Agronegócio tenta aprovar projeto irresponsável contra a previdência
Vice-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária, deputada Tereza Cristina propõe que Congresso aumente benefícios concedidos a grandes produtores e empresas devedoras do Funrural em troca de votos para barrar as denúncias contra Temer
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A bancada do agronegócio e seus parceiros na base do governo pretendem aprovar nesta segunda-feira (6/11), em comissão de deputados (os) e senadores (as), proposta que a assessoria técnica da bancada do PT na Câmara classifica como indecorosa e irresponsável. É o projeto da vice-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária, deputada Tereza Cristina (sem partido/MS), que altera a Medida Provisória 793 editada pelo governo para beneficiar os grandes produtores e as empresas devedoras ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural).
Instituída em troca de votos dos ruralistas para arquivar as denúncias da Procuradoria-Geral da República contra o presidente Michel Temer, a MP criou o Programa de Regularização Tributária Rural facilitando o pagamento de dívidas com a Previdência em até 176 parcelas. A proposta da deputada, que é relatora da MP, aumenta as facilidades para a quitação das dívidas, estimadas em R$ 18 bilhões.
A Agência Câmara Notícias expõe algumas das mudanças desejadas pelos ruralistas na MP, que perderá validade caso não seja aprovada pelos plenários da Câmara e do Senado até o dia 28 de novembro:
a) de acordo com a MP, quem aderir ao programa deve pagar pelo menos 4% da dívida consolidada em até quatro parcelas mensais e liquidar o restante em até 176 meses. A relatora propõe que o devedor pague entrada de 1% do total da dívida.
b) Além de permitir o parcelamento, a MP reduz de 2% para 1,2% a alíquota da contribuição do empregador rural pessoa física e do segurado especial. A deputada estende o benefício ao empregador rural pessoa jurídica: redução de 2,5% para 1,2%. Para a agroindústria, a alíquota permanece em 2,5%.
c) A deputada Tereza Cristina ainda estende o parcelamento às cooperativas; amplia o prazo de adesão ao programa de 29 de setembro para 20 de dezembro de 2017; e acaba com as multas aos devedores. De acordo com a MP 793, eles terão desconto de 25%. A relatora propõe anistia total.
Parecer assinado por Gerson Teixeira, assessor da liderança do PT na Câmara, o projeto da deputada Tereza Cristina “é emblemático da ousadia e da irresponsabilidade dos ruralistas na defesa dos interesses do agronegócio à revelia do interesse público. Além de caracterizar um exercício ostensivo e sem limites de redução das dívidas junto à seguridade, promove uma ‘mini reforma’ da previdência para eximir ou reduzir as obrigações pecuniárias de agricultores e empresas rurais; em especial, das maiores”.
O parecer técnico analisa 18 alterações que a deputada Tereza Cristina quer fazer na Medida Provisória 793 – todas para desobrigar produtores e empresas de responsabilidades com a seguridade social. E recomenda aos petistas que votem contra 12 propostas.
Leia, a seguir, o parecer produzido para a bancada do PT:
CÂMARA DOS DEPUTADOS
LIDERANÇA DO PARTIDO DOS TRABALHADORES
Assessoria Técnica
MEDIDA PROVISÓRIA Nº 793 DE 2017
PARECER SOBRE O PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO
PROPOSTO PELA RELATORA
Gerson Teixeira
Brasília, 04/11/2017
Resumo
A Medida Provisória em referência criou o PRR – Programa de Regularização Tributária Rural (PRR) junto à RFB e à PGFN, para o pagamento em 176 parcelas mensais, com níveis elevados de subvenções, das dívidas junto à seguridade acumuladas por agricultores e adquirentes da produção rural desde 2010 (estimativa de R$ 18 bilhões).
A MPV também reduz, a partir de 1º de janeiro de 2018, a alíquota da contribuição para a seguridade social por parte dos produtores rurais pessoas físicas, de 2% para 1.2% sobre a comercialização dos produtos.
