédito, asfixiou investimentos e massacrou o emprego e a renda no país, Neto festejou a taxa Selic no atual patamar de 13,75%, atribuindo, equivocadamente, a inflação de 5,8% ao arrocho monetário do Bacen.

“Vamos sair um pouco do tecnicismo”, anunciou o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES). “Quero perguntar ao presidente do Banco Central se ele sabe quanto custa um litro de leite, um quilo de arroz e de feijão”, disparou Contarato.

“Temos que sair da Faria Lima e interagir com a população que mais precisa. Sabemos que o Banco Central possui, legalmente, o objetivo de fomentar o pleno emprego. O que tem sido feito para cumprir esse objetivo?”, indagou.

Juros afetam os mais pobres

Campos Neto divagou e não soube responder, limitando-se a classificar a inflação como a grande inimiga dos mais pobres, pelo seu “alto custo”. Como se fosse o índice sozinho – e não o baixo consumo, a falta de crédito, o endividamento e o desemprego gerados pelos juros altos – a castigar a população.

“A taxa de juros é aplicada indistintamente a todos os agentes”, insistiu Contarato. “Uma taxa de 13,75% atinge a pessoa física, o trabalhador, toda a população, e as pessoas jurídicas, grandes empresas. Quando essa política pública é aplicada de forma igualitária, quem sente os efeitos são os mais pobres”, argumentou o senador.

“Minha pergunta é: o que tem sido feito para que os bancos, as grandes instituições financeiras, também contribuam proporcionalmente aos seus lucros, para o controle inflacionário no país?”, perguntou. “Lembrando que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, e isso está na Constituição, é erradicar a pobreza, abolir toda e qualquer forma de discriminação e reduzir as desigualdades sociais e regionais”, ponderou.

Economês 

Nas cordas, Campos Neto recorreu ao economês de quinta categoria de sempre de que é preciso equilibrar as contas, uma vez que a dívida pública reflete sobre os juros. Disse ainda que não sabe quando a Selic poderá cair no país. “Não tem mágica no fiscal, infelizmente não tem bala de prata. Se a gente não tiver as contas em dia, se não tiver uma perspectiva, a gente não consegue melhorar”, desconversou.

“O que o Banco Central está vendo que o mundo não está?”, disse Contarato, em referência à maior taxa de juros real do mundo, a brasileira, hoje em quase 7%. 

Lula tem razão

Contarato afirmou que o presidente Lula tem toda a razão em protestar contra atual taxa de juros. “Quem será julgado pelo sucesso ou fracasso da política econômica é ele, que passou pelas urnas”, lembrou o senador. “Se ele não tem um meio para isso, fica difícil implementar as políticas públicas estabelecidas”.

Acompanhando o debate, a presidenta Nacional do PT, Gleisi Hoffmann, desmontou os “argumentos” de Campos Neto para manter os juros na lua. “Justificativa de Campos Neto pra juros pornográficos brasileiros é que “rentistas somos todos nós”. E ainda comemora que nunca se subiu tanto os juros em ano eleitoral como em 2022”, espantou-se Gleisi, em manifestação pelo Twitter.

“Onde já se viu? Meu filho, o povo brasileiro é trabalhador, precisa de emprego, renda e juros decentes pra pagar suas dívidas e sair do sufoco“.

Gleisi também demoliu a explicação de que a dívida pública não permite uma redução do atual patamar dos juros. “Temos uma relação dívida/PIB relativamente baixa, temos reservas cambiais e inflação abaixo do que muitos países”, rebateu a petista. “Quem está endividado é quase 80% da população brasileira”.

Desaquecimento econômico

A senadora Teresa Leitão (PT-PE) leu trechos da reunião da ata do Copom de 28 de março, quando o próprio Bacen apresentou um diagnóstico de desaceleração do setor produtivo, tanto de bens não duráveis, como de serviços. Igualmente, o mercado de trabalho também sofreu processo de diminuição, lembrou Leitão.

Trocando em miúdos, o desaquecimento econômico identificado pelo Banco Central é resultado direto do não cumprimento de uma de suas atribuições, o fomento à geração de empregos.

“Como o Banco Central pode contribuir para equilibrar a geração de emprego com desenvolvimento econômico, com a geração de renda?”, inquiriu Leitão. A senadora argumentou que é preciso retomar conceitos esquecidos, em clara referência à responsabilidade social do Banco Central, deixada de lado por Campos Neto.

“Banco Central tem sua autonomia, nosso governo preserva isso, mas autonomia não significa ficar desgarrado de um processo mais amplo de gestão, de governabilidade. “Nesse processo, alguns setores precisam ser reinseridos. Para isso, o crescimento econômico tem de dialogar com outros conceitos”, pontuou a senadora.

Dívida bruta

O senador Rogério Carvalho (PT-SE) questionou Campos Neto sobre os motivos para o Banco Central não atuar para reduzir a dívida bruta brasileira em pelo menos R$ 1,2 trilhões e, com isso, reduzir os juros. “A gente não pode esquecer que foram nos governos Lula que mais se fez superávit primário, em todos os anos”, lembrou o senador.

Ao presidente do Bacen, o senador defendeu uma flexibilização das metas de inflação, cujo centro, hoje em 3,25%, jamais foi cumprido durante o mandato de Campos Neto. Com metas menos rígidas, a pressão para manter a Selic nas alturas seria menor, argumentou Carvalho.

Taxa de juros inviabiliza comércio

“A meta de inflação não pode ser uma camisa de força para obrigar o país a alterar a taxa de juros, a ponto de tornar vulneráveis determinados setores da economia”, esclareceu o petista. “Nem o Japão conseguiu ficar na meta de inflação. Há uma necessidade de ajustarmos essa meta, para termos mais margem para reduzir a taxa de juros, com responsabilidade”, ressaltou.

“Sei que no caso das Americanas houve fraude. Mas será que, [de] todas as empresas que estão pedindo recuperação judicial, isso é por conta de fraude ou é por que a taxa de juros inviabiliza o comércio, o consumo?”, perguntou Rogério Carvalho.

“Política monetária e política fiscal precisam caminhar juntas”, apontou. O senador defendeu uma “concertação” entre os dois instrumentos “em nome da defesa do emprego, do crescimento, de investimentos em tecnologia e da redução da pobreza. Esse é o debate que deve ser priorizado”.

Cada vez mais isolado no debate, Campos Neto terá mais uma oportunidade para se explicar à sociedade sobre sua predileção em agir contra a economia brasileira. Nesta quinta-feira (26), o dândi do capital financeiro volta ao Plenário do Senado para participar de um debate com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Os temão serão taxa de juros, inflação e crescimento.

Da Redação