CNQ: Fator Acidentário de Prevenção não pode ser modificado sem ampla discussão
A CNQ tem participado nacionalmente das discussões sobre o FAP – Fator Acidentário de Prevenção para se inteirar, discutir e manifestar a opinião das lideranças do ramo químico da CUT a respeito…
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A CNQ tem participado nacionalmente das discussões sobre o FAP – Fator Acidentário de Prevenção para se inteirar, discutir e manifestar a opinião das lideranças do ramo químico da CUT a respeito do tema, que é muito importante para todos os trabalhadores que representamos.
Trata-se de um assunto complexo, de difícil entendimento pelos trabalhadores, e acima de tudo guardado a sete chaves em nome de uma confidencialidade fiscal injustificável e da qual discordamos.
De forma simplificada, podemos dizer que o FAP é uma metodologia criada para reduzir (bônus) ou majorar (malus) as alíquotas, que conforme o ramo de atividades pode ser de 1%, 2% e 3% e incidem sobre a remuneração paga pelas empresas a seus trabalhadores. Esse recolhimento serve para o financiamento do Seguro Acidente do Trabalho -SAT. O FAP pode reduzir essas alíquotas pela metade, ou duplicá-las, em razão do desempenho que cada empresa tem no cuidado do seu meio ambiente do trabalho e da saúde e segurança de seus trabalhadores.
Entendemos como importante estimular as empresas que investem em segurança com um pagamento de alíquota mais baixa, assim como de se onerar aquelas que não investem. O grande problema é saber como isso funciona, pois o relacionamento do FAP acontece somente entre empresas e governo. Aliado a essa caixa preta, convivemos ainda com um forte lobby das empresas que pressiona o Ministério da Previdência para mudar o Fator, logicamente buscando vantagens.
Não se sabe o que se passa nesse relacionamento entre governo e empresas. Não se consegue dados de nenhum grupo econômico quanto a Bônus ou Malus. Convivemos diuturnamente com subnotificações de acidentes e adoecimentos. É um verdadeiro silêncio epidemiológico, por isso aceitar as polêmicas propostas que estão sendo apresentadas pela Previdência Social, no atual momento, é regredirmos.
É preciso o aperfeiçoamento do que já temos, e avançarmos para um patamar de transparência e compreensão de todos os envolvidos. Portanto, não aceitamos as propostas de modificações que temos em mãos sem uma ampla discussão.
A CNQ tem se pautado em discutir o tema na sua integralidade, mas acima de tudo tem colocado suas expectativas quanto ao acesso às informações, direito em conhecer o que hoje é compartilhado só pelo governo e empresas. Posição balizada pela contribuição da análise do epidemiologista Dr. Heleno Rodrigues Corrêa Filho que, em artigo reproduzido abaixo, traz à luz as interpretações legais, mostrando que não há justificativa para as negativas do Governo quanto a permitir a abertura da caixa preta criada, pelo contrário. A lei trata sigilo de informações de natureza financeira e fiscal. No caso das informações de ordem epidemiológica e de saúde, a Lei possibilita a não aplicação da regra do segredo em casos de interesse da administração pública.
Antonio Goulart – Secretaria Saúde do Trabalhador – CNQ-CUT
Pela divulgação dos nomes das empresas com maior número de lesões e mortes no trabalho
Por Heleno Rodrigues Corrêa Filho (*)
Vem ocorrendo contestação crescente à negativa de instituições de governo em permitir que secretários de saúde, profissionais de saúde encarregados da vigilância epidemiológica, e mesmo sindicalistas e membros de Conselhos de Saúde tenham acesso à informação sobre quais empresas identificadas por seus endereços e CNPJ causam acidentes e doenças que geram benefícios por doença e morte junto à Previdência Social. Alegam que existiria obrigação de segredo devida à lei que instituiu o Código Tributário Nacional em contraposição às determinações da Constituição Federal de 1988 e à Lei Complementar 8.080 que instituiu o Sistema Único de Saúde do Brasil (1-3).
É importante a divulgação dos índices de acidentes do trabalho, de benefícios previdenciários e das taxas de acidentalidade em relação aos tributos do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) bem como a identificação das empresas que mostram maior número de casos de lesões e mortes pelo trabalho, como instrumento de controle social sobre a economia e a geração de doenças e mortes de trabalhadores.
A ação de prevenção por parte do SUS e dos Ministério do Trabalho, e também da ação sindical em defesa dos trabalhadores, depende do conhecimento dessas empresas mais comprometidas e responsáveis por maior risco aos trabalhadores e ao ambiente.
Como são dados de natureza epidemiológica não há violação de segredo fiscal que fale de montante de capital investido ou de giro, não divulgam políticas de investimento ou áreas de gastos empresariais, não comprometem totais de tributos nem revelam situação financeira de nenhuma empresa. Grandes empresas com imensos capitais podem estar com índices iguais aos de empresas médias.