O PLV proposto pela Relatora é emblemático da ousadia e irresponsabilidade dos ruralistas na defesa dos interesses do agronegócio à revelia do interesse público. Além de caracterizar um exercício ostensivo e sem limites de redução das dívidas junto à seguridade a serem renegociadas no âmbito do PRR, o PLV promove uma ‘mini reforma’ da previdência. Não na perspectiva da sustentabilidade e da busca de parâmetros de justiça para o sistema, mas
para eximir ou reduzir as obrigações pecuniárias de agricultores e empresas
rurais; em especial, das maiores.
Como exemplo, não satisfeita com a redução de 40% nas contribuições dos produtores pessoas físicas conforme fixado pela MPV, a Relatora propõe a redução em 52%, a partir de 1º de janeiro de 2018, da alíquota da contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à atividade rural. Portanto, redução maior que a prevista para o segurado especial.
Também propõe que as empresas com dívidas até R$ 15 milhões paguem as suas parcelas no PRR em valores equivalentes a 0.3% da média mensal da receita bruta da comercialização. A MPV fixa os pagamentos, pelos produtores pessoas físicas, em 0.8%; o que já foi uma imoralidade.
Recomendamos o voto contrário ao PLV sugerindo destaques.
(….)
Vale recordar que a MPV 793 foi publicada na véspera da Sessão da Câmara que rejeitou a autorização para o STF investigar a 1ª denúncia do Procurador da República contra o presidente Temer, foi publicada a Medida Provisória em referência;
As alterações processadas pela Relatora:
A) O PRR contempla os adquirentes da produção rural. A Relatora critica a não explicitação das cooperativas. Ora, é claro que enquanto adquirentes da produção rural as cooperativas estariam plenamente incluídas entre os beneficiários do PRR. Ainda assim, não haveria problema em explicitar o alcance do PRR às cooperativas. Contudo, na redação dada para tal, no Art. 3º, caput, do PLV, deliberadamente, ou não, a Relatora finda criando uma armadilha. Abre a possibilidade de enquadramento no PRR de dívidas das cooperativas, junto à seguridade, por razões estranhas ao recolhimento por ocasião da aquisição da produção rural. Observem a redação dada ao Art. 3º: “O adquirente de produção rural ou a cooperativa que aderir ao PRR poderá: ………………………………….” (grifamos).
No texto, a figura da cooperativa não está incluída na categoria de adquirente de produção. Se a intenção fosse a de somente explicitar as cooperativas entre os adquirentes de produção rural, a redação adequada seria: “Art. 3º: O adquirente de produção rural, incluindo a cooperativa, que aderir ao PRR poderá….” Assim na forma colocada a cooperativa pode aderir ao PRR tanto por dívidas nas operações de aquisição como por razões de outra natureza. Recomendamos mudança no texto conforme colocado;
B) O texto original da MPV permitiu a inclusão de débitos vencidos até 30 de abril de 2017. A Relatora estendeu esse prazo até 30 de agosto de 2017. Em defesa da mudança a Relatora alegou as “…demasiadas incertezas quanto aos efeitos da decisão do STF no RE nº 718.874…”. O dia 30 de agosto foi último dia do mês de publicação do acórdão naquele processo. Sugerimos posicionamento favorável. (Art. 1º §1º)
C) Nos termos originais da MPV a adesão ao parcelamento da dívida seria até 29 de setembro de 2017. A Medida Provisória n° 803/2017 estendeu o prazo para até 30 de novembro de 2017. A Relatora pretende nova mudança no prazo de adesão para até 20 de dezembro de 2017. Ainda que abusiva a nova proposta de prazo, podemos apoiá-la para endurecer contra outros
dispositivos com efeitos negativos mais substanciais; (Art. 1º, §2º)
D) De acordo com o art. 1º, § 3º, da Medida Provisória, ao aderir ao PRR, o sujeito passivo confessa de forma irrevogável e irretratável os débitos por ele indicados para compor o PRR. A Relatora resolveu flexibilizar os efeitos da confissão à medida que poderá haver decisão judicial sobre a ilegitimidade decobrança dos débitos confessados. A justificativa utilizada para tal flexibilização não procede posto que havendo decisão judicial em sentido contrário ao disposto pela Lei obviamente prevalecerá a decisão judicial. Na verdade a Relatora pretende mesmo aliviar a assunção da dívida com a adesão ao PRR.
