Estatuto da Igualdade Racial – 14 anos, por Eloi Ferreira de Araújo
O Estatuto da Igualdade Racial veio para construir um Brasil mais justo, mais fraterno, sem racismo e sem discriminações
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A pior de todas as heranças que a humanidade compartilha é o racismo oriundo da escravidão racial de africanos e de seus descendentes. Essa herança estrutural está incorporada nas instituições do Estado brasileiro e a luta anti-racista precisa ser diária. Os descendentes de africanos são cerca de 54% da população brasileira, segundo o IBGE. A par de sermos maioria absoluta de toda a nação, a população negra não acessa em igualdade de oportunidades aos bens culturais e econômicos do desenvolvimento do Estado.
Na verdade os indicadores de qualidade de vida mostram a população negra nos piores lugares. São habitações precárias, sem saneamento, água potável, maior presença nos empregos de menor remuneração, maior vitima de violência com destaque nesse ponto para as mortes de jovens e de mulheres negras, enfim, não há um indicador sequer que coloque a população negra em igualdade de oportunidades com a não negra.
A história registra um sem número de lutas pela liberdade. A segunda metade do século XIX houve muita luta e o surgimento do movimento abolicionista que reuniu uma parcela substantiva de toda a nação que fez votar e aprovar o fim da escravidão. Os festejos daquela vitória ecoaram pelo Brasil, mas não corresponderam às necessidades de se assegurar aos ex-cativos a terra, os créditos de financiamento para atividades, a educação, saúde e moradia.
Durante o século XX tivemos legislações em matéria penal e a constituição cidadã tornou o racismo crime inafiançável e imprescritível, e, as comunidades quilombolas foram reconhecidas. Contudo, ainda faltava uma legislação que assegurasse igualdade de direitos à comunidade negra. Coube ao ilustre Senador Paulo Paim, a iniciativa de propor um projeto de lei nesse sentido.
Por cerca de vinte anos o projeto de lei da criação do Estatuto da Igualdade Racial tramitou na Câmara dos Deputados e no Senado. Sua aprovação foi resultado de uma grande movimentação das organizações do Movimento Negro brasileiro, que dialogaram com deputados e senadores até conseguirem sua aprovação e sanção pelo presidente Lula, em 20 de julho de 2010.
Quando a política de cotas estava sendo questionada no STF, o Estatuto da Igualdade Racial foi co-adjuvante para a Constitucionalidade e legalidade das cotas. O Estatuto da Igualdade Racial está completando 14 anos, a idade da rebeldia e da indignação. E, é preciso que seja regulamentado no sentido de dar efetividade às possibilidades contidas nesse importante documento.
É preciso que se constitua uma força tarefa para se oferecer ao movimento negro um conjunto de sugestões de regulamentação do Estatuto no campo das ações afirmativas, na explicitação da autodeclaração, para igualdade das religiões de matriz cultural africana, na titulação das quilombos, na inclusão dos mestres de capoeira, no Sistema Nacional de Promoção de Igualdade Racial, nos recursos do orçamento da união para promoção da Igualdade de oportunidades, enfim em todos dispositivos para efetividade na construção de um país de igualdade de oportunidades.
Combater o racismo exige pressa é uma luta de negros e de não negros. Os racistas são apressados e não descansam. Basta ver, que tramitam no Congresso iniciativas de projetos que pretendem acabar com está importante legislação e isso não podemos aceitar. O Estatuto da Igualdade Racial veio para construir um Brasil mais justo, mais fraterno, sem racismo e sem discriminações. Vamos à luta até a vitória final!
Eloi Ferreira de Araújo, é advogado, ex-ministro da Igualdade Racial e ex-presidente da Fundação Cultural Palmares.