Na contramão, deputados discutem liberar até nove armas por pessoa

Enquanto deputados propõem maior circulação de armas de fogo, ONU homenageia Secretária de Estado por trabalho de cultura de não violência

Está em discussão na Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização, o projeto de lei 3722/2012, que altera o Estatuto do Desarmamento (lei nº 10.826/2003) e possibilita cidadãos comuns possuírem até nove armas de fogo e adquirirem 50 projéteis por mês.

A segunda audiência pública para discussão da proposta, de autoria do deputado Rogério Peninha (PMDB-SC), aconteceu nesta quarta-feira. O relator da proposta, o deputado Cláudio Cajado (DEM-BA), deve concluir seu relatório e encaminhá-lo ao plenário até o dia 10 de dezembro. Procurado pela reportagem, a assessoria do relator informou que o deputado não daria declaração antes de finalizar o documento.

Segundo  Peninha, a aprovação da proposta se justifica porque a produção de armas no Brasil caiu em 90%, na mesma proporção em que a criminalidade não parou de crescer.

“Não queremos armar ninguém, apenas dar a liberdade para a população decidir se quer ou não se armar”, afirmou o deputado

Quanto ao número de armas que uma pessoa poderá vir a ter, caso seja aprovado o projeto, o deputado concordou que foi uma estimativa sem estudos comprobatórios, mas que, segundo ele, aumenta a segurança.

“É um número de armas para a pessoa ter durante uma vida, mas o relator está revisando essa quantidade para baixo”, afirma o deputado.

Peninha não espera a aprovação ainda este ano. Além de os deputados caminharem para o fim da legislatura a proposta tem uma tramitação longa no parlamento e, caso supere essas fases, será submetido à sanção da presidencial.

“É difícil  (a aprovação) porque a inclinação da presidenta Dilma é vetar”, disse o deputado.

Para o Diretor Executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques o projeto não é um substitutivo, mas a total revogação do Estatuto do Desarmamento além de cancelar projeto de segurança pública com controle de circulação de armas. Para ele, é natural que a produção de armas tenha diminuído.

“O controle da venda de bebidas e de cigarro representou uma redução na comercialização desses produtos, e deveria ser assim mesmo”, afirmou Marques.

Para o diretor, a aprovação do projeto é um retrocesso de 10 anos na queda dos índices de mortes por armas de fogo. O controle estabelecido pelo Estatuto do Desarmamento reduziu a circulação de armas de fogo e, desde 2004, 120 mil mortes foram evitadas.

“No primeiro ano da aprovação do estatuto, a taxa de homicídios com armas de fogo diminuiu 12%”, conta Marques.

Recente estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) revela que o Brasil está ente os 25 países mais violentos do mundo. Ele contribui com 10% da violência no planeta. Segundo o Instituto Sou da Paz, 70% dessas mortes acontecem por armas de fogo.

“E mais da metade dessas mortes é por motivo fútil, como briga de bar, de trânsito, ou entre casais”, conta Marques.

Cultura da paz – Em sentido oposto à proposta de Peninha seguem algumas mulheres brasileiras. Seis delas são referência mundial na construção da cultura da paz. O trabalho que desenvolveram foi publicado numa edição especial pelo Dia Mundial de Eliminação da Violência Contra a Mulher, da ONU.

Uma delas é a secretária Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, Regina Miki. Ela é membro do Fórum Metropolitano de Segurança Pública, integrante do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional da População em Situação de Rua e do Comitê de Acompanhamento e Monitoramento do Plano Nacional de Direitos Humanos, ambos da Presidência da República.

Para Regina, o principal obstáculo na luta em defesa pela eliminação da violência contra a mulher, é o de desconstruir a cultura de posse que o homem tem sobre a mulher, como se ela fosse uma propriedade sua.

“O casamento a torna uma cidadã de segunda categoria e subordinada a alguém. Mudar esse conceito é o mais difícil”, conta Regina.

A secretária aponta como avanços o empoderamento que as mulheres conquistaram nos últimos 12 anos, com as políticas afirmativas de gênero. Segundo Regina, uma das principais é o estabelecimento da Lei Maria da Penha.

“Um aparato legal à disposição da mulher para ela se sentir protegida pelo estado”, afirma a Secretária.

A Secretária se diz preocupada com a possibilidade da aprovação do PL 3722, uma vez que as três esferas do Executivo buscam alternativas nos governos dos estados e dois municípios para baixar os índices de violência.

“Abrir mão do estatuto do desarmamento, que vem sendo copiado por outros países, é muito triste”, afirma Regina.

Por Guilherme Ferreira, da Agência PT de Notícias

PT Cast