Recomendamos contra essa alteração – supressão do §4º do Art. 1º;
E) Pelo texto original da MPV, ao aderir ao PRR o produtor rural pessoa física ou o adquirente de produção rural deve pagar, no mínimo, 4% do valor da dívida consolidada, em até quatro parcelas. Acolhendo proposição em massa dos seus pares ruralistas, a Relatora considera elevada essa taxa e a reduz para 1%. Trata-se de mudança inaceitável para quem terá, inclusive, a redução da alíquota de contribuição para a seguridade. (Art. 2 º, I; Art. 3º, I
e § 2º, I);
F) A MPV prevê redução de 25% nas multas de mora e de ofício e dos encargos legais, incluídos honorários advocatícios. A Relatora, de novo acolhendo as Emendas dos ruralistas propõe a redução de 100%. Vale sempre lembrar que os maiores beneficiários do PRR são os adquirentes da produção, com destaque para as grandes tradings. Recomendamos o voto contra a eliminação das multas e dos encargos legais em decorrência da dívida e pela
manutenção do texto original (Art. 2º, II, a) e (Art. 3º, § 2º, II, a);
G) A Relatora altera os Art. 2º, §3º e Art. 3º,§4º para possibilitar o pagamento em até 60 parcelas, com os descontos antes mencionados, de eventuais resíduos após o pagamento as 176 parcelas do PRR. Pela MPV, nesses casos, existe a possibilidade do parcelamento, mas sem os descontos.
Mais uma benesse exigida pelos ruralistas. Recomendamos o voto contrário.
H) O texto original da MPV prevê o pagamento de parcelas mensais tanto por produtores rurais quanto pelos adquirentes, com base na receita média com a comercialização do ano anterior. A Relatora alega que o fluxo de caixa no campo não observa necessariamente a periodicidade mensal. Por essa razão propõe o adiantamento de parcelas dentro de um mesmo mês para a amortização de parcelas subsequentes, e não das últimas parcelas do
parcelamento, como costuma ocorrer nas regulamentações de outros parcelamentos especiais feitas pela PGFN e pela RFB. Consideramos a proposta razoável para os agricultores. (Art. 2º, §5º). Mas não se aplica aos adquirentes. Contra (Art. 3º, § 7º);
I) O PLV altera o Art. 3º, §2º, II, da MPV, para beneficiar os adquirentes da produção rural com dívida total, sem reduções, igual ou inferior a R$ 15.000.000,00. Propõe que essas empresas paguem parcelas em valores equivalentes a 0.3% da média mensal da receita bruta da comercialização, quando a MPV determina 0.8%. Uma redução de 62.5% para empresas, mantendo em 0.8% para os agricultores pessoas físicas Uma imoralidade que não deve ser permitida.
J) Pelo Art. 4º da MPV dependerá da apresentação de carta de fiança ou seguro garantia judicial, as operações quando se tratar de valor igual ou superior a quinze milhões de reais. A Relatora altera este dispositivo para fixar que o parcelamento de débitos tanto para produtores quanto para adquirentes não requer a apresentação de garantia. Mais um privilégio, em especial, para as empresas adquirentes. Contra.
