A complacência neoliberal do ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, fez ressurgir o descontrole generalizado dos preços. Além da inflação do aluguel, da inflação dos alimentos e da inflação dos combustíveis, brasileiros e brasileiras são vitimados pela inflação dos medicamentos. Antibióticos, anti-inflamatórios, remédios para dor e para diabetes ficam mais caros no mais grave momento da pandemia do coronavírus.
Em primeiro de abril, a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), órgão interministerial comandado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), promoveu a maior alta de preços em cinco anos. Foram autorizados aumentos acima da variação de 6,10% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), índice oficial da inflação, entre março de 2020 e março de 2021. O reajuste médio é de 8,15%.
O aumento, já em vigor, é de 10,08% para os produtos do nível 1, de maior concorrência. De 8,44%, para os produtos de nível 2, de concorrência moderada. De 6,79%, para o nível 3, para produtos com pouca ou sem concorrência. Como os reajustes incidem sobre o valor máximo cobrado em farmácias, os preços podem subir acima dos índices.
O senador Humberto Costa (PT-PE) chamou a atenção para os aumentos. “O reajuste dos remédios agora em abril foi de 10,08%, o maior desde 2016, e está bem acima da inflação oficial do país, que foi de 6,10% no mesmo no período. A alta do dólar foi o que mais pesou nos preços dos medicamentos, já que muitos insumos são cotados pela moeda americana”, postou o senador em seu perfil no Twitter, nesta terça (20).
Costa e os companheiros de bancada trabalham por mudanças no projeto de lei (PL) 939/2021, de autoria do senador Lasier Martins (Podemos-RS). O projeto, que suspende o aumento no preço dos medicamentos até o final do ano, seria votado no último dia 8, mas foi retirado de pauta.
A proposta altera a Lei 10.742/2003, que determina reajuste anual para medicamentos. Em 2020, esse aumento foi suspenso por 60 dias pela Medida Provisória 933/2020, mas a MP perdeu eficácia em 28 de julho, após não ter sido votada pelo Congresso.
O objetivo é vedar o reajuste enquanto perdurar a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional. Uma das sete emendas apresentadas em Plenário com essa meta é do senador Jean Paul Prates (PT-RN). Ele defende que o reajuste seja congelado neste ano, e a partir de 2022 fique limitado ao IPCA.
Humberto Costa e Rogério Carvalho (PT-SE) propõem a suspensão dos aumentos também para os planos privados de saúde. Costa sugere que, após 2021, o pagamento retroativo dos reajustes seja escalonado em 24 meses. Carvalho propõe o congelamento até 2022, com escalonamento ao longo de cinco anos a partir de 2023.
Na última quarta (14), em sessão do Senado para debater o PL, o representante do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Matheus Zuliane Falcão, destacou que os preços-teto estipulados pela Cmed são, na maioria, muito altos e descolados da realidade. Segundo o analista, isso gera distorções que afetam gravemente os consumidores, sobretudo os que dependem de tratamentos contínuos ou muito caros.
“O que vemos é uma crise econômica que leva a uma considerável redução do poder de compra. Esse é um momento que justifica mudanças extraordinárias. As soluções devem ser tão extraordinárias quanto o tamanho dessa crise”, afirmou Falcão, lembrando que 30% dos orçamentos familiares em saúde vão para a compra de remédios.
Aumentos abusivos
Embora fatores como a desvalorização cambial, o lento processo de aprovação de patentes de medicamentos e o ambiente de risco para negócios em um país em crise desde 2015 influenciem a inflação de medicamentos, são cada vez mais comuns os aumentos abusivos, como os registrados com o “kit intubação”, que subiram até 894%.
Os dados foram compilados pela Bionexo, multinacional brasileira que atende cerca de 40% dos hospitais privados no país e é referência em pesquisas na área de saúde, como do Índice de Preços de Medicamentos para Hospitais, elaborado em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).
A pesquisa ainda aponta que a busca por componentes do “kit intubação” começou a crescer a partir do fim de março e explodiu em abril. Nesse contexto, 70% da demanda por esses medicamentos não foi atendida.
Outro dado é a mudança no perfil dos itens críticos ao longo da pandemia. Se agora faltam os remédios usados para intubação, no primeiro pico da Covid-19, ocorreu o mesmo com os equipamentos de proteção individual (EPIs). Os hospitais tiveram dificuldade de se abastecer com esses materiais entre fevereiro e abril de 2020.
Golpe dilapidou o Farmácia Popular
“Acho que uma medida importante para o consumidor adotar, para contornar os preços elevados, é pesquisar, é nunca aceitar o preço da primeira farmácia. Uma possibilidade, também, é ele se utilizar do programa Farmácia Popular”, comentou Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de saúde do Idec, no ‘Jornal Nacional’ de terça.
Criado no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2004, a Farmácia Popular distribui gratuitamente medicamentos básicos para hipertensão, diabetes e asma. Remédios para controle de rinite, mal de Parkinson, osteoporose e glaucoma, além de anticoncepcionais, são vendidos com desconto de até 90%. Como outras políticas públicas, sofre retaliações desde o golpe contra Dilma Rousseff, em 2016.
Em 2017, o usurpador Michel Temer fechou todas as unidades próprias do programa mantidas pelo Ministério da Saúde. Até então, havia 400 pontos de atendimento, inclusive em municípios sem farmácia privada credenciada, distribuindo 112 diferentes medicamentos. Temer reduziu para 32.
Jair Bolsonaro mantém o desmantelamento. No ano passado, quando surgiu a pandemia, foram distribuídos medicamentos para 20,1 milhões de pessoas em todo o país. Uma diminuição de 1,2 milhão em relação ao ano anterior. É também a menor cobertura desde 2014.
O orçamento do programa para este ano foi reduzido para R$ 2,5 bilhões. Em 2020 era de R$ 2,7 bilhões, em valores corrigidos pela inflação. Isso, apesar da pandemia e da importância dos medicamentos distribuídos pelo programa.
O número de farmácias parceiras também caiu em 2020. Passou para 30.988 unidades. É o menor patamar desde 2013. Em 2015, auge da rede de atendimento, eram 34.625 postos em todo o país.
Com isso, a presença do Farmácia Popular vem minguando nos municípios. Em 2016 eram 4.467 municípios atendidos. Atualmente, o programa chega em 4.394 deles, que corresponde a 80% do total de municípios do país.
Da Redação