Gleisi: Se abandonar Lula for condição para fazer alianças, nós não faremos

“Tem gente que acha que a defesa dele não é a centralidade. Achamos que é, porque o governo Bolsonaro é a destruição do legado que Lula construiu”

Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Gleisi Hoffmann

“Jamais abriremos mão do Lula. Tem gente que acha que a defesa dele não é a centralidade. Achamos que é, porque o governo Bolsonaro é a destruição do legado que Lula construiu”, diz a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidenta nacional do partido, no momento em que a prisão do ex-presidente da República pela operação Lava Jato completa um ano. Para ela, não há como separar a disputa política cotidiana, por exemplo no Congresso Nacional, da luta pela liberdade de Lula.

“Se não considerarmos que Bolsonaro é fruto, primeiro, do golpe contra Dilma e, segundo, que Lula foi preso para que ele ou outro da extrema-direita ganhasse, estamos fazendo uma leitura errada”, diz. “Fazer uma leitura só conjuntural é muito pouco. Se abandonar a luta Lula Livre for uma condição para fazermos uma aliança pontual e conjuntural, nós não faremos.”

No contexto de 7 de abril, ela destaca a Caravana Lula Livre, “uma série de ações continuadas” pela liberdade do ex-presidente, que começou pelo Rio Grande do Sul, passando por Santa Catarina, e chegou ao Paraná no domingo, num ato em frente à Polícia Federal.

A deputada tem feito contundentes denúncias contra a força-tarefa sediada em Curitiba. Na última quinta-feira (4), ela acusou a operação de cometer crimes de lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, organização criminosa e corrupção passiva.

A deputada acusa a força-tarefa de ter atuado com “apoio e orientação do Departamento de Justiça dos Estados Unidos” (DoJ). Ela aponta que, no próximo mês, vai haver um evento em São Paulo que confirma essa afirmação. Dos dias 6 a 8 de maio, em parceria com a Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe), o órgão norte-americano vai bancar um seminário que visa ao treinamento de juízes federais brasileiros.

“Tudo isso mostra que Lula não era um objetivo ao acaso”, diz a deputada.

RBA: Como avalia a situação de Lula e seu futuro um ano depois da prisão, do ponto de vista jurídico e politico?

Gleisi: O que estamos descobrindo sobre os contratos de leniência mostram que tinha uma grande articulação com os Estados Unidos. Primeiro, temos que caracterizar a prisão do Lula, feita num julgamento que não evidenciou provas, e sequer conseguiu tipificar penalmente os crimes cometidos. Lula é um preso político. Nos deixou muito apreensivos o adiamento, tanto dos recursos no STJ, que eram os recursos em relação à condenação pelo TRF4, quanto o julgamento sobre a prisão após segunda instância no STF. Esperávamos que fosse feito agora e conseguíssemos liberar Lula. Não entendemos por que ele continua preso diante de tantas evidências de perseguição e falhas processuais.

Estamos questionando a operação Lava Jato. Vamos entrar com a segunda ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) em relação aos acordos, um relativo à Petrobras, outro à Odebrecht, que mostraram que a Lava Jato foi engendrada com apoio e orientação do Departamento de Justiça americano, que começou em 2009 com treinamento de setores da Justiça Federal e Ministério Público Federal, o que continua. Vemos esses acordos pelos quais empresas brasileiras têm que pagar a investidores americanos e suíços, e 80% volta para o Ministério Público e a Justiça Federal para eles fazerem o que quiserem. Isso é muito grave.

Vai ter mais um treinamento agora, uma capacitação de 6 a 8 de maio em São Paulo, juntando a Ajufe e o Departamento de Justiça americano. Tudo isso mostra que Lula não era um objetivo ao acaso. Foi quem trouxe o pré-sal, deu força aos Brics, à Unasul, mudou as relações políticas e comerciais do Brasil. A ação americana tem tudo a ver com ferir a soberania brasileira.

Ao longo da Operação Lava Jato, o que você destacaria como atos mais graves contra Lula, a começar da condução coercitiva em 4 de março?

A condução coercitiva, que você já falou, as escutas ilegais, que impediram Lula de ser ministro da Dilma, o que foi muito grave. A primeira condenação foi pelo power point (de Deltan Dallagnol). Começa aí.

Politicamente, não foi demorada a decisão de indicar Lula ao ministério de Dilma na época? Essa decisão não deveria ter sido tomada logo no início do governo?

Podemos até fazer avaliações do tempo político. Mas o fato é que era uma indicação de direito da presidente, e de direito de Lula aceitar. Eles não poderiam ter feito uma escuta telefônica e ter vazado isso de forma ilegal, como vazaram. Fizeram uma escuta num prazo superior ao que era liberado nos autos, o que também é muito grave.

Outra coisa foi a delação do Léo Pinheiro, que negociou com seus executivos para corroborar a delação pagando um milhão de reais para cada executivo. Soubemos disso porque um deles não recebeu e entrou na Justiça do Trabalho contra o Léo Pinheiro. Executivos da Odebrecht receberam e estão hoje em casa, para delatar Lula e corroborar a delação do Marcelo Odebrecht. Uma construção odiosa.

Na atual conjuntura, focar a luta no Lula Livre não prejudica um pouco a disputa política contra Bolsonaro no Congresso Nacional?

Jamais abriremos mão do Lula. Tem gente que acha que a defesa do Lula não é a centralidade. Achamos que é, porque o governo Bolsonaro é a destruição do legado que Lula construiu. Ele é a antítese, ele mesmo disse: “eu vim pra desconstruir”. O Lula foi preso para que ele pudesse fazer isso.

Se não considerarmos que Bolsonaro é fruto, primeiro, do golpe contra Dilma e, segundo, que Lula foi preso para que ele ou outro da extrema-direita ganhasse, estamos fazendo uma leitura errada. Fazer uma leitura só conjuntural é muito pouco. Ou a gente faz uma leitura da história recente, entendendo o que se passa no Brasil, ou vamos achar que esse é um governo da normalidade. Não é. Estamos tratando com um governo da destruição dos direitos do povo, das liberdades, da democracia, de extrema direita. Jamais abandonaremos a luta de Lula Livre. Se essa for uma condição para fazermos uma aliança pontual e conjuntural, nós não faremos.

Mas não acho que esta é a condição. Acho que temos condição de fazer alianças por bandeiras, por exemplo contra a reforma da Previdência, o fim dos direitos democráticos, como estamos fazendo, mas não abriremos mão de Lula Livre.

Como avalia a reforma da Previdência na atual conjuntura no Congresso?

A posição do PT é ser contra a totalidade da reforma, fechamos questão. O que a gente vê na casa é que quem defende a reforma não defende como ela está. A maioria que se diz a favor quer mudanças nessa proposta. Isso ficou muito claro na audiência pública com Paulo Guedes. Inclusive, a base deles não estava coesa na defesa da proposta. Fizeram discursos genéricos, mas não têm coragem de defender diretamente o que estão propondo. Acredito que é uma proposta que vai desidratar demais. Vamos ter condições de fazer alianças com diversos setores aqui para enfrentá-la.

Por Rede Brasil Atual

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