João Vicente Caixa D’Água: O que é a desumanidade para nós?

“Eu jamais distribuiria panfletos no velório, de quem quer que fosse, dizendo que já foi tarde, mas alguns de nós fizeram”, diz o advogado no texto

Heinrich Aikawa/ Instituto Lula

Lula e Dona Marisa durante encontro das mulheres e militantes, que marcou os 10 anos da lei Maria da Penha

O que é a desumanidade para nós?
Seríamos feitos da mesma argila? Seguramente que não.
Eu e alguns, com absoluta certeza, não.
Eu não teria coragem de matar um semelhante apertando seu crânio lentamente com um torniquete até que seu olhos saltassem, mas alguns de nós tiveram.
Eu não teria coragem de enfiar um cassetete no ânus de uma pessoa até romper-lhe os intestinos, mas alguns de nós tiveram.
E não teria coragem de enfiar um cassetete na vagina de uma mulher até romper-lhe o útero, mas alguns de nós tiveram.
Eu jamais distribuiria panfletos no velório, de quem quer que fosse, dizendo que já foi tarde, mas alguns de nós fizeram.
Eu seria incapaz de me refestelar com o câncer de quem quer que fosse, alguns de nós refestelaram-se.
Eu não me imagino festejando o derrame cerebral do mais figadal inimigo, mas alguns de nós não titubearam em festejar.
Existe uma parte de nós que é feita do chorume da humanidade, daquele resto de matéria que até o diabo dispensou.
Um parcela de nós constitui-se apenas, e tão somente, do resto da pior parcela de cada ser humano e, portanto, não se pode dizer que possui humanidade.
Ao revés, é justamente feito da inumanidade, da anti-humanidade.
Só da mente sádica dessas abjeções, pode emergir a possibilidade de marcar o julgamento do presidente Lula no mesmo dia em que sua mulher, notoriamente companheira de uma vida inteira, sofreu um AVC.
Eu vi meu pai chorar anos por um pessoa querida que morreu de um AVC, por isso tenho certeza no que digo, eu e eles não somos feitos da mesma argila.

João Vicente Caixa D’Água, advogado

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