Fátima Bezerra: candidatos que apoiaram o golpe serão repudiados
A senadora Fátima Bezerra, do Rio Grande do Norte, acredita que a agenda de retiradas de direitos do presidente usurpador causará reação nas urnas
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A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) foi um dos destaques da resistência ao golpe votado pelo Senado no último dia 31 de agosto. O enfrentamento firme contra a bancada conservadora no plenário lhe rendeu elogios nas redes sociais e também nas ruas de Natal, cidade que adotou ao estudar pedagogia na Universidade Federal do Rio grande do Norte (UFRN).
Atualmente, nos intervalos entre as sessões no Senado, ela tem percorrido as ruas da capital potiguar e de cidades do interior do estado apoiando as candidaturas do PT a prefeito e prefeita. Fátima afirmou, em entrevista à Agência PT, que sente grande repúdio ao golpe, sobretudo nos bairros mais populares.
“Estive nos bairros populares de Natal logo após o impeachment, na sexta e no sábado. E da primeira casa que visitamos até a última, foi um tom só: revolta com relação ao Congresso, com esse perfil, tirar uma presidenta honesta, ou, como eles dizem, que não roubou. As pessoas consideram uma injustiça contra a presidenta Dilma, que é inaceitável ter um presidente que não foi escolhido pelo voto. Chamou muito a atenção o sentimento de solidariedade a ela”, conta.
Fátima acredita que é obrigação das campanhas políticas levar às ruas também o debate sobre a agenda regressiva do golpe, que pretende tirar direitos e prejudicar os orçamentos públicos das prefeituras. “A agenda política do golpe é uma bomba atômica sobre os direitos e conquistas dos trabalhadores brasileiros, e isso gera reação. Essa agenda regressiva de direitos tem de ser colada na testa dos candidatos que apoiaram publicamente o golpe”, afirma.
Entre as medidas que prejudicam a vida dos trabalhadores e trabalhadoras nos municípios brasileiros, a senadora cita a reforma da Previdência, a reforma trabalhista que pretende fazer o negociado se sobrepor ao legislado em direitos trabalhistas, a liberação da terceirização ilimitada e a PEC 241, que irá restringir o orçamento federal e prejudicar o financiamento de serviços como educação e saúde públicas.
Leia, na íntegra, a entrevista da senadora Fátima Bezerra:
Agência PT: senadora, a senhora teve muito destaque na resistência ao golpe no Senado, ao lado de outras senadoras que se mostraram muito altivas durante as votações do impedimento da presidenta Dilma Rousseff. Houve um protagonismo das mulheres nesse episódio?
Fátima Bezerra: Sem dúvidas. Isso ficou revelado para o Brasil e para o mundo, o protagonismo das mulheres nessa luta em defesa da democracia, e, portanto, contra o golpe. É bom destacar que das 13 senadoras com mandato atualmente, a presidenta Dilma contou com o apoio da maioria. Fomos 7 senadoras. Então, se dependesse das senadoras, se apenas as mulheres tivessem votado, a presidenta Dilma teria sido absolvida.
E é inegável o papel corajoso e competente que as senadoras Gleisi [Hoffmann, PT-PR] e Vanessa [Grazziotin, PCdoB-AM], que foram titulares da comissão especial do impeachment, e eu era suplente, mas me esforcei ao máximo para, junto com elas, dar nossa contribuição no sentido de defender a inocência da presidenta Dilma e, portanto, defender a democracia e lutar incansavelmente para não só barrar o golpe, mas como desmacará-lo como golpe.
A bancada feminina em defesa da presidenta Dilma foi muito aguerrida. As senadoras Kátia [Abreu, PMDB-TO], Lídice [da Mata, PSB-BA], Regina [Sousa, PT-PI] e Ângela [Portella, PT-RR] agiram com muita capacidade e ousadia. Isso se deve à nossa convicção à defesa da democracia, da soberania popular, e do respeito à Constituição. Da convicção que temos da biografia limpa, honesta e íntegra de Dilma, uma gestora que não cometeu crime de responsabilidade.
Mas esse protagonismo, essa dedicação corajosa em defesa da presidenta Dilma se deve ao fato de ela ser mulher e pelo quanto de misógino teve o ataque à presidenta Dilma. Foram inaceitáveis, repugnantes, revoltantes os ataques que a presidenta Dilma sofreu por ser mulher nesse período.