Para justificar a liberdade de acesso a informações provenientes de bases de dados governamentais temos a Lei de Acesso à Informação (4). Não há nenhum instrumento legal de ordem Constitucional ou de Lei Complementar que negue, baseado em argumentos tributários ou fiscais, a aplicação dos artigos 196 a 200 da Constituição Federal de 1988 (3).
A Lei Complementar Orgânica que instituiu o Sistema Único de Saúde – SUS – estabelece como devem ser cumpridas as obrigações relativas à Saúde do Trabalhador compreendendo a vigilância à saúde nos ambientes de trabalho (1).
Os argumentos de que a “tradição” da Fazenda Nacional é de não divulgar dados FISCAIS é válido para informações de natureza financeira e fiscal nos termos do artigo 198 do Código Tributário Nacional. Este Código apenas define que é considerada sob sigilo a “informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades”.
No caso das informações de ordem epidemiológica e de saúde, a Lei, muito pelo contrário à determinação de segredo destaca que há condições previsíveis em que não se aplica regra de segredo em casos de interesse da administração pública no parágrafo 199 (2). Ninguém é obrigado a fazer nada que a lei não manda e nem pode ser punido por aquilo que a lei não proíbe. Aí é que está o fato. Não existe proibição. Ela foi inventada como tradição fiscalista por que não está no texto da lei.
‘“Art. 198.Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada
a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de
informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou
financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o
Estado de seus negócios ou atividades. ”
“§ 1º Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos
no art. 199, os seguintes: ”
“I – Requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça; ”
“II – Solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública,
desde que seja comprovada a instauração regular de
processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o
objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação,
por prática de infração administrativa. ”
“§ 2º O intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração
Pública, será realizado mediante processo regularmente instaurado, e
a entrega será feita pessoalmente à autoridade solicitante, mediante
recibo, que formalize a transferência e assegure a preservação do sigilo. ”
Por esse motivo as autoridades de Saúde Pública têm direito à informação identificada completa em variáveis de micro dados brutos sobre doenças, lesões, comunicações de acidentes, mortes e índices acidentários e multiplicadores tributários como o FAP, registrados nas bases oficiais do Sistema de Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM), do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Emprego (CAGED); e do Sistema Único de Benefícios do Ministério da Previdência Social (SUIBE) bem como a listagem do fator multiplicador do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) por CNPJ ou Empresa.
No caso de informações com dados identificadores individuais os requerentes deverão ser autoridades sanitárias com obrigação de sigilo sobre dados pessoais embora tenham acesso aos mesmos para fins de vigilância epidemiológica e previdenciária. É o caso de Ministro e Secretários de Saúde de Estados e Municípios, além dos profissionais de saúde que são obrigados por lei ao resguardo do sigilo profissional.
No caso de informações brutas não consolidadas em tabelas elas deverão ser distribuídas a entidades civis como sindicatos, órgãos de análise econômica e social, SEM IDENTIFICADORES individuais, mas com todos os demais dados brutos. Para ser divulgada a base de dados completa, deverão ter apagados ou substituídos os identificadores pessoais por códigos conhecidos apenas pelos emitentes das bases de micro dados, resguardando a manipulação de informações pessoais por terceiros não obrigados ao segredo profissional.
Bastaria, portanto, que organizações sindicais requeressem com base na Constituição e nas Leis o direito de receber e acompanhar as informações com conhecimento por CNPJ de todas as informações de natureza epidemiológica e sanitária nas bases mencionadas. Assim seria possível desfazer a cultura de Segredo Governamental sobre dados de Saúde, Doença e Morte.
Referências:
1. BRASIL. LEI – 8080 de 19/09/1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências.1990 20/09/1990; 2009(14 outubro de 2009):[DOFC – Diário Oficial da União PUB 20/09/1990 – pagina 18055 coluna 1, pp.]. Available from: http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaNormas.action?tipo_norma=LEI&numero=008080&data=&SUBMIT1=Pesquisar
2. BRASIL – Congresso Nacional. Codigo Tributário Nacional – Lei Complementar Nº 5.172, DE 25/10/1966, DOU DE 27/10/1966 – emendada pela Lei Complementar Nº 104, 10/01/2011, (1966-2001) [cited 12/08/2015]. Available from: http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496301/000958177.pdf?sequence=1
3. BRASIL. Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988 Brasilia: Congresso Nacional; 1988 [cited 2009 14 outubro de 2009]. Meio digital eletrônico]. Available from: http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/const/ ; http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_07.05.2015/index.shtm
4. BRASIL – Congresso Nacional. LEI Nº 12.527, DE 18 DE NOVEMBRO DE 2011 – Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3o do art. 37 e no § 2o do art. 216 da Constituição Federal. 12527 [Internet]. 2011 24/08/2014; 12.527. Available from: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12527.htm
(*) Heleno Rodrigues Corrêa Filho – Médico graduado pela UnB, doutor em saúde pública pela USP/FSP, PD-Fellow junto à Johns Hopkins-JHBDPH e livre docente em epidemiologia pela Unicamp/FCM.
Fonte: www.cnq.org.br