K) Em mais um benefício, a Relatora altera o prazo para a comprovação do pedido de desistência ou renuncia de ações judiciais, para 30 de dezembro de 2017, quando a MPV 803 já havia alterado o prazo de 29/09/2017 para 30/11/2017. Entre os benefícios, este é um dos menores, portanto, aceitável, no limite. (Art. 5º, §2º);
L) De acordo com a Medida Provisória, mesmo após a apresentação de desistência ou renúncia pelo produtor rural ou adquirente nas ações por estes ajuizadas, serão devidos honorários advocatícios. Em tais situações a Relatora exime o autor da ação do pagamento dos honorários advocatícios. A medida facilita a adesão ao PRR. (Art. 5º, caput);
M) A Relatora inclui no PLV a possibilidade de os devedores com dívida total de até
quinze milhões de reais possam liquidar o saldo consolidado com a utilização de
créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, apurados até 31 de
dezembro de 2015 e declarados até 29 de julho de 2016. Não se inclui entre as
maiores aberrações. (Art. 8º)
N) A MPV determina a exclusão do devedor do PRR nas situações de falta de pagamento de três parcelas consecutivas ou seis alternadas. A Relatora excetua a falta de pagamento, pelos produtores, decorrentes da quebra de safra em razão de situações edafoclimáticas motivadas por situação de emergência ou estado de calamidade pública devidamente reconhecido pelo
Poder Executivo federal.
A medida parece justa; contudo, e lembrando que estamos tratando de grandes produtores, é impensável que os mesmos não tenham contratado o seguro rural. Orientamos contra (Art. 9º, §1º);
O) Simplesmente a Relatora resolveu reduzir de 2.5% para 1.2% (sobre a comercialização) a alíquota da contribuição dos produtores rurais pessoas jurídicas. Uma redução de 52%; bem maior do que a redução para o segurado especial que foi de 40%, e assim agregando mais um ponto escandaloso no seu PLV (Art. 14). Contra.
P) Na sua lista de bondades, no Art. 13 do PLV a Relatora propõe modificação no Art. 25, da Lei nº 8.212, de 1991, para fixar que não integra a base de cálculo da contribuição para a seguridade, a produção rural destinada ao plantio ou reflorestamento, nem sobre o produto animal destinado a reprodução ou criação pecuária ou granjeira, e a utilização como cobaias para fins de pesquisas científicas, quando vendido pelo próprio produtor e, quem a utilize diretamente com essas finalidades. E, no caso de produto vegetal, por pessoa ou entidade que, registrada no Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária (SIC), se dedique ao comércio de sementes e mudas no País. A Justificativa é impedir a cobrança nas
operações entre produtores. Trata-se de matéria estranha à MPV, e portanto, ao
PRR. Pela rejeição da proposta;
Q) O PLV altera o art. 22, da Lei nº 8.212, de 1991, e o art. 25 da Lei nº 8.870/1994, para estabelecer a opção de o produtor rural recolher a contribuição sobre a folha de salários ou sobre a receita bruta. A despeito do mérito, trata-se de matéria estranha ao PRR; portanto, opinamos contrariamente. (Art. 13)
R) Por meio do Art. 15, incluiu Parágrafo único, com as letras ‘a’ e ‘b’ ao Art. 6º da Lei nº 9.528, de 1997, para permitir o recolhimento da contribuição ao SENAR pelo adquirente, consignatário ou cooperativa que ficam subrogados para essa finalidade nas obrigações do produtor rural pessoa física e do segurado especial; e pelo próprio produtor pessoa física e pelo segurado especial quando comercializar sua produção com adquirente no exterior, outro produtor pessoa física ou diretamente no varejo, ao consumidor pessoa física. De novo trata-se de matéria estranha ao REFIS RURAL previsto pela MPV. Recomendamos o voto contrário.
Além das mudanças comentadas acima, a Relatora acrescenta outras modificações na MPV sempre no sentido da desobrigação de responsabilidades dos produtores e empresas para com a seguridade social, a exemplo da aplicação de desconto sobre multas isoladas, previstas no art. 44,II, da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996.