Tentaram desumanizá-la em revistas e editoriais da mídia monopolizada, que a trataram com um nível de desqualificação, de ofensa, que viola todo e qualquer direito humano. Então, o golpe parlamentar pelo colégio eleitoral de 81 senadores, dos quais a maioria responde por processos de corrupção, foi um golpe também misógino. Isso revelou, mais ainda, infelizmente, a face conservadora e machista da política brasileira.
Esse protagonismo feminino está se refletindo nas ruas, nos atos em defesa da democracia?
Não tenho nenhuma dúvida disso. A postura da presidenta Dilma, de determinação, de coragem, de ter enfrentado esse processo como ela enfrentou, não baixando a cabeça, indo à luta, resistindo até o último momento, não tenho nenhuma dúvida que inspirou muitas mulheres pelo país afora. A participação das mulheres na luta contra o golpe merece um capítulo a parte. Inspirou a nós, também, a bancada feminina no Senado, e continuará inspirando, de maneira muito forte, muito incentivadora.
Veja bem: trata-se da primeira mulher eleita e reeleita presidenta do Brasil. Então para nós, mulheres, isso é muito forte. Ver, depois de tanta luta, a primeira mulher chegar à presidência da República, ser reeleita e ser vítima de uma infâmia dessa, de uma injustiça dessa, repito, com todo o grau de ataque que houve à figura dela por ser mulher. Então a atitude corajosa dela de resistência e luta nos inspirou e vai continuar inspirando mais ainda, nós, mulheres, a participarmos da luta política e social.
Quais os próximos passos de resistência?
Olha, nós temos que avançar o quanto antes no que diz respeito à resistência contra o golpe. O PT já se posicionou pós-golpe e definiu uma linha oposicionista dura, implacável, determinada. Governo golpista, não merece trégua, muito pelo contrário: merece combatividade. Continuaremos denunciando o golpe, o caráter ilegítimo deste governo, e estamos colocando na ordem do dia as Diretas Já e Nenhum Direito a Menos.
Agora, precisamos organizar a composição com os partidos de esquerda, do campo popular-democrático, mas precisamos ir muito além dos muros do Congresso. Até porque aquele Congresso, sem pressão social, só vai avançar cada vez mais a pauta conservadora.
Precisamos ampliar nossa aliança com a Frente Brasil Popular, a Frente Povo Sem medo, juristas, jornalistas, artistas, intelectuais, juventude e mulheres, numa grande frente com unidade no campo programático para combater a agenda regressiva de retirada de direitos do governo golpista. Porque essa agenda de retirada de direitos é uma ameaça brutal aos direitos e conquistas do povo brasileiro, desde o que foi conquistado na era Getúlio Vargas, passando pela Constituição Cidadã e até os 13 anos de Lula e Dilma.
O golpe acabou invadindo o espaço das eleições municipais. Na sua opinião, as candidaturas por todo o Brasil devem utilizar este momento de debate democrático para também denunciar o golpe?
Não tenho nenhuma dúvida de que devemos associar a agenda de caráter municipal, dos projetos para a cidade, com a realidade que o país enfrenta hoje. Saindo de um golpe com todos os traumas e consequências que isso traz, o país dividido e fraturado. A eleição municipal não é uma ilha. Ela se dá neste momento histórico.
O que estou percebendo, não apenas em Natal, mas no interior do estado, é crescente o sentimento de revolta frente ao ataque à democracia e o sentimento de revolta profunda com aquilo que a população está afirmando que é uma grande injustiça cometida contra a presidenta Dilma, na medida que eles não comungam com isso de foram nenhuma. Quer dizer, um golpe viola a constituição, a democracia, arranca a presidenta eleita de lá e além do mais com o perfil de um Congresso como esse ao qual falta estatura ética e moral. Portanto, sinto por onde vou um sentimento muito forte de repulsa, de indignação, contra o golpe e contra a traição cometida contra Dilma.
Eu acredito na possibilidade de que esse sentimento vai desaguar nas urnas agora no dia 2 de outubro, com votos de protesto contra o golpe sendo revertido para os candidatos do PT ou nos demais candidatos que assumiram posição clara contra o golpe.
Quer dizer, quem se mobiliza mais para tomar ruas são os mais jovens e os militantes de movimentos ou partidos, mas a senhora sentiu que esse sentimento de indignação também está nas casas, entre as famílias.
