Tereza Campello: Os neopreocupados com os pobres
Para a ministra, a defesa da inclusão social e produtiva é sempre bem-vinda. Os palpites, porém, devem ter limites, quando se trata da vida de 14 milhões de famílias.
Publicado em
Os debates sobre o Bolsa Família costumam despertar paixões. Quase todo mundo tem uma opinião a respeito, ainda que não conheça direito como funciona o programa. Prosperam os palpites.
Ao longo de seus mais de dez anos de história, o Bolsa Família tem sido vítima de uma coleção de preconceitos contra os pobres. Ora dizem que as famílias terão mais filhos para ganhar um benefício maior. Ora criticam as famílias pobres por não saberem gastar. Há quem acuse os beneficiários de preguiçosos.
Esses mitos contrariam estatísticas oficiais e estudos científicos. A taxa de fecundidade dos mais pobres caiu mais do que a média nacional. As mães gastam o dinheiro do benefício com alimentos, o que proporcionou queda de 58% da mortalidade infantil causada pela desnutrição.
A maioria dos beneficiários adultos trabalha muito. Se continuam pobres, isso é decorrência da inserção precária no mercado de trabalho. Em busca de melhores oportunidades, beneficiários preencheram, antes do prazo previsto, 1 milhão de vagas em cursos de qualificação profissional do Pronatec, por exemplo. Em outra frente da inclusão produtiva, já se formalizaram 400 mil microempreendedores.
Se o preconceito e a desinformação ainda alimentam mitos, talvez só a ansiedade do momento eleitoral possa explicar o comportamento dos que se apresentam agora como neodefensores dos pobres. Em época de eleição, são raros os políticos que falam mal do Bolsa Família. Mas muitos tentam pegar carona nos êxitos do programa falando absurdos.
Aqui neste “Tendências/Debates”, o líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Antonio Imbassahy (“Leviandade?”, 20/5), defendeu que os benefícios do Bolsa Família fossem corrigidos pela cotação do dólar, sujeitando a política pública às flutuações de mercado da moeda norte-americana.
O deputado e seu partido não entenderam que a linha de extrema pobreza do país foi definida em R$ 70, em junho de 2011, com base no parâmetro internacional usado pelas Nações Unidas: o poder de compra de US$ 1,25 diário por pessoa nos diferentes países. É a chamada paridade de poder de compra, diferente da simples conversão ao câmbio do dia.
A presidenta Dilma Rousseff usou o mesmo critério ao atualizar a linha de extrema pobreza e os benefícios do Bolsa Família, em anúncio feito na véspera do 1º de Maio.
Nos últimos três anos, inovações no Bolsa Família garantiram reajuste de 44% acima da inflação para o benefício médio do programa. Ele passará a R$ 167 mensais por família, em junho. Mais importante: foi garantido que nenhuma família vivesse com menos de R$ 70 mensais por pessoa, consideradas a renda familiar e a complementação do benefício. Esse valor passa, também em junho, para R$ 77.
Ao longo de três anos, seis mudanças foram implementadas e a oposição não se manifestou. Por que só se manifestam agora os neopreocupados com os pobres?
No terceiro ano do plano Brasil Sem Miséria, o país é a maior referência mundial em políticas de combate à pobreza e à desigualdade. Com os resultados obtidos até aqui, estamos a um passo de superar a extrema pobreza. Mas o fim da miséria é só um começo. Além de renda e emprego, trabalhamos por melhor qualidade de vida para todos.
A defesa da inclusão social e produtiva é sempre bem-vinda. Os palpites, porém, devem ter limites, quando se trata da vida de 14 milhões de famílias. Há de se ter responsabilidade quando o tema é o Bolsa Família.
Tereza Campello é ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(Artigo originalmente publicado na Folha de S. Paulo)