Armamentismo de Bolsonaro impediu queda maior das taxas de homicídio, aponta pesquisa

Fórum Brasileiro de Segurança Pública diz que o país teria 6,3 mil assassinatos a menos entre 2019 e 2021 se não houvesse aumento da circulação de armas

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Entre 2019 e 2021, estados com maior aumento na demanda por armas de fogo registraram menores diminuições nas taxas de homicídio

A expansão armamentista estimulada pelo governo passado impediu que o Brasil tivesse uma redução maior nas taxas de homicídios entre 2019 e 2021. Nesse período, o país poderia ter registrado 6.379 assassinatos a menos se não tivesse ocorrido o aumento da circulação de armas de fogo. Os dados são da pesquisa “Armas de fogo e homicídios no Brasil”, realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

O estudo teve o objetivo de investigar se era factível o discurso de Jair Bolsonaro de que a posse de armas garante mais proteção e segurança aos “cidadãos de bem”. Para tanto, foi analisado se esse argumento estava por trás da continuidade da redução anual das taxas de homicídio, iniciada em 2018 após o recorde histórico de 2017, quando o índice foi de 30,9 por 100 mil habitantes. Em 2021, a taxa havia caído para 22,3.

O FBSP observa que, embora a redução dos níveis de homicídio seja motivo de comemoração, o Brasil ainda convive com um cenário de violência extrema, assumindo o oitavo lugar entre as nações mais violentas do mundo, conforme o ranking do Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crime (UNODC), que analisou dados de 102 países, em 2020.

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Em uma das linhas de investigação, a pesquisa do fórum verificou que, nas localidades onde Bolsonaro obteve mais votos válidos na eleição presidencial de 2018, a demanda por armas já era mais forte antes mesmo do pleito, o que revelou um alinhamento ideológico. A partir de 2019, como o custo econômico da posse de armas diminuiu significativamente no país, mesmo em estados com menores motivações armamentistas a demanda por armas também aumentou.

Em outra frente, o FBSP constatou que, entre 2019 e 2021, as unidades da federação com maior aumento na demanda por armas de fogo foram justamente aquelas que registraram menores diminuições nas taxas de homicídio. “Estimamos que se não houvesse o aumento de armas de fogo em circulação a partir de 2019, teria havido 6.379 homicídios a menos no Brasil. Esse número equivale a todos os homicídios na Região Norte do País em 2021, ou a mais do que todos os homicídios nos estados da Região Sul nesse ano”, diz a pesquisa.

O estudo traduziu em números a associação entre o armamentismo e as taxas de homicídio: a cada 1% a mais na difusão de armas, há aumento de 1,1% na taxa de homicídio. A conclusão do FBSP é que se não tivesse havido a atuação de outros fatores no sentido de diminuir a letalidade a taxa de mortes teria aumentado. Os fatores citados na pesquisa como causas da queda das taxas de homicídio são a mudança no regime demográfico, com a redução dos jovens na pirâmide etária, a implementação de políticas efetivas de segurança pública em alguns estados e o armistício na guerra entre duas das maiores facções criminosas a partir de 2018.

O documento acrescenta que “como essa maré fortemente a favor da diminuição do crime violento letal ocorreu, o aumento da difusão das armas terminou por impedir, ou frear uma queda ainda maior das mortes”.

Já no caso do latrocínio – roubo seguido de morte – o FBSP concluiu que, a cada 1% de crescimento da circulação de armas, a taxa desse tipo de crime aumenta 1,2%.

“Possivelmente, tal resultado pode ser explicado pela comunicação entre os mercados legais e ilegais de armas de fogo. Afinal sabemos que quanto mais armas no mercado legal, mais armas migrarão para o mercado ilegal – via extravios, roubos e ação premeditada de seus proprietários – fazendo com que o preço da arma diminua no mercado ilegal”, diz o levantamento. “A minoração do preço dessas armas no mercado ilegal dá acesso aos criminosos mais desorganizados, que com uma arma na mão saem às ruas para praticar assaltos e terminam cometendo latrocínio”.

O documento afirma que “esses resultados refutam o argumento de que mais armas de fogo teriam contribuído para redução dos homicídios no Brasil”. Acrescenta que, “ao contrário, a ampliação da quantidade de armas impediu uma queda ainda maior da letalidade violenta, o que lastreia a necessidade urgente de uma revisão geral na legislação armamentista no próximo governo, com a revogação total de todos os dispositivos infralegais sancionados a partir de 2019” – providências já adotadas pelo governo do presidente Lula.

“Adicionalmente, a revisão legal deveria aprofundar o espírito contido no Estatuto do Desarmamento, com ajustes para aprimorar o controle responsável de arma de fogo e munição no Brasil e a vedação total de registros de colecionadores de armas de fogo, entre outros elementos”, recomenda o FBSP.

Pressão sobre o SUS

O Ministério da Saúde informou que, de 2019 a 2022, o Brasil registrou 136.760 óbitos com uso de arma de fogo, dos quais 125.783 foram homicídios. Os suicídios com arma de fogo foram responsáveis por 3.931 óbitos. Entre as outras causas externas de lesões acidentais foram registrados 1.002 óbitos, e os eventos cuja intenção é indeterminada representaram 6.044. Divididos por ano, foram 34.109 óbitos por arma de fogo em 2019; 36.401 em 2020; 35.217 em 2021; 31.033 em 2022 – os dados do ano passado são preliminares e estão sujeitos a alterações.

Os números do ministério mostram também que os ferimentos por armas de fogo pressionam a rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Foram 18.043 internações em 2019; 17.363 em 2020; 18.189 em 2021; 17.810 em 2022.

Da Redação

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