Exatamente. Aqui em Natal, estive nos bairros populares logo após o impeachment, na sexta, no sábado. E da primeira casa que visitamos até a última, foi um tom só: as pessoas fazendo questão de me cumprimentar pela defesa que fiz da inocência da democracia e da inocência da presidenta Dilma, mas o que mais expressaram foi revolta com relação ao Congresso, com esse perfil, tirar uma presidenta honesta, como eles dizem, que não roubou. As pessoas consideram uma injustiça contra a presidenta Dilma, que é inaceitável ter um presidente que não foi escolhido pelo voto deles, e chamou muito a atenção o sentimento de solidariedade a ela.
Então eu creio que o país não é o mesmo. Não pode ser o mesmo um país depois de ver sua jovem democracia ser brutalmente atacada dessa maneira. A eleição acaba sendo o momento de expressar o seu sentimento, se abstendo, ou dizendo sim, ou dizendo não. Eu estou convencida da ida de Mineiro ao segundo turno aqui em Natal, e nacionalmente, os nossos adversários, que tramaram essa infâmia contra a democracia, vão quebrar a cara. Tenho mais do que esperança, tenho confiança de que o voto de protesto diante do ataque à democracia que foi feito, a criminalização do PT, enfim, acho que esse voto de protesto vai terminar sendo favorável ao PT e aos demais candidatos que foram contra o golpe.
Digo mais: não é só o golpe. A agenda do golpe traz um ingrediente a mais para o processo eleitoral. Ou seja, a reforma da previdência tal como está sendo apresentada, a equiparação da idade de aposentadoria entre homens e mulheres, flexibilizar geral a terceirização, fazer o negociado se sobrepor ao legislado em direitos trabalhistas, e, por fim, a PEC 241, chamada PEC do Estado Mínimo. Essa PEC vai afetar brutalmente os mais pobres, os trabalhadores, porque significa revogar o Plano Nacional da Educação, significa menos atendimento de saúde para a população.
Então a brutalidade do golpe, disfarçado, maquiado pelo rito, mas cujo conteúdo não se sustenta, associada a essa agenda que é uma bomba atômica sobre os direitos e conquistas dos trabalhadores brasileiros, gera reação. Essa agenda regressiva de direitos tem de ser colada na testa dos candidatos que apoiaram publicamente o golpe.
Por isso tenho reiterado aos nossos candidatos a prefeito e vereador que, claro, sem esquecer os projetos para a cidade, que a agenda do golpe tem de ser discutida nas cidades, porque há efeitos nefastos sobre as cidades. Como os prefeitos vão cumprir as metas do Plano Nacional de Educação? Como vão manter o SUS, que precisa de recursos federais? As consequências da agenda golpista são extremamente nefastas.
É bom a gente não esquecer que o golpista não vai querer nunca se assumir como golpista, porque eles têm vergonha da infâmia que fizeram. E não vão querer menos ainda defender a agenda dos golpistas. Tanto que estão chegando ao disparate de simplesmente dizerem que as reformas da previdência e trabalhista não deve ser enviada até 31 de setembro, porque são impopulares e podem influenciar nas eleições. Isso é um insulto à população, porque, na prática, significa estelionato eleitoral. Por isso temos de colocar na testa dos candidatos que apoiaram o golpe a agenda de retirada de direitos.
A senhora comenta sobre o perfil conservador do Congresso, e esse perfil é muito parecido com o perfil das administrações municipais de Natal desde a época da ditadura civil-militar. O que pode significar para a cidade eleger, pela primeira vez em tanto tempo, um governo democrático-popular como o proposto por Fernando Mineiro?
Uma vitória nas eleições teria um significado muito grande para a cidade. Depois da gestão de Djalma Maranhão na década de 1960, uma experiência breve porém bonita, que encantou Natal e o mundo com programas como o combate ao analfabetismo. E foi uma experiência abortada, alias, pela ditadura civil-militar. E, desde então, são muitos e muitos anos de domínio das oligarquias tradicional. A vitória de Mineiro, do PT e do PCdoB, romperia com essa lógica, quebraria paradigmas e traria a Natal, concretamente, a possibilidade de retomar a experiência que vivenciou com Djalma Maranhão. Claro que, adaptado aos tempos que vivemos hoje.
Natal romperia a lógica oligárquica que vem pautando os governos municipais ao longo de todo esse período e deixaria para trás essas administrações que não ousam, que não fazem mais do que o feijão com o arroz. Fernando Mineiro é um profundo conhecedor dos problemas da cidade, pelo grande vereador que ele foi, pelo excelente deputado que é, por ser um estudioso das questões da cidade. Ele está pronto para fazer uma gestão ancorada no diálogo, na participação social e na transparência.
Por Diego Sartorato, de Natal, para a Agência PT de